Cheryl Berno. Foto: Acervo pessoal

Cheryl Berno

Advogada, Consultora, Palestrante e Professora. Especialista em direito empresarial, tributário, compliance e Sistema S. Sócia da Berno Sociedade de Advocacia. Mestre em Direito Econômico e Social pela PUCPR, Pós-Graduada em Direito Tributário e Processual Tributário e em Direito Comunitário e do Mercosul, Professora de Pós-Graduação em Direito e Negócios da FGV e da A Vez do Mestre Cândido Mendes. Conselheira da Associação Comercial do Estado do Rio de Janeiro.

O que será do povo se nem a justiça funcionar?

Símbolo da justiça em bronze. Foto: Pikist

Símbolo da justiça em bronze. Foto: Pikist

Existe uma Constituição Federal, que é a “lei maior”, que deveria ser seguida por todos, só que não é. Depois temos as outras leis, feitas pelos políticos, por iniciativa deles, do povo (por iniciativa popular) ou do presidente. Espera-se que as leis sejam cumpridas, só que não é bem assim no dia a dia.

Mas, quando uma lei não é cumprida, o cidadão pode recorrer ao Poder Judiciário, para que a faça cumprir e mande indenizar pela sua violação. O Juiz não pode inventar lei, tem que seguir as existentes, que são feitas pelo legislativo: deputados, vereadores e senadores. Isso seria o curso normal em um estado democrático de direito, porém, o que tem se visto na prática é um usurpando o poder do outro, uma total inversão de funções estatais. Há autoridades se achando acima das leis e dos poderes legitimamente constituídos, querendo fazer o que quer, como no caso dos policiais que prenderam, torturam, ali mesmo julgaram e executaram o cidadão doente que não usava capacete, na frente da família e do povo ou as chacinas em todos os cantos do país. Chegamos ao fundo do poço ou qual é o limite?

Em casos assim, extremos, é fácil para qualquer um ver que algo está fora do lugar, mas e no dia a dia da justiça quando se verifica que a lei não é cumprida nem pelos julgadores? Essa violação diária acaba minando a democracia e frustrando os cidadãos, que estão esgotados de ver tanta injustiça. A impressão que dá é que nada funciona. Quando os poderes que falham são o legislativo (deputados, senadores e vereadores) e o executivo (presidente, governador e prefeitos), o cidadão ainda acha que vai equilibrar entrando na justiça, mas, quando nem essa funciona, aí é um Deus nos acuda e um salve-se quem puder.

Quando a justiça se torna inacessível e ineficiente, quando as maiores injustiças são verificadas também no dia a dia do judiciário, aí já passamos mesmo de todos os limites, é a falência de um Estado Democrático de Direito. Recorrer para quem? Talvez tenhamos que ter mesmo um órgão de controle externo do poder judiciário porque do jeito que está, nem os advogados não estão aguentando mais. Quem sente primeiro o impacto são os operadores do direito, principalmente os que vivem de lutar para que a Constituição e as leis sejam cumpridas.

Até no juizado especial, que foi criado para atender as demandas de menor valor, o que se verifica é que tudo virou motivo para o juiz não analisar a questão ou o que é pior, para dizer diante de qualquer pedido que a lesão ao direito expresso foi “mero aborrecimento”. O princípio constitucional de que “a ninguém é dado fazer ou deixar de fazer senão em virtude de lei” – princípio da legalidade, parece que não existe em certos lugares. Diante desta situação alarmante, ou os advogados começam a tomar providências ou vão se tornar inúteis e vamos voltar aos tempos da justiça com as próprias mãos porque o povo não há de aguentar calado tanta violação de direitos.

Para quem perdeu familiares sumariamente não se tem nem mais o que falar. Estas vítimas se juntam às que diariamente não conseguem ver a lei aplicada no seu caso e vamos criando um exército de excluídos dos direitos, dos sistemas, do virtual, da vida em sociedade como preconiza a nossa Constituição Federal, com direitos para todos.

Para que um Código de Defesa do Consumidor de primeiro mundo se quando a empresa o violar a regra o juiz não vai fazer nada? Talvez o tribunal das redes sociais tenha sido mesmo mais efetivo, porque perante o judiciário se o sistema funcionar e o cidadão conseguir pagar as custas e conseguir chegar vivo ao final da via sacra de um processo já será uma vitória.

Tem que revisar as custas para quem fiquem acessíveis – não podem cobrar para tudo quanto é fundo dos próprios órgãos estatais, o cidadão tem que pagar a taxa judiciária – o resto é tudo ilegal e inconstitucional!

Estes sistemas de processos eletrônicos têm que ser amigáveis, fáceis de acessar, de usar, tem que ser feitos para humanos comuns e não para os deuses da informática. Sem um processo eletrônico simples e acessível excluímos milhares dos direitos e da justiça.

Os juízes e seus assessores precisam ler bem os processos, ainda que eletrônicos, porque tem casos que o advogado fica mesmo na dúvida se o processo foi de fato lido. O cidadão comum, o chamado hipossuficiente na relação, tem que ser tratado como tal. Não dá para tratarem o idoso aposentado como se fosse um grande banco, obrigá-lo a fazer prova do que não tem como fazer. Se diz que não emprestou, cabe ao banco provar que emprestou. A justiça tem que funcionar para qualquer um e tem que chegar de fato para quem mais precisa porque é a última esperança, é a luz no fundo do túnel.

Mas, se continuar tudo do jeito que está, teremos uma convulsão social porque ninguém mais está aguentando pagar tanto imposto e não ver eficiência na prestação dos serviços públicos em todos os lugares. As autoridades precisam entender que democracia é o governo do povo e para o povo, lição que a história mostra que acaba aprendida, por bem ou por mal.

 

Da Série: Injustiças

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