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“Real – O Plano por Trás da História”: Emílio Orciollo Neto no melhor trabalho de sua carreira

Cada vez mais polarizado política e ideologicamente, o Brasil vive uma fase sombria, consequência de governos desastrosos que o colocaram numa situação periclitante. Nunca antes na História, este país chafurdou tanto na lama. Por esta razão, é impossível não lembrar-se da abertura de “Deus nos Acuda” (1992), telenovela global protagonizada por Glória Menezes e Francisco Cuoco, e encará-la como uma espécie de prenúncio dos anos 2000 e 2010 – apesar de ter sido uma baita sátira aos acontecimentos do início da década de 1990. Escrita por Silvio de Abreu e dirigida por Jorge Fernando, a novela foi ao ar cerca de um mês antes do processo de impeachment de Fernando Collor ser aprovado pelo Congresso e tinha como objetivo não apenas entreter, mas criticar a situação do país, já assolado pela corrupção e por problemas na economia, que obrigaram seu sucessor, Itamar Franco, a apostar numa nova moeda: o Real.

 

Para criar o Plano Real, o então presidente Itamar Franco convocou um time de economistas, liderado por Fernando Henrique Cardoso, à época Ministro da Fazenda. Dentre eles, Gustavo Franco, homem de personalidade forte que conquistou inúmeros desafetos, cuja trajetória é contada em “Real – O Plano por Trás da História” (2017). Com direção de Rodrigo Bittencourt, o longa chega aos cinemas nesta quinta-feira, dia 25, em meio à polêmica criada por sete cineastas que retiraram seus filmes do Cine PE por questões ideológicas, uma vez que o motivo foi a presença de duas produções de “direita” na programação oficial do evento, posteriormente cancelado – este longa e o documentário sobre Olavo de Carvalho, “O Jardim das Aflições” (2017), de Josias Teófilo.

 

Filme está no olho do furacão ideológico desde o cancelamento do Cine PE (Foto: Divulgação).

 

Baseado na obra “3.000 Dias no Bunker – Um Plano na Cabeça e um País na Mão”, de Guilherme Fiuza, o filme começa em 2003 com Franco (Emílio Orciollo Neto) sendo entrevistado antes de prestar depoimento à CPI do Banestado, à qual foi absolvido. Esta entrevista é utilizada como fio condutor da trama que se desenvolve a partir de flashbacks, inseridos com bastante competência pela montagem de Lucas Gonzaga, apresentando à plateia a criação do plano econômico que garantiu uma sobrevida ao Brasil. Ou parte dela, uma vez que vários pontos foram omitidos pelo roteiro de Mikael de Albuquerque.

 

Esta opção deve-se ao fato de o longa focar na vida do economista e em sua obstinação pelo Real, plano que ele tinha como filho e fez de tudo para proteger, inclusive em meio a crises econômicas mundiais. Com isso, “Real – O Plano por Trás da História” perde um pouco da consistência histórica em prol da exploração da trajetória do personagem de língua afiada e sarcástico ao extremo, que sempre que possível profere frases de efeito em diálogos que não poupam nada nem ninguém.

 

Mas o que realmente chama a atenção do espectador é a atuação de Emílio Orciollo Neto. No melhor trabalho de sua carreira, o ator concede força descomunal ao personagem, equilibrando irascibilidade e arrogância, mas demonstrando certa fragilidade no que tange à sua vida familiar. É uma interpretação que dispensa a caricatura para abraçar o que podemos chamar de Capitão Nascimento do Planalto Central, tamanha sua voracidade.

 

Apesar do pouco espaço conferido aos coadjuvantes, alguns conseguem se destacar neste longa, sobretudo Tato Gabus Mendes (Pedro Malan), Guilherme Weber (Pérsio Arida) e Juliano Cazarré, na pele de Gonçalves, o fictício deputado petista que interroga Gustavo Franco na CPI. O trio oferece atuações seguras e consistentes, explorando com perspicácia as características de seus respectivos personagens.

 

Com uma trilha sonora vigorosa, “Real – O Plano por Trás da História” não é uma obra-prima, mas funciona dentro de sua proposta de levar para as telas toda a tensão de um período conturbado da economia brasileira. Não é um filme de questionamentos políticos, muito menos de debate. Mas numa época em que o Brasil está dividido entre alimentos populares, coxinha e mortadela, e tudo é classificado desta forma, pode-se dizer que este longa será encarado por parte da plateia como uma saborosa coxinha com catupiry.

 

Assista ao trailer oficial:

 

Ana Carolina Garcia

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Ana Carolina Garcia
Tags: CinemaEmílio Orciollo NetoRodrigo Bittencourt

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