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Por dentro do barracão: com estética diferenciada, Mangueira propõe contorno heroico a negros e índios

Pra contar a “história que a história não conta”, a Estação Primeira de Mangueira vai fazer do índio, herói; e transformar Dom Pedro em charge. Com o enredo “História pra ninar gente grande”, a proposta da escola é brincar com contornos estéticos para dar luz àqueles que por anos viveram nas sombras.

Por dentro do barracão, um dos trabalhos plásticos mais diferenciados do carnavalesco Leandro Vieira nos últimos anos, que recebeu a reportagem do SRzd para contar alguns detalhes do que o público pode esperar da verde e rosa no Carnaval 2019. A agremiação será a sexta a desfilar na segunda-feira de Grupo Especial.

Leandro Vieira no barracão da Mangueira. Foto: Divulgação

Para o carnavalesco, que foi campeão com Maria Bethânia, em 2016, e conseguiu ótimas colocações ao falar da religiosidade em 2017 e do Carnaval popular em 2018, o enredo do próximo desfile, com aspecto histórico, não foge das características da agremiação.

“Eu busco ter o entendimento do que é a Mangueira para propor algo do tamanho da Mangueira. Pra mim, a Mangueira é erudita. É uma instituição erudita da cultura popular brasileira. Essa erudição não pode ser confundida com a formalidade que alguns tem a respeito da erudição. A escola é o símbolo da sofisticação máxima da cultura brasileira. É diferente você ser popular e você ser popularesco. Essa visão popularesca que o pessoal tem da Mangueira reflete preconceito de achar que comunidade negra, pobre e de favela só pode ser popularesca. Conversa fiada. Mangueira é erudita e sofisticada”, afirmou Leandro.

Detalhes do barracão da Mangueira para o Carnaval 2019. Foto: Divulgação

Com isso na cabeça, o artista propõe, plasticamente, desconstruir a imagem de heróis consagrados. Ninguém escapou. Do descobrimento do Brasil à atualidade dos anos 2000, personagens da história ganharão nova roupagem na apresentação da verde e rosa.

“A Mangueira, esteticamente, dialoga com esse universo consagrado. A imagem de Dom Pedro, a imagem de Pedro Álvares Cabral, a imagem de Marechal Deodoro da Fonseca, a imagem de Floriano Peixoto, a imagem do Padre José de Anchieta, a imagem de Duque de Caxias. Esses heróis que foram cristalizados no imaginário nacional através de fotografias, pinturas, esculturas em praça pública”, contou.

Detalhes do barracão da Mangueira para o Carnaval 2019. Foto: Divulgação

No lugar dos heróis consagrados, entram aqueles que muito fizeram pelo Brasil, mas não ganharam o devido reconhecimento, como os negros escravizados:

“Foi dado à Princesa Isabel o protagonismo da abolição. Esse protagonismo diminuiu o protagonismo negro para construir o processo que levou a Princesa a assinar a Lei Áurea. A gente aprende nas escolas que a abolição é uma concessão do Estado brasileiro, mas a gente deixa de ser despertado para o fato da Princesa e do Estado terem levado a escravidão até onde puderam. A gente não tem conhecimento, por exemplo, que escravo brasileiro teve investimento na caixa de poupança e, através disso, conseguiu comprar sua alforria.”

Questionado se o público, em algum momento, pode relacionar o tema da Mangueira com algum partido político, Leandro Vieira foi enfático: “O que eu defendo é apartidário. Pra mim, defender índios, mulheres, negros, favelados, é defender coisas que deveriam ser o partido de todos. Se alguém pensa diferente disso, o problema é deles, e não meu. Defender a importância do pensamento crítico é apartidário. O partido da Mangueira é o partido do povo”.

Detalhes do barracão da Mangueira para o Carnaval 2019. Foto: Divulgação

Um setor, uma estética

Uma das grandes novidades da plástica da escola para o próximo desfile, e que se diferencia do trabalho do carnavalesco dos últimos anos, é um estilo de visual diferente para cada setor, com materiais e paleta de cores específicas.

“Vou dialogar com uma estética diferente da que eu utilizei em 2018. Tem um setor indígena, tem um setor de estética africanizada, tem um setor de estética anedótica. Mas tudo isso de uma forma simples e popular, que facilita a leitura. O público vai ver um índio e perceber que é um índio. Aliás, o índio sempre está presente nos meus desfiles. Meu sonho é fazer um Carnaval totalmente indígena. Nesse ano, por exemplo, tenho dois setores com essa temática”, revelou Leandro Vieira.

Detalhes do barracão da Mangueira para o Carnaval 2019. Foto: Reprodução

Em fantasias e alegorias, dois tipos de contornos vão contrastar no visual mangueirense.

“Os heróis que não tiveram contorno heroico na história, no desfile da Mangueira vão ganhar contornos estéticos épicos. É o índio épico do Brasil, é o negro épico, é o negro rei, que ostenta o visual africananizado das majestades africanas. Já os personagens que alcançaram o contorno heroico serão apresentados como caricaturas, como charge. Existe um tom anedótico, que consegue despertar o riso. Rir dos poderosos é uma grande arma contra o poder”, afirmou o carnavalesco.

Detalhes do barracão da Mangueira para o Carnaval 2019. Foto: Divulgação

“Filho da crise”, Leandro não se assusta mais com escassez de materiais ou falta de verba. Para ele, anormal será fazer um Carnaval com condições financeiras favoráveis. Em mais um ano, o artista conseguiu se desvencilhar das adversidades para preparar um desfile, segundo ele, à altura da Mangueira.

Por falar em tamanho, o carnavalesco revelou que, diferente de outros anos, não trará abre-alas acoplado, mas trabalha a volumetria de forma que o desfile não fique cansativo aos olhos de quem assiste.

“Eu gosto de criar uma dinâmica estética com as alegorias que não seja uniforme. Eu gosto do carrão e do carrinho, com uma mensagem gigante em algo pequeno. Eu gosto desse diálogo: do grande em estrutura e do grande em conceito. Tudo grande ou tudo pequeno fica monótono.”

Detalhes do barracão da Mangueira para o Carnaval 2019. Foto: Divulgação

Confira a série ‘Por dentro do barracão’

Grupo Especial

+ Ilha prepara desfile artesanal, autêntico e com abre-alas grandioso

+ São Clemente bota ‘dedo na ferida’ com carro do camarote e alegoria de ferro

+ Luxo, requinte e imponência marcam plástica da Vila Isabel

Série A

+ Império da Tijuca dribla crise e mantém plástica grandiosa e de fácil leitura

João Carlos Martins

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João Carlos Martins
Tags: Carnaval 2019destaque2-carnaval-rjMangueiraPor dentro do barracão

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