Por dentro do barracão: Com abre-alas de 50 metros, Ilha trará realidade nua e crua em desfile teatral

Detalhes do barracão da União da Ilha para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

‘O amanhã’ do brasileiro é tão incerto que a União da Ilha resolveu escancarar as mazelas sociais no ‘Domingo’ de Carnaval. A agremiação que tantas vezes foi a escola da felicidade quer ser porta-voz do povo em um desfile pra lá de crítico, ousado e diferente. Mas se engana quem espera só tristeza da passagem da tricolor insulana. Na Ilha, tudo acaba em ‘festa profana’. E a expectativa da agremiação é que a escola finalmente possa fazer a Quarta-feira de Cinzas ser ‘o dia da alegria’.

Por dentro do barracão, uma estética totalmente diferente daquilo que estamos acostumados na Ilha. Entrar no galpão de alegorias da escola é como assistir a um telejornal onde a maior parte da programação é tomada por problemas diários. É como se cada adereço gritasse contra a desigualdade social e clamasse por dias melhores nas comunidades espalhadas pelo Brasil. O protesto é tão grande que a escola não se limitou no tamanho dos carros. O abre-alas, por exemplo, passa dos 50 metros de comprimento.

Detalhes do barracão da União da Ilha para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

DEDO NA FERIDA

O lema na Ilha é não ter medo. Nem pensar pequeno. Não à toa, a escola mira o campeonato. Pra isso, fez mudanças em sua equipe ao trazer o diretor de Carnaval Laíla e montar uma comissão encabeçada pelos carnavalescos Fran-Sérgio e Cahê Rodrigues. Uma revolução temática e estética também foi proposta. A alegria característica da Ilha até estará presente no fim do desfile, mas a maior parte da apresentação será de protesto e ‘dedo na ferida’.

Foi o carnavalesco Fran-Sérgio quem recebeu o SRzd para uma tour no barracão da agremiação. Acostumado a trabalhar com Laíla no modelo comissão de Carnaval, Fran estreia uma parceria inédita com Cahê Rodrigues, a quem teceu elogios: “A gente já se conhecia e sempre nos demos bem. Ele é uma pessoa muito tranquila, vem de grandes carnavais. Temos coisas em comum. E isso é um somatório muito bom pra Ilha”.

A cada parte do barracão, um choque de realidade diferente. Temas pesados e corajosos ganharam vida na plástica da escola. O carnavalesco, no entanto, nega que a proposta saia do escopo da Ilha do Governador.

Detalhes do barracão da União da Ilha para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

“A gente sabe que a Ilha é uma escola leve, alegre, e viemos com essa proposta. A gente trouxe a nossa forma de fazer o Carnaval, mas respeitando a agremiação. Nosso desfile tem uma pegada crítica forte, mas termina com a cara da Ilha: alegre e esperançoso”, afirmou Fran.

O desfile da União trata da população em um beco sem saída. Uma mulher negra grávida é o fio condutor do enredo. Ela sofre as angústias de uma mãe que não sabe o que será do seu filho quando ele vier a um mundo tão cruel. A escola quis tanto retratar a vivência que nem lançou sinopse aos compositores. Laíla e companhia queriam que cada autor pusesse suas experiências diárias nos sambas para que pudessem ser aproveitadas na construção do Carnaval.

“É um enredo realista. A gente vive isso o tempo inteiro. Você vai na rua e pode ser assaltado. Você vai ao hospital e não consegue atendimento. Você vê todo dia na televisão o desemprego e as mazelas. A Ilha só está fazendo um grito de alerta: que se olhe mais para a população, principalmente os mais carentes”, explicou Fran-Sérgio.

Detalhes do barracão da União da Ilha para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

FIQUE DE OLHO
ABRE-ALAS E TERCEIRO CARRO

Em um desfile de tantas promessas, duas alegorias se destacam: o primeiro e o terceiro carro. O abre-alas é uma favela gigante, que passa dos 50 metros de comprimento. Sua estética é tão realista que foram usadas roupas e utensílios de cozinha na decoração. A alegoria nada deve a uma favela real.

“A gente partiu para um caminho muito original, tanto em fantasia como alegoria. A favela é uma favela, em toda sua totalidade de detalhes, até tem uma carnavalização, mas é algo bem realidade nua e crua. Os carros são mais soltos, abertos, vazados. Também não fomos em nada muito caro. É um Carnaval bem alternativo”, disse Fran-Sérgio.

A terceira alegoria já dá o que falar pela Cidade do Samba e é promessa de impacto no desfile. O carro é onde vem a crítica mais pesada e terá grande teatralização. A quinta alegoria traz a alegria e a felicidade da favela. Esculturas de sambistas, botecos e até festa na laje ganharam espaço no carro.

Detalhes do barracão da União da Ilha para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

Em um desfile tão real, a encenação não poderia ficar de fora. Todas as alegorias contarão com teatralização. No chão, a proposta é outra: “As fantasias são leves e praticamente são todas de personagem. É o médico, é o professor, é o povo da rua. É bem real e original, sem inventar. São leves, pequenas e possibilitam o componente a evoluir. O Laíla quer a escola igual pipoca na Avenida, como ele sempre gostou”.

Com cinco alegorias, dois tripés e 32 alas, a Ilha pretende terminar o trabalho bruto do barracão no final de janeiro e ajustar detalhes do projeto plástico até 10 de fevereiro, 13 antes antes do desfile oficial.

Detalhes do barracão da União da Ilha para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

O DESFILE

Primeiro setor: “É uma favela, vista de forma aérea. Trazemos as famílias que vivem no lugar e tudo que há no local”.

Segundo setor: “Representamos o povo que trabalha, que acorda cedo, antes do Sol nascer, para pegar no batente. Os operários, as diaristas, que mesmo com todos os problemas seguem firme na lida diária”.

Terceiro setor: “Falamos da falta de saúde, segurança, todo o caos que a gente vive”.

Quarto setor: “Trazemos a balança social: a pobreza, a riqueza, a burguesia, a maldade, a ganância. Retratamos o povo que está na rua. Como eles ficam depois de tudo isso”.

Quinto setor: “É a vista de dentro da favela. Como se a gente entrasse e visse o boteco, a festinha, o pessoal pegando Sol na laje. É toda a vida festiva da comunidade, a solidariedade e a amizade”.

FICHA TÉCNICA

Enredo: Nas encruzilhadas da vida, entre becos ruas e vielas, a sorte está lançada: salve-se quem puder!
Comissão de Carnaval: Laíla, Fran-Sérgio, Cahê Rodrigues, Larissa Pereira, Anderson Netto, Allan Barbosa e Felipe Costa
Posição: 6ª a desfilar no domingo de Grupo Especial, 23 de fevereiro
Alegorias: 5
Tripés: 2
Alas: 32
Componentes: 2800

Detalhes do barracão da União da Ilha para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

Acompanhe a série ‘Por dentro do barracão’

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