Resistência e resiliência: carnavalescos avaliam impactos do adiamento dos desfiles

Carnavalescos Alexandre Louzada (Beija-Flor) Mauro Quintaes (Império de Casa Verde). Fotos: Eduardo Hollanda/Divulgação e Duda Morais/Divulgação

Carnavalescos Alexandre Louzada (Beija-Flor) Mauro Quintaes (Império de Casa Verde). Fotos: Eduardo Hollanda/Divulgação e Duda Morais/Divulgação

Os sambistas jamais ficaram tanto tempo sem pisar na Avenida como neste momento. A última vez que as escolas de samba, tanto do Rio de Janeiro, quanto de São Paulo, desfilaram nos seus respectivos Sambódromos aconteceu no dia 1º de março de 2020, semanas antes da Covid-19 ser considerada uma pandemia.

Ainda com a incerteza da realização do Carnaval 2021 – que meses depois seria cancelado por ambas as prefeituras – algumas agremiações deram início ao projeto do próximo desfile ao lançarem seus enredos e iniciarem os concursos de samba-enredo, ainda que de forma virtual.

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Em reunião realizada na noite de 21 de janeiro, entre os prefeitos do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), e de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), foi tomada decisão conjunta de adiar os desfiles das escolas de samba deste ano para o feriado de Tiradentes, em 21 de abril, com isso, o sonho dos sambistas em retornarem para a Passarela do Samba teve que mais uma vez ser postergado em, pelo menos, cerca de dois meses.

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Com a transferência de data do Carnaval, o SRzd conversou com dois carnavalescos experientes: Alexandre Louzada (Beija-Flor de Nilópolis) e Mauro Quintaes (Império de Casa Verde), para avaliarem o impacto do adiamento sobre as fantasias e adereços que começam a serem preparados com meses de antecedência.

Louzada fala do uso de novos tipos de materiais e destaca preconceito contra o Carnaval

Louzada é responsável por desenvolver o enredo “Empretecer o pensamento é ouvir a voz da Beija-Flor”. Com seis títulos no Grupo Especial Carioca e dois no paulistano, o artista afirmou que tudo é novidade neste momento, mas que a azul e branca da Baixada Fluminense já se adiantou e optou por outros tipos de materiais na construção do Carnaval que será apresentado na Marquês de Sapucaí.

99% das fantasias não usam penas e plumas naturais

“Tudo isso é muito novo pra todos nós, eu creio. Estamos vivenciando, aos poucos, essa experiência e aprendendo com ela, seja na manutenção e preservação dos adereços, como na forma de trabalhar os mesmos, estamos indo com calma e com mais cuidado com acabamento, mas seguindo o cronograma. A Beija Flor, antes mesmo do adiamento, optou por usar materiais diferentes do convencional, tendo em vista a escassez de ofertas diante da crise na produção e importação de materiais gerada pela pandemia. Por exemplo: 99% das fantasias não usam penas e plumas naturais e com relação ao desgaste e danos pelo tempo de armazenamento, estamos aprendendo aos poucos, é o “novo normal”‘, revelou o sambista.

Alexandre Louzada, carnavalesco da Beija-Flor. Foto: Eduardo Hollanda/Divulgação

O carnavalesco defendeu que a vontade de se lutar pela realização da manutenção do espetáculo é maior do que a lamentação que os problemas gerados pelo adiamento. “Estamos trabalhando muito, como se o Carnaval fosse em fevereiro, não houve paralisação nem demissões na Beija-Flor, sabemos que teremos um grupo que permanecerá, zelando pelos reparos que certamente surgirão e isso acarretará um custo extra, mas é o que temos nas mãos como realidade e vamos lutar pra vencer essas adversidades. Recuperar fantasias e alegorias é muito mais fácil e possível, o difícil é superar a perda de vidas, de familiares e amigos que se foram”, afirmou.

É um Carnaval de resistência e resiliência

Alexandre fez questão de salientar que os sambistas devem combater as pessoas que são contrárias à realização da festa e esclarecer para a sociedade a importância do Carnaval como evento cultural e que se preocupa com a segurança sanitária neste momento.

“É um Carnaval de resistência e resiliência, e sinceramente desejo que todos nós, de todas as escolas, consigamos vencer esse desafio, cada um da sua forma. Temos que lutar sim, pra combater toda essa campanha contra o Carnaval, para esclarecer a sociedade que somos trabalhadores de um evento cultural e que temos a constante preocupação em seguir protocolos rígidos de segurança sanitária. Espero das autoridades e dos demais que patrocinam o espetáculo, que tenham esse entendimento e busquem mecanismos para suprir essas necessidades e que também promovam esquemas eficientes de fiscalização sanitária, pois no que diz respeito às escolas, estamos fazendo a nossa parte. O samba segue resistindo!”, finalizou Louzada.

Desfile 2020 da Beija Flor. Foto: Juliana Dias/SRzd
Desfile 2020 da Beija Flor. Foto: Juliana Dias/SRzd

Com o projeto finalizado, Quintaes se preocupa com a revisão dos materiais

Com passagens em diversas escolas do Rio e algum tempo residindo em São Paulo, Quintaes irá fazer sua estreia pela Império de Casa Verde. Neste ano, o “Tigre” levará para o Anhembi o enredo “O poder da comunicação: Império, o mensageiro das emoções”. Segundo ele, o Carnaval paulistano já tem como hábito o uso de materiais mais resistentes, por conta do tempo que as alegorias ficam expostas na concentração e no terreno que fica ao lado do Sambódromo, dias antes dos desfiles.

“Vou citar um exemplo: Em 2020, na Dragões da Real, foram quase 12 dias de chuvas intensas, isso prejudicou demais os materiais. Naturalmente quem faz Carnaval em São Paulo sempre procura materiais mais resistentes para executar a decoração. Então, essa não é a grande preocupação”, explicou.

São Paulo sempre procura materiais mais resistentes

“Agora com essa nova situação, vejo uma preocupação com a parte de emassamento das peças em verniz, porque o isopor sofre alteração de temperatura, ele expande e retrai. Então, se você passa uma massa e ela é rígida, naturalmente ela vai se expandir e retrair junto, só que a massa não resiste, ela vai rachar. Então, tem essa preocupação. Esse retoque já está previsto mais pra frente, porque como o nosso Carnaval está todo pronto, a gente tem certeza que alguma coisa ou outra a gente vai ter que retocar”, continuou.

Mauro Quintaes divide projeto 2022 com Leandro Barboza. Foto: Império de Casa Verde/Divulgação
Mauro Quintaes divide projeto 2022 com Leandro Barboza. Foto: Império de Casa Verde/Divulgação

O carnavalesco esclareceu que o sol também pode ser um outro fator que impacta nos tecidos: “Outra preocupação minha é com relação à incidência do sol dentro do espaço de trabalho, porque a grande maioria dos tecidos sofrem com o desbotamento à exposição de sol. Se você ficar ali parado no mesmo lugar e uma determinada fresta, janela ou basculante do barracão tiver uma incidência de sol, isso pode gerar um desbotamento do tecido naquela área. Estamos com uma atenção redobrada com relação a isso”.

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Mauro ressaltou que as fantasias deverão passar por uma revisão antes do desfile: “Em termos de fantasia, a única coisa que a gente está se preocupando é com relação as plumas, porque vão ser colocadas em algumas alas mais pra frente com o uso da cola quente. A cola quente tem um ponto de fusão, então se ela pegar muito sol e pegar muito calor no armazenamento das fantasias, tem que ter uma revisão”.

O meu Carnaval já está pronto

O artista afirmou que toda a revisão nas alegorias e fantasias já está prevista pela Império de Casa Verde, que deve acontecer faltando entre um mês e quinze dias para a apresentação oficial na Avenida.

“Como o Carnaval já está pronto, não deu tempo da gente mudar nada com relação a essa preocupação de tempo, mas repito, como já trabalhamos com materiais mais resistentes, agora é tocar pra frente e ficar atento aos desgastes naturais e promover as correções”, concluiu o sambista.

Desfile 2020 da Império de Casa Verde. Foto: SRzd - Ana Moura
Desfile 2020 da Império de Casa Verde. Foto: SRzd – Ana Moura

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