Unidos do Tijucano quer saber se ‘A Cuca vai pegar?’ em 2021

Logo oficial da agremiação.

Atual sétima colocada do Carnaval Virtual, a Unidos do Tijucano apresentará em 2021 o enredo A Cuca vai pegar? de autoria de Cleiton Almeida, enredista da agremiação, e Nícolas Gonçalves, presidente e carnavalesco da escola. A escola bicampeã dos desfiles de maquete buscará seu primeiro título do Grupo Especial aqui no Carnaval Virtual em 2021.

Logo oficial completo da agremiação.

Confira abaixo a sinopse da agremiação:

Encharcado pela forte chuva que caía, a cada pulo dado o cabelo balançava e respingava. O brilho nos olhos semicerrados e a expressão de um sorriso farto acompanhavam as mãos erguidas ao alto para recolher as gotas. Mãos curiosas que procuravam em cada pingo descobrir algo sobre a vida. Em mais um pulo, sentiu algo mais duro do que a água da poça. Enfiou a mão curiosa na água – a gente não vê com olho, vê com a mão! Com os olhos, viu turvas imagens de seu reflexo. Com as mãos, viu a abertura de um novo portal. Correu em direção à sua mãe com a chave encontrada.
“Guarde no meu baú, mamãe.”
E essa foi a última lembrança.
(…)
Assim se fez Cuca!
(…)
Os pezinhos por fora da manta, arroxeados de frio, são cobertos com carinho. A janela e a cortina são fechadas para vedar a luz que vem do céu e que pode atrapalhar o sono tranquilo.
“Nana neném que a Cuca vem pegar, papai foi pra roça, mamãe foi viajar…”
Um beijo na testa. Outro para abençoar. Um delicado sopro que apaga a lamparina.
“Boi, boi, boi, boi da cara preta pega esse menino que tem medo de careta.”
O livro é fechado com cuidado para evitar qualquer ruído e depois é guardado dentro do baú no pé da cama.
“Bicho papão sai de cima do telhado, deixa este menino dormir sossegado.”
A janela fechada para escurecer o quarto é escancarada por um repentino vendaval! No brilho de cada estrela são reveladas histórias a serem contadas em sonhos iluminados pela lua. E como a lua não tem luz…
Sopre o vento! Voa a criança para dentro! … Assovia o frio na barriga! Redemoinha seus pensamentos! Coloque a carapuça nele!
Corra pelos espinhos! Confunda os caminhos! … É hora de enselvar, coloque os pássaros para cantar! Estale correndo sobre folhas caídas, acorde os animais!
Uive no rochedo! Agarre sem medo! … Apanhe para mais perto! Prenda para cá! Dilacera o peito! Revele a pele! Marque com ranhuras as pedras!
Deslize por inteiro! Resvala até ele ligeiro! … Olhe bem nos olhos, cega daquilo que ele quer ver e envolva! Escureça totalmente a vista e esmague! Revire os olhos para dentro! Faça ele se ver!
Vibre a garganta! Encanta! … Traga até mim o espírito enfeitiçado! Desprenda do corpo a mente! Traga na corredeira! Encharque a alma e escorra até mim!
No centro da floresta, a corrente arrasta o garoto para a pedreira. Aprofunda-se em uma caverna. Pela fresta, apenas um ponto de luz projetando na cabeluda cuca da criança os feitiços conjurados no caldeirão da mente.
MUAHAHAHA! Chifres de bode manco, escamas de pirarucu catinguento! Venha magia das sombras profundas do vale do passado! Deformações e aparências desastrosas pelos vazios do mármore instável, que eu me transforme em um horrendo abominável!
ACERERRÊ RÁ! DE RÊ!! Olhos de morcego suado, garganta rouca de salamandra muda! Venha fogo que queima os sonhos e me toque com o calor de seu bafo! Bicho que voa, criança que chora, em um monstro me transformo agora!
CA CÁ! BELHELHELHE ILHA LHÊILHA! Madeixas hidratadas de espiga dourada, garra esmaltada afiada! Do rio à lama, o azedo sabor da saliva que aterroriza todo e qualquer lampejo! Forças do mal, forças do além, me transformem em bicho também!
TCHAK TCHAK HAAA!! Olhos arregalados, pios escancarados! Ó, espírito da noite, invoco todo o medo ancestral que vigia a mata! Ao sobrevoo que vaga pela escuridão, que eu seja perturbadora nessa transformação!
AAAAAAAAAA HAHAHAHA! Asas empoeiradas! ATCHIM! Rinites atacadas! Terrível entidade da meia-noite, seja minha companheira nesse fétido norte! Poder que vem do ar, poder da madrugada, que eu seja uma vilã transformada!
Alguma coisa, no entanto, encucava a Cuca. Nenhuma de suas engenhosas poções transformava aquela história em um pesadelo. Não existia uma explicação aparente para justificar as falhas. Em uma rachadura da caverna, ela avista um portal secreto que dá passagem a um lugar ainda mais profundo e frágil, onde acredita que suas maldades mais poderosas irão funcionar.
SALAMARÉQUIE CHAMBULI CHAMBULA! CAXINGUI CAXINGUELE! Eu sou má, perversa, ruim! Eu sei que tens medos e vou encontrá-los! VOU TE PEGAR!
Observe a caminhada soturna que se aproxima aos poucos! O silêncio espreita por dentro e estar indefeso é estar entregue ao desconhecido! Cada passo intensifica a tensão entre o estado de paralisia e a iminência do mais perfeito retrato da feiúra! A crueldade do tempo te guarda, o círculo se fecha ao seu redor e… NADA?!
Trovões, ventanias, raios, relâmpagos, todo azar de barulhos estrondosos que se possa imaginar! A fúria da tempestade te apequena ao vazio da visão, à aflição da audição e à vulnerabilidade de sentir-se impotente! A desproteção diante da grande catástrofe que vem para te engolir e… COMO ASSIM?!
Entregue-se, imagine comigo! O temor aos espíritos vagantes não é suficiente! As invenções da ansiedade te assustam a todo momento! Fuja, em vão, da angústia que emerge faminta da imaginação e também da covardia que exala o odor mais insuportável! Irão te pegar! Fuja, fuja e… TÁ DE BRINCADEIRA?!
Corra à exaustão e se renda à fadiga! O horripilante asco provoca um revertério em suas entranhas! Sinta o tormento da invencível batalha em repelir algo que gruda mais e mais! Arrepios e ânsias se espalham por toda a extensão do seu ser! A agonia te consome, um ataque de nervos é cada vez mais latente e… AAAAARHHHGG!
A indescritível solidão te absorve inteiramente! Você é sufocado pelo vácuo do amor que se despede e some gradativamente na névoa da eternidade! Eles nunca mais voltarão! O abandono perpétuo será sua pena! Ao relento, desamparado, sem ninguém para te defender e… NÃO É POSSÍVEL!?
Injuriada com a resistência da criança aos seus poderes, a Cuca procura pelos túneis mais subterrâneos, pelas grutas mais inóspitas e pelas passagens mais ocultas, uma resposta para tal fenômeno. Decide, então, por seu feitiço derradeiro: Transformá-lo em pedra!
A pele vai perdendo a cor, as pálpebras vão pesando, o coração vai desacelerando… As mãos contraídas e geladas se abrem e deixam cair uma chave.
No limbo da mente, a Cuca encontra a chave que recebeu de seu filho. Com esta, acessa o inacessível e encontra um espelho tríptico. Com os olhos, viu turvas imagens de seu reflexo. Com as mãos, viu a abertura de um novo portal.
Seu maior medo já havia se concretizado.
A maldição se quebra.
O espelho se parte.
O pesadelo se encerra.
(…)
Boa noite, meu filho…
(…)
É hora dos sonhos!

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