Cheryl Berno. Foto: Acervo pessoal

Cheryl Berno

Advogada, Consultora, Palestrante e Professora. Especialista em direito empresarial, tributário, compliance e Sistema S. Sócia da Berno Sociedade de Advocacia. Mestre em Direito Econômico e Social pela PUCPR, Pós-Graduada em Direito Tributário e Processual Tributário e em Direito Comunitário e do Mercosul, Professora de Pós-Graduação em Direito e Negócios da FGV e da A Vez do Mestre Cândido Mendes. Conselheira da Associação Comercial do Estado do Rio de Janeiro.

Economize cobrando os seus direitos de usuário dos serviços públicos e ajude na melhoria do atendimento

Foto: Reprodução

Foto: Reprodução

A Receita Federal publicou, no dia 25 de outubro, a Portaria nº 2.860 dispensando o reconhecimento de firma e informando que basta a apresentação do original do documento ou de sua cópia autenticada, para que o servidor público verifique a autenticidade. A norma diz ainda que a cópia simples de documento apresentada para obtenção de serviços no âmbito da Receita Federal, deve estar acompanhada do documento original, a fim de possibilitar sua autenticação pelo próprio servidor público ao qual for apresentado. A falsificação de assinatura ou documento público continua sendo crime.

As regras vêm da Lei nº 13.460, de 26 de junho de 2017 e do Decreto Federal nº 9.094, de 17 de julho de 2017, repaginando assim direitos já existentes e estendendo as obrigações para os Estados e Municípios, que conforme o porte, têm de um a dois anos para regulamentação.

Originalmente esses direitos constavam no Decreto nº 6.932, de 11 de agosto de 2009, editado pelo então Presidente Lula, que já havia dispensado o reconhecimento de firma e permitido que o próprio servidor público autenticasse documentos, além de ter criado a Carta de Serviços ao Cidadão e a Pesquisa de Satisfação com o Serviço Público, um marco na administração pública brasileira. Também há direitos que vem desde 1999, como os constantes na Lei nº 9.784, que estabeleceu normas básicas do processo administrativo e trouxe outras garantias para os administrados.

Essa nova Lei, a 13.460, vem com o mesmo objetivo, garantir direitos a quem utiliza os serviços públicos. Com poucas exceções, repete o que já existia há décadas e não é cumprido pela maioria dos órgãos públicos. Quem sabe agora, com a publicidade e o alarde em torno da matéria, as regras passem a ser observadas. Tem questões administrativas tão simples que não se entende porque necessitam ser impostas por uma lei federal, deveriam ser implementadas naturalmente. Veja por exemplo a ordem para que seja utilizada linguagem simples e compreensível, evitando-se o uso de siglas, jargões e estrangeirismos.

Deveria ser básico e natural que o administrador utilizasse uma linguagem para que o cidadão normal conseguisse entender o que quer dizer o ente público. Mas, para quem acompanha os procedimentos e processos administrativos, em especial na Receita Federal, talvez seja mais fácil entender porque é necessária uma lei mandando fazer de forma compreensível para o leigo.

Outro direito requentado é o acesso e obtenção de informações relativas à pessoa constantes de registros ou bancos de dados, já garantido pela Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, a Lei de Acesso às Informações, segundo a qual qualquer um pode pedir informações aos órgãos públicos.

Na nova roupagem, a Carta de Serviços ao Usuário do serviço público serve especificamente para relacionar as formas de acesso aos serviços, compromissos e padrões de qualidade e para obrigar sejam informados os serviços oferecidos; requisitos, documentos, formas e informações necessárias para acesso; principais etapas para processamento dos trabalhos públicos; a previsão do prazo máximo para a prestação do serviço e a forma, além dos locais e como o usuário deve apresentar eventual manifestação sobre a prestação. Obriga ainda que os órgãos públicos informem: as prioridades de atendimento; a previsão de tempo de espera; os mecanismos de comunicação com os usuários; os procedimentos para receber e responder as manifestações e os mecanismos de consulta pelos usuários acerca do andamento do serviço solicitado e de eventual manifestação.

Ficou estranha a necessidade de regulamentação da matéria, uma vez que já é obrigatória desde 2009, mas o Decreto federal nº 9.094 já tratou de regulamentar os principais direitos, já sendo possível cobrar dos gestores públicos a sua observância, até porque podem ser punidos se não o fizerem.

Outro direito bem antigo agora legalizado é o de reclamar. As normas garantem que qualquer pessoa que se sinta prejudicada pode usar a ouvidoria dos órgãos ou, na falta dessa, manifestar a sua insatisfação ao responsável pelo órgão público. Foi criada até a “Solicitação de Simplificação”, um formulário com o nome de “Simplifique!”, que pode ser apresentado pelo cidadão, preferencialmente pela Internet, quando a prestação de serviço público não observar as regras.

A novidade mesmo ficou por conta dos Conselhos dos Usuários, órgãos consultivos criados para acompanhar a prestação dos serviços; participar na avaliação dos mesmos; propor melhorias; contribuir na definição de diretrizes para o adequado atendimento ao usuário; e para acompanhar e avaliar a atuação do ouvidor. A escolha dos representantes desses conselhos será feita em processo aberto ao público e diferenciado por tipo de usuário a ser representado.

Muitos dos direitos reeditados já eram obrigatórios também no Estado do Rio de Janeiro desde 2011, quando foi editada a Lei nº 6.052, que reproduziu inclusive o direito de que não seja exigida da pessoa física ou da jurídica, a apresentação de certidões ou de outros documentos expedidos por órgãos ou entidades estaduais, que devem buscar entre si as informações necessárias, sendo vedado pedir para o cidadão apresentar o que já existe na administração pública.

Assim, não em razão das novas normas, que como vimos, repetem direitos antigos, mas porque desde 1988 a Constituição Federal já diz que a administração deve se pautar pelos princípios da impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, vale cobrar a prestação de serviços públicos de qualidade, até mesmo porque os tributos pagos para isso são bem altos, quase 40% do PIB. No mais, como se vê, não é por falta de lei que existe burocracia e prestação ineficiente de serviços públicos, pelo contrário, a existência de muitas regras geram ainda mais complexidade e dificultam a implementação de medidas básicas, já existentes há séculos no setor privado e que bem poderiam ser copiadas, sem que para tanto fossem necessárias mais leis. De qualquer forma, direito é para ser cumprido, exija sempre o seu e até a próxima!

Acesse as normas na íntegra:

Lei Federal nº 9.784 de 29 de janeiro de 1999

Decreto Federal nº 9.094 de 17 de julho de 2017

Lei nº 6.052 do Estado do Rio de Janeiro de 23 de setembro de 2011

Portaria nº 2.860 de 25.10.2017 da Receita Federal

Decreto Federal nº 6.932 de 11 de agosto de 2009 (revogado)

Comentários

 




    gl