‘Relatos do Mundo’ pode colocar Tom Hanks e Helena Zengel entre os finalistas do Oscar 2021
Produzido pela Universal Pictures, “Relatos do Mundo” (News of the World – 2020), assim como “Os 7 de Chicago” (The Trial of the Chicago 7 – 2020), da Paramount Pictures e DreamWorks SKG, “pulou” a exibição nas salas de cinema e foi lançado diretamente no catálogo da Netflix em virtude da pandemia. Destaque da atual temporada de premiações e com chances reais de chegar ao Oscar 2021, o longa, dirigido por Paul Greengrass, estreou na gigante do streaming na última quarta-feira, dia 10.
Baseado no livro homônimo de Paulette Jiles, “Relatos do Mundo” é ambientado em 1870, no estado americano do Texas, e mostra as feridas não cicatrizadas da Guerra Civil Americana (1861 – 1865), também chamada de Guerra de Secessão, principalmente sobre o protagonista, o Capitão Jeffrey Kidd (Tom Hanks). Viajando de cidade em cidade para levar informação aos seus habitantes, Kidd é surpreendido ao encontrar uma menina de descendência alemã perdida após o homem responsável por levá-la à família ser assassinado por ser negro. Sem dominar a língua inglesa após anos ao lado dos índios Kiowa, que a raptaram após exterminar os pais e a irmã, Johanna (Helena Zengel) vê em Kidd a única figura confiável enquanto sonha em voltar para os algozes a quem considera como pais.
Abraçando um gênero cinematográfico há muito no limbo da indústria, o faroeste, que teve seus dias de glória na Era Clássica de Hollywood, “Relatos do Mundo” remete a “Rastros de Ódio” (The Searchers – 1956), de John Ford. Em ambos os filmes, os protagonistas, Kidd e Ethan (John Wayne), são veteranos da Guerra que sofrem pela perda da mulher amada, encarando a solidão como única opção de vida, posteriormente ressignificando emoções e conceitos face à necessidade de proteger uma menina inocente.
Enquanto no longa de John Ford os índios são apresentados de forma bestial, sintetizados na imagem de Scar (Henry Brandon), no novo trabalho de Paul Greengrass a bestialidade surge nos brancos tanto no que tange à defesa da escravatura quanto ao desejo por uma menina que precisa ser protegida a todo custo. Neste sentido, “Relatos do Mundo” subverte um dos principais elementos do faroeste clássico, o embate entre “heróis brancos” e “índios maus”, para colocar a dignidade de Kidd como força motriz. Sem o conflito entre brancos e índios, o longa expõe de forma crítica feridas históricas da sociedade americana ao abordar preconceito contra negros e mexicanos no Texas, ainda hoje um dos estados mais conservadores no campo da política – “Texas diz não. Este é um país de brancos”, afirma o cartaz no corpo de um negro enforcado.
Evocando o filme de John Ford, inclusive em alguns movimentos de câmera, “Relatos do Mundo” oferece ao espectador uma experiência cinematográfica interessante, calcada no roteiro bem estruturado e em atuações impecáveis da dupla formada por Tom Hanks e Helena Zengel. A troca entre os atores agrega enorme valor a este longa por conceder veracidade à trama que Greengrass se propôs a contar. Esmiuçando as distintas camadas de Kidd, Hanks entrega um trabalho sóbrio e sensível, muitas vezes expondo suas emoções apenas no olhar, assim como Zengel, que compõe Johanna com a destreza de uma veterana. Indicada ao Globo de Ouro e ao SAG Awards de melhor atriz coadjuvante, Zengel expõe medo e aflição com gestos contidos, permitindo que a personagem derrube suas próprias barreiras gradativamente.
Primoroso tecnicamente, chamando a atenção também para a caracterização de todo o elenco, “Relatos do Mundo” é um filme sobre a necessidade do indivíduo em superar as adversidades da vida para encontrar um porto seguro e estabilidade emocional por meio da relação familiar, mesmo que sem laços de sangue.
Assista ao trailer oficial legendado:
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