Ana Carolina Garcia. Foto: SRzd

Ana Carolina Garcia

Jornalista formada pela Universidade Estácio de Sá, onde também concluiu sua pós-graduação em Jornalismo Cultural. Em 2011, lançou seu primeiro livro, "A Fantástica Fábrica de Filmes - Como Hollywood se Tornou a Capital Mundial do Cinema", da Editora Senac Rio.

‘Destacamento Blood’: Delroy Lindo brilha no novo filme de Spike Lee

“Destacamento Blood” já está disponível no catálogo da Netflix (Foto: Divulgação / Crédito: Netflix).

A Guerra do Vietnã é um dos capítulos mais sangrentos da História americana e já foi tema de inúmeras produções hollywoodianas nas últimas décadas. Dirigido por Francis Ford Coppola, “Apocalipse Now” (Apocalypse Now – 1979) é um dos principais títulos sobre o conflito cujas feridas ainda não estão totalmente cicatrizadas para os envolvidos. Isto é mostrado com propriedade por Spike Lee em “Destacamento Blood” (DA 5 Bloods – 2020), já disponível no catálogo da Netflix.

 

Na trama, quatro ex-combatentes negros voltam ao Vietnã para resgatar os restos mortais de seu antigo companheiro, Stormin’ Norman (Chadwick Boseman), na selva. Esta é a versão oficial da viagem do grupo composto por Paul (Delroy Lindo), Otis (Clarke Peters), Melvin (Isiah Whitlock Jr.) e Eddie (Norm Lewis). Mas, além de Norman, os veteranos estão atrás do ouro escondido desde a guerra, aceitando o acordo com um mercenário, intermediado pela ex-amante de um deles.

 

Um dos cineastas mais engajados politicamente, Spike Lee começa “Destacamento Blood” com imagens de arquivo mostrando a explosão da violência tanto em solo vietnamita quanto americano, concedendo ao espectador uma rápida e necessária contextualização que é utilizada como fio condutor desta trama costurada com eficiência pela montagem de Adam Gough, de “Roma” (Idem – 2018), outro título original Netflix. Este início potente dá o tom de todo o longa, que esmiúça os traumas de homens vítimas de preconceito racial em seu próprio país, mas servindo a ele como bucha de canhão em terreno hostil numa guerra que não era deles.

 

“Destacamento Blood” pode colocar Delroy Lindo na temporada de premiações (Foto: Divulgação / Crédito: Netflix).

 

No decorrer de pouco mais de duas horas e meia, Spike Lee critica o belicismo americano para conscientizar o espectador de que guerras nunca acabam, pois suas feridas acompanham o indivíduo até o fim da vida. Muitas destas feridas surgem em cena como traumas e fantasmas do passado, sintetizados, aqui, na figura de Paul, uma espécie de Coronel Kurtz, personagem de Marlon Brando no clássico de Coppola. Subestimado pela indústria, Delroy Lindo entrega a atuação mais sublime de sua carreira, passeando com segurança pela dor que origina a loucura de seu personagem na volta à selva. É uma explosão cênica que explora a dualidade de Paul, vitimado pelo preconceito e favorável ao muro do presidente Donald Trump na fronteira com o México, e pode colocar Lindo na corrida pela estatueta do Oscar de melhor ator no próximo ano – caso a pandemia do novo coronavírus não ocasione o cancelamento da temporada de premiações americana.

 

No entanto, “Destacamento Blood” pode causar certa estranheza nos quesitos maquiagem e efeitos visuais no que tange aos flashbacks, protagonizados pelo mesmo grupo de atores sem nenhum recurso de rejuvenescimento, algo que a própria Netflix fez em “O Irlandês” (The Irishman – 2019), de Martin Scorsese. Mas isto também pode ser encarado como um recurso do realizador para reforçar a ideia de que os veteranos ainda estão emocionalmente ligados a tudo o que vivenciaram no Vietnã. Outro fator que chama a atenção é a facilidade do roteiro no que diz respeito à rápida localização das barras de ouro em meio à selva, após décadas e deslizamentos de terra. Este é um deslize que não chega a comprometer o resultado final do longa, mas expõe falta de apuro dos roteiristas, algo que também pode ser observado na obviedade dos membros da ONG que trabalha desarmando minas terrestres no local.

 

Recusado pelos grandes estúdios, segundo Spike Lee em entrevista ao The Hollywood Reporter, “Destacamento Blood” ganha contornos de filme de ação sem perder o cunho político em nenhum momento, reforçando a autoralidade do cineasta. Abordando a importância de laços familiares, este longa se inspira no passado para refletir a atualidade, citando em sua trama o importante movimento “Black Lives Matter”.

 

Assista ao trailer oficial legendado:

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