Odirley Isidoro publica mais um texto em sua coluna no portal SRzd.
Natural de São Paulo, nasceu no bairro do Parque Peruche, na Zona Norte da cidade. Poeta, escritor, pesquisador e sambista. Ao longo de sua trajetória, foi ritmista das escolas de samba Unidos do Peruche e Morro da Casa Verde, além de ser um dos fundadores da Acadêmicos de São Paulo.
As publicações são semanais, sempre às terças-feiras, na página principal da editoria do Carnaval de São Paulo. Leia, comente e compartilhe!
Em 26 de fevereiro de 1990 as cores explodiam em nossos olhos com a luz do sol matinal.
Nas bancas de jornal “pipocavam” as matérias sobre as noites de folia. Entre as propagandas da época e os problemas da cidade, o Carnaval era a capa das principais mídias e vinha recheado com tudo que se pode imaginar de convite para curtir os Bailes no Palace e demais clubes, além da ressaca pós noites de folia na Avenida Tiradentes.
Dias antes dos desfiles de momo, Joãozinho Trinta disse: “São Paulo está a caminho de ter um excelente Carnaval. Afinal, a cidade se transformou em um verdadeiro país e tem tudo para fazer um espetáculo”.
Todas as escolas se preparavam para trazer inovações, o perfume do Carnaval ganhava requintes de lembrança como aquele aroma de alfazema que nossas avós usavam e ficavam no ar.
Nós teríamos naquelas noites a certeza de evolução desde a Avenida São João, mas com a mensagem que o evento trazia: “Carnaval do povo para o povo”.
Sem percebermos, ali nascerá um ritual de adeus ao negro piso da Tiradentes e suas infinitas arquibancadas de madeira, as famosas aglomerações e cordões policiais na cabeceira da pista para as escolas poderem desfilar, o trânsito maluco de pessoas e carros alegóricos no centro da maior cidade do país e aquele rastro de espelhos, lantejoulas, paetês! Saudade!
Quando a massa alvinegra dos Gaviões da Fiel pisou na Avenida às 21h com o sempre jovem Ernesto Teixeira, que na época era “Ernesto dos Gaviões”, eles não imaginavam que estavam contando não apenas a história baseada em Ícaro, sobre o homem e o desejo de voar, eles estavam abrindo as asas para um momento de modernização de nosso Carnaval.
Todos os conceitos que foram usados desde a oficialização em 1968 se encerrariam ali, abrindo precedentes para um formato mais luxuoso, mais artístico, mais teatralizado, mais visual.
Ao passar de cada escola naquela chuvosa noite se via a comunhão entre as pessoas, seja para dividir um guarda-chuva, tomar um copo de café ou comer um frango assado.
Era o momento de confraternizar, afinal, os ingressos já tinham um preço “salgado” e as pessoas suavam muito para estar ali.
Entre tanto luxo e tanta riqueza que a Avenida apresentava, o destaque principal fora a rigorosa chuva que estragou os planos das escolas em mostrarem toda a evolução.
Os 20 mil foliões, que encharcados encaravam aquela madrugada, tentavam animar a arquibancada daqueles mais de mil metros de Avenida, e a plateia cantava para ajudar.
Mas o tempo fora cruel demais naquela noite…
Graças à Santa Cecilia, a Deusa da Música, os compositores nos abençoaram com um dos melhores LP´s de samba-enredo do final dos anos 80, com letras ricas em poesia e refrões de fácil assimilação. O público cantava a plenos pulmões, mesmo com tanta adversidade, afinal, isto faz parte do DNA do sambista: adversidade.
O relógio se arrastava pela madrugada e o sol começava a despontar após o “fuzuê” mostrado pelo Vai-Vai e a celebração ao Deus Baco e os antigos Carnavais que a Unidos do Peruche trouxe. Mesmo com a motivação da Mocidade Alegre, restou ao Camisa Verde Branco fechar com glamour e “cheiro de café” aquele que seria um ano mágico, mas São Pedro não quis.
Porém, o que ninguém reparou, foi que a cada bye bye ecoado por Agnaldo Amaral ao final do desfile do “Trevo da Barra Funda”, nós nos despedíamos da simplicidade e harmonia do povo nas arquibancadas, da cadência das baterias, do talento primoroso dos carnavalescos na concepção de seus enredos criativos e, principalmente, dos poéticos sambas-enredos.
Bye bye 1990, bye bye Avenida Tiradentes!
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