‘O dom da Beija-Flor’: agremiação escolhe o samba preferido da comunidade

Quem conhece a Beija-Flor de outros carnavais, sabe que a azul e branca de Nilópolis não costuma escolher samba que não seja o favorito da comunidade. No desfile que vai relembrar seus 70 anos de história, não poderia ser diferente. Após ser abraçado pela maior parte da torcida nilopolitana, o samba de número 4, composto pela parceria de Julio Assis, Kiraizinho, Di Menor Bf, Diego Oliveira, Fabinho Ferreira, Diogo Rosa, com participação especial de Bakaninha Beija-Flor, Léo do Piso e Manolo, venceu as eliminatórias e se tornou o hino da Beija-Flor para o Carnaval 2019.

– Ouça o samba campeão

Mas se engana quem pensa que a decisão foi fácil. Diferente do ano passado, quando a parceria vencedora do concurso foi campeã com sobras, a disputa foi acirrada. O samba de número 7, assinado pela parceria de Serginho Aguiar, fez frente e era desejado por parte da quadra na noite desta quinta-feira (4), quando a Beija-Flor fez festa para celebrar a obra do próximo desfile. A enquete do SRzd já havia apontado equilíbrio na decisão. O samba 4 venceu com 54% dos votos, enquanto o 7 ficou com 46%.

Veja o momento do anúncio:

Foi um pedido da comissão de Carnaval, que virássemos a página

Julio Assis, cabeça da parceria ganhadora, acredita que a energia que o samba passou durante as eliminatórias foi fator decisivo para o bicampeonato no concurso. Ele ressaltou que procurou atender ao pedido dos carnavalescos, que desejavam uma obra diferente. “É um samba alegre do início ao fim. Esse é o principal ponto positivo. Foi um pedido da comissão de Carnaval, que virássemos a página. A Beija-Flor vinha com um samba tradicionalmente mais rebuscado na sua melodia e tentamos mudar isso”.

O compositor ainda elegeu suas partes favoritas no – agora – samba da Beija-Flor: “‘Você me conhece de outros carnavais’ é legal pois retrata o enredo da escola esse ano. A parte ‘corre em minhas veias, sangue azul e branco’ é muito boa porque representa essa galera que está na quadra assistindo. Muita gente carente, com problema social, mas que vem para a quadra com maior prazer”.

Torcida do samba 4 na final. Foto: Eliane Pinheiro/SRzd

Companheiro de Julio na composição, Dimenor era só felicidade após a divulgação do resultado: “É uma coisa muito boa, mas ser bicampeão é melhor ainda. Quando fizemos a obra, fizemos com muito carinho, porque a Beija-Flor precisa e merece isso”, disse.

Na comemoração da vitória, compositores se misturaram com segmentos e comunidade para uma volta olímpica pela quadra com o troféu de campeão. A porta-bandeira Selminha Sorriso, parceira de Claudinho, foi uma das que puxou a turma para a festa após o anúncio: “Esse era o meu samba. Tenho certeza que faremos um grande Carnaval”, disse, em êxtase, a porta-bandeira, que investiu em uma roupa estampada por beija-flores, para ilustrar o enredo “Quem não viu, vai ver… as Fábulas do Beija-Flor”.

Comunidade comemorou a decisão da escola. Foto: João Carlos Martins/SRzd

Junção foi descartada

O clima na Beija-Flor era de fusão. A começar pela escola ter levado somente dois sambas à final. Acostumada a levar de três a quatro obras para a decisão, todas as vezes em que a agremiação optou por escolher entre duas composições, decidiu fundir as obras. As ocasiões em que isso ocorreu foram em 2002, 2005 e 2012. No entanto, a azul e branca quebrou o tabu e ficou com o samba de Julio Assis e parceiros para representar a escola em 2019.

O SRzd apurou que havia uma junção feita. O novo samba teria a maior parte da obra campeã e o refrão principal do samba derrotado, de Serginho Aguiar e cia. A direção junto da comissão de Carnaval, porém, decidiram não levar adiante a ideia.

As pessoas acreditavam tanto que a fusão poderia acontecer que, minutos antes do anúncio, componentes e membros da comunidade diziam aguardar alguém que chegaria para distribuir a letra do samba já misturado. O que não ocorreu, para a surpresa de boa parte do público da quadra.

Torcida do samba campeão entrando na quadra lotada da Beija-Flor. Foto: João Carlos Martins/SRzd

Superprodução da parceria campeã

A decisão da atual campeã foi dividida em duas etapas. Na primeira, os sambas 4 e 7 se apresentaram durante 30 minutos. A novidade ficou por conta da proibição de adereços e efeitos especiais. O intuito era avaliar o rendimento do samba com a comunidade, sem ser auxiliado por elementos externos que não estarão no desfile oficial. As duas composições tiveram boas passagens e encerraram a primeira parte da disputa sem um favorito.

– Reveja a transmissão da final da Beija-Flor

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Na segunda fase, os sambas das parcerias de Julio Assis e Serginho Aguiar retornaram ao palco para uma nova apresentação, ‘vale tudo’, durante 20 minutos.

Capitaneado pelo intérprete Tinga e repleto de efeitos, o samba 4, que veio a ser o campeão, se destacou. A parceria investiu em fogos de artifício, fogos indoor, telão de LED no palco que passava a letra do samba, explosões de serpentinas, chuva de papel picado, bolas e bandeiras, além de uma fumaça especial que saia do palco de apresentação. Com produção digna de Hollywood, a obra conquistou comunidade, segmentos e camarotes e terminou a passagem com gritos de campeã.

Logo em seguida, o samba da parceria de Serginho Aguiar também fez bonito com torcida numerosa e Wander Pires no microfone principal. Assim como a obra anterior, a composição também saiu com gritos de campeã, mas era nítida a preferência da quadra pelo samba anterior.

Caso de família

Uma das curiosidades entre o samba campeão e a própria Beija-Flor é que um dos compositores da obra vencedora, Diego Oliveira, é irmão da rainha de bateria Raíssa, desde 2003 à frente dos ritmistas de mestre Plínio e Rodney. Questionada sobre como fica a torcida com o irmão na disputa, a majestade confessou passar por uma situação difícil.

“Nessa hora eu tenho que vestir a camisa da Beija-Flor. O que for melhor para a escola, a gente torce. Eu falo para ele que não vou gravar o samba para não ficar na cabeça e acostumar. É uma parceria com muitos méritos, além do meu irmão, são os ‘meninos de ouro da Beija-Flor’. Mas tento me manter o máximo imparcial”, disse a rainha, que estava vestida, segundo ela, de bandeira da agremiação.

Raíssa Oliveira junto de Cássio Dias, diretor da ala de passistas. Foto: Eliane Pinheiro/SRzd

Receita de sucesso

Impulsionado pelo verso “Mas o samba faz essa dor dentro do peito ir embora”, o hino da azul e branco que levou à escola ao campeonato do último Carnaval entrou para a história. A composição que conquistou a Sapucaí e o Brasil voltou a ser entoada fortemente na quadra na noite da final. E já que a receita deu certo, a Beija-Flor quer repetir a dose em 2019. A começar pelo samba vencedor, já que a parceria ganhadora é a mesma do ano anterior.

“Quando pensamos no samba, tentamos trazer todas as potencialidades de uma obra. A música tem que ser um convite à dança. Hoje em dia, o público que está na Sapucaí não é o público que acompanha somente escola de samba. São pessoas do Brasil inteiro, que às vezes não tem uma escola específica. Aí está o grande desafio: a obra tem que seduzir e conquistar esse povo”, disse o diretor artístico e coreógrafo da comissão de frente, Marcelo Misailidis.

Marcelo Misailidis (meio) é coreógrafo da comissão de frente e diretor artístico da Beija-Flor. Foto: João Carlos Martins/SRzd

A Beija-Flor prepara um novo olhar para os 70 anos da escola

Mas se engana quem pensa que a atual campeã vai seguir o estilo de desfile de 2018. Segundo Gabriel David, conselheiro e filho do presidente de Honra, Anísio David, a Beija-Flor de 2019 será diferente do último Carnaval e virá com “a sua cara de inovação”. Ideia compartilhada por Cid Carvalho, membro da comissão de Carnaval.

– Confira as fantasias comerciais da Beija-Flor para 2019

“Não adianta olhar para trás. Era outro enredo, uma outra proposta. A Beija-Flor agora prepara um novo olhar, com frescor, para os 70 anos da escola. Tenho certeza que temos outro grande samba”, afirmou o carnavalesco, que confessou ao SRzd ter chegado a uma final, pela primeira vez, em dúvida do samba preferido.

Victor Santos, Bianca Behrends, Cid Carvalho, Leo Mídia e Rodrigo Pacheco formam a comissão de Carnaval da Beija-Flor. Foto: João Carlos Martins/SRzd

Gabriel David exalta concurso e trabalho da escola

Acostumada a grandes disputas, o concurso de samba-enredo da Beija-Flor durou 33 dias. O menor do Grupo Especial. Para o conselheiro Gabriel David, as eliminatórias deste ano serviram para mostrar o trabalho de reformulação e fortalecimento da marca da escola que vem sendo feito nos últimos anos. Além disso, com menos etapas na quadra, melhor para o bolso dos compositores, que tiveram custos reduzidos comparados a anos anteriores.

A escola mostrou a seriedade do trabalho da Beija-Flor

“A escola mostrou a seriedade do trabalho da Beija-Flor. Hoje, na final, os compositores que estão na quadra estão felizes pelo concurso que participaram. Primeiro, porque sempre souberam que a disputa aqui é verdadeira, mas, acima de tudo, eles percebem que a escola não está pensando só nela, mas sim neles e na comunidade, até porque sem eles a escola não é nada”, disse o filho de Anísio.

Gabriel David junto do casal de mestre-sala e porta-bandeira Claudinho e Selminha. Foto: Eliane Pinheiro/SRzd

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