Ana Carolina Garcia. Foto: SRzd

Ana Carolina Garcia

Jornalista formada pela Universidade Estácio de Sá, onde também concluiu sua pós-graduação em Jornalismo Cultural. Em 2011, lançou seu primeiro livro, "A Fantástica Fábrica de Filmes - Como Hollywood se Tornou a Capital Mundial do Cinema", da Editora Senac Rio.

A lacuna deixada por Os Trapalhões e Xuxa no cinema nacional

Previsto para estrear em janeiro de 2017, “Os Saltimbancos Trapalhões – Rumo à Hollywood” (2017) é mais do que a nova versão de “Os Saltimbancos Trapalhões” (1982), pois marca a reunião de Renato Aragão e Dedé Santana na telona após um hiato de 17 anos, desde o lançamento de “O Trapalhão e a Luz Azul” (1999), que encerrou a “era dos Trapalhões” no cinema.

Os Saltimbancos Trapalhões. Foto: Divulgação
Os Saltimbancos Trapalhões. Foto: Divulgação

O anúncio de um novo longa-metragem com a dupla de humoristas que, ao lado de Mussum e Zacarias, levou alegria para os brasileiros durante muitos anos, tanto na televisão quanto no cinema, tem peso porque significa uma visita aos tempos em que “Os Trapalhões” dominavam as salas de todo o país, conquistando a audiência de milhões de pessoas numa época em que a cinematografia nacional não sofria a pressão da marca de “um milhão de espectadores”, instituída recentemente por comédias de grande apelo popular.

Muitas vezes oscilando entre a inocência e o humor politicamente incorreto, o grupo plantou sua semente ainda na década de 1960, mas apenas em 1978 invadiu as salas como um quarteto em “Os Trapalhões na Guerra dos Planetas” (1978), sob a direção de Adriano Stuart. Sempre optando por filmes com temáticas para toda a família, filão explorado com maestria pela Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) no período clássico da indústria hollywoodiana, sobretudo nos anos dourados (1930 – 1940), os Trapalhões ofereceram entretenimento de qualidade para todas as idades. Tanto que o já citado “Os Saltimbancos Trapalhões” figura entre os grandes clássicos do cinema brasileiro, contando ainda com Lucinha Lins e Mário Cardoso, em seu quarto longa-metragem com os humoristas e no auge da carreira após os sucessos das novelas “A Moreninha” (1975) e “A Escrava Isaura” (1976).

Os Trapalhões já haviam se tornado sucesso absoluto de público quando ganharam uma parceira e tanto em seus filmes: Xuxa Meneghel, antes de se tornar um fenômeno televisivo com o “Xou da Xuxa” (1986 – 1992), programa que lhe garantiu o título de Rainha dos Baixinhos. No entanto, a primeira colaboração de Xuxa aconteceu num período conturbado em que Renato Aragão havia se desentendido com os outros integrantes e, em decorrência da briga, foi o único Trapalhão no elenco de “O Trapalhão na Arca de Noé” (1983).

Com a situação do grupo normalizada, a atriz e apresentadora estrelou seu primeiro longa ao lado de toda a trupe no ano seguinte, “Os Trapalhões e o Mágico de Oroz” (1984). A parceria com Xuxa Meneghel atingiu seu ápice com “A Princesa Xuxa e os Trapalhões” (1989), filme que levou mais de quatro milhões de pessoas aos cinemas à época de seu lançamento, também colhendo os louros do “Xou da Xuxa” e do longa “Super Xuxa Contra o Baixo Astral” (1989).

A Princesa Xuxa e os Trapalhões. Foto: Divulgação
A Princesa Xuxa e os Trapalhões. Foto: Divulgação

A boa recepção desses filmes deve-se ao fato de que no passado o cinema brasileiro tinha o hábito de olhar na direção do público infanto-juvenil que, por sua vez, aguardava seus lançamentos com ansiedade, pois eles faziam parte da programação das férias escolares. E, quando não estavam em cartaz, assumiam o papel de “babá” da geração que cresceu assistindo à “Sessão da Tarde”, que repetia esses títulos incessantemente, não apenas “A Lagoa Azul” (The Blue Lagoon – 1980), “Karatê Kid – A Hora da Verdade” (The Karate Kid – 1984), “Os Goonies” (The Goonies – 1985) e “Willow – Na Terra da Magia” (Willow – 1988), por exemplo.

Sentindo o baque das perdas de Zacarias e Mussum, comediantes talentosos que conseguiam arrancar gargalhadas genuínas da plateia com pouco (ou nenhum) esforço, o grupo se enfraqueceu, o que se agravou com a separação de Dedé Santana e Renato Aragão, algo que acabou por se refletir também no cinema infantil; apesar das constantes investidas de Aragão, que anos mais tarde passou a priorizar filmes protagonizados ao lado de sua filha caçula, Lívian Aragão, enquanto Xuxa continuava a estrelar seus longas, obtendo sucesso, mas sem o mesmo impacto de outrora, apesar da gorda bilheteria.

A verdade é que nos últimos anos, o cinema brasileiro deixou produções infanto-juvenis em segundo plano, desperdiçando materiais interessantes até mesmo da nossa cultura que renderiam muito bem na tela se produzidos com o mínimo de esmero. Com isso, o que encontramos hoje são pouquíssimas produções para esta fatia considerável do público e que bebem da fonte de Os Trapalhões e Xuxa, mas sem o carisma e o poder cênico deles.

Numa época em que o cinema brasileiro começa a se destacar por investir com mais afinco em gêneros diferenciados, percebendo que há muito mais a ser explorado do que os favela-movies e as comédias apelativas, gradativamente postos em segundo plano, a lacuna deixada por estas produções se evidencia porque, ao contrário do que acontece na indústria hollywoodiana, o público infanto-juvenil é cada vez mais subestimado pela cinematografia nacional.

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