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Saudade, só deixou saudade, por Jaime Cezário

Acadêmicos da Grande Rio 2022. Foto: Matheus Siqueira/SRzd

Acadêmicos da Grande Rio 2022. Foto: Matheus Siqueira/SRzd

* Texto inspirado em letras de sambas e marchinhas imortais e uma homenagem aos grandes Carnavais.

Acorda leitor, vem à janela ver o sol nascer, um lindo dia se anuncia… Vamos viver, ou melhor, reviver essa saudade gostosa que hoje bate no peito, na fantasia do eterno folião que somos nós, amantes do Carnaval.

Novos tempos, mundo estranho, pessoas diferentes… Dizem que tudo na vida é cíclico, então, que renasça uma nova “bela época” e que um menino iluminado venha trazer para nós um novo brilho no olhar. Quero voltar a sonhar, afinal não custa nada, que uma estrela de luz nos faça viajar pelo infinito dos belos enredos, como se fosse magia, num afã de poesia para tudo clarear. Será um sonho de um sonho?

Ao longe eu ouço o passo marcado das pastorinhas, acompanhado por um pássaro cantor, dizem que quem ouvir esse canto, abraça a sorte e afasta o azar. Será que é meu dia de sorte? Vou ter que procurar uma cigana para ler o meu destino, preciso saber se a magia da sorte está no ar.

Quero viver essa vida ou esse dia, num clima de festa no arraiá. Preciso balançar a roseira e fazer a poeira subir, deixar a tristeza para lá, afinal, dizem que para ser feliz não é preciso contar até três.

Ouço sons de acordes geniais de um violão, sinto que estou entrando no reino da loucura, esse estado de insanidade onde teimosia e vaidade dão as mãos. Não importa, se for preciso vou me vestir como um galante Dom Quixote e lutar até a morte na minha loucura idealista por você meu Carnaval! Sinto nesse momento, que caiu uma lágrima sentida, mas que é colorida, lembrando um tempo que passou. Preciso voltar a viver essa doce ilusão, quero me extasiar neste jardim da sedução e riscar esse chão de poesia. Se você não acredita, por favor não me complica, deixa minha viagem rolar.

Ouço novamente sons, são batuques, bum bum paticundum prucurundum. Vejo ao longe um céu de serpentinas e uma multidão de foliões animados e felizes. O ritmo é frenético e inebriante. Vejo um Rei erguendo uma taça, numa espécie de convocação da massa. Observo que é uma festa de todas as raças e todos numa mesma união. Chego mais perto e ouço o canto emocionado desse povo que com seu sorriso estampado no rosto, vão ocupando as ruas e as avenidas, eles querem festejar. Um grito forte ecoa noa ar: É tempo de Carnaval!

Vejo Pierrôs, Colombinas e Arlequins. O Dominó ganhou confete e veio me saudar, me convidando para viver esse momento de pura paixão. Não resisti, rasguei minhas roupas do dia a dia e me banhei nesse chuveiro das ilusões. A multidão segue feliz, cantando animada deixando a tristeza pra lá, afinal já disse o poeta, a vida vai melhorar!

Na concentração de gente feliz, me alio ao Dominó e começo a convidar mais componentes que observam animados. Convido Dalva, Derci, Bibi, Braguinha, Lamartine, Carequinha, João, Arlindo, Fernando, as Rainhas do Rádio, Paulo Gracindo e tantos outros que ali acompanhavam o cortejo sem medo de serem felizes.

A festa não para e segue animada. O tempo passa sem sentir, mas todo sonho bom tem um fim. Chega o recado da diretoria, avisando que tudo vai acabar na quarta-feira. O ritmo diminui, a saudade que tínhamos deixado lá fora, já começa dar sinais que quer voltar. Quem dera que a vida fosse sempre assim, sonhar, sorrir e nunca mais ter fim, quem dera…

Uma bandeira branca se levanta e um clarim anuncia que chegou a hora da alegria findar. É hora de retornar para dura realidade do dia a dia. Encarar o trem lotado com o peito amargurado baldeando por ai. Não é mole não! E ainda tem o famigerado “leão” que junto com a inflação só querem morder o bumbum de pobre. Não é mole não meu irmão!

O canto vai silenciando e cada folião vai voltando pro seu plano, contando os dias para tudo recomeçar! Mas ainda temos tempo para um grito emocionado de um Pierrô apaixonado que diz, Carnaval te amo, na vida és tudo pra mim! A festa acabou! Boa noite moça, boa noite moço… Saudade, só deixou saudade!

Jaime Cezário é arquiteto urbanista, carnavalesco, professor e pesquisador de Carnaval.

Começou sua carreira como carnavalesco no ano de 1993, no Engenho da Rainha. Atuou em diversas escolas de samba do Rio de Janeiro, entre elas, a Estação Primeira de Mangueira, São Clemente, Caprichosos de Pilares, Paraíso do Tuiuti, Acadêmicos do Cubango, Leão de Nova Iguaçu e Unidos do Porto da Pedra. Fora do Rio, foi carnavalesco da Rouxinóis, da cidade de Uruguaiana, e União da Ilha da Magia, de Florianópolis.

Em 2007 e 2008 elaborou o trabalho de pesquisa que permitiu a declaração das escolas de samba que desfilam na cidade do Rio de Janeiro como Patrimônio Cultural Carioca, junto da Prefeitura do Rio de Janeiro e do IRPH, o Instituto Rio Patrimônio da Humanidade.

Em 2013, a fantasia da ala das baianas – criada por Jaime para o Carnaval de 2012 para a Acadêmicos do Cubango –, entrou para o acervo permanente do Museu de Arte Moderna de Iowa, no EUA.

Essa fantasia está exposta no setor dedicado as festas folclóricas da América Latina e representa o Carnaval das escolas de samba do Brasil. Esse feito fez de Jaime o primeiro carnavalesco a ter uma obra exposta em acervo permanente num museu internacional.

Crédito das fotos: Acervo e acervo pessoal de Jaime Cezário
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do portal SRzd

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