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Jaime Cezário analisa os enredos do Rio de Janeiro para 2023

Sambódromo da Marquês de Sapucaí iluminado para o Carnaval 2021. Foto: Henrique Matos

O universo carnavalesco se agita e as escolas de samba estão lançando seus enredos, com novos comandos artísticos na maioria delas; seja no Especial ou no Acesso. Um fato curioso e interessante, mesmo com o tempo de preparação do próximo Carnaval mais reduzido, tendo ainda eleições e uma Copa do Mundo no meio do caminho, é que algumas escolas ainda não revelaram seus temas para 2023.

A ideia desta coluna era poder viajar num comentário geral de visão dos novos enredos, mas devido a esse efeito tardio em revelar suas histórias, pincelei as que já mostraram o que querem contar na Avenida, mesmo sem a maioria das sinopses ter sido apresentada.

Vamos começar por ela, a escola centenária, a Portela, que celebra seus 100 anos de existência, fundada em 11 de abril de 1923, no bairro de Oswaldo Cruz. Veremos sob o comando dos carnavalescos Renato Lage e Márcia Lage a história da escola de samba que mais vezes foi campeã do Grupo Especial. Um enredo absolutamente carnavalesco, alegre e de celebração, onde aguardamos curiosos a sinopse para saber a linha mestra dessa história. O que já sabemos é que, com certeza, será um dos momentos mais aguardados do próximo desfile.

Portela 2022. Foto: Juliana Dias/SRzd

Pegando uma carona nessa história centenária da Portela, a coirmã que a tem como madrinha, a União da Ilha, levará para o Grupo de Acesso; “O encontro das Águias no templo de Momo”, sob o comando do carnavalesco Cahê Rodrigues.

Outro enredo festivo e que merece destaque. A história da Portela é tão grandiosa que tem informação para muitos bons enredos. Lembrando o samba de 1980, da escola insulana, do enredo “Bom, Bonito e Barato”: “Obrigado madrinha Portela que me ajudou a caminhar”. Esse é outro Carnaval que aguardaremos com ótima expectativa, visto que a Ilha fez um dos melhores desfiles de 2022 nesta divisão.

Já que iniciamos com Oswaldo Cruz e Madureira, falaremos da escola que ascendeu ao Grupo Especial em 2023, o Império Serrano. O Império trouxe para comandar sua parte artística o carnavalesco Alex de Souza e traz uma história que faz uma justíssima homenagem a um grande imperiano e sambista, Arlindo Cruz. Com o título do enredo: “Lugares de Arlindo”, imagino uma viagem musical no universo das grandes composições, parcerias, Cacique de Ramos, sambas-enredos e o subúrbio carioca. Outro enredo festivo, carnavalesco, oportuno e necessário que vai fazer a Sapucaí balançar em 2023.

Arlindo Cruz. Foto: Divulgação
Arlindo Cruz. Foto: Divulgação

Vamos seguir nossa viagem agora visitando a Rainha da Ramos, a Imperatriz Leopoldinense. A Imperatriz trouxe para comandar sua arte Leandro Vieira, e que estava com a cabeça fervilhando de enredos para 2023. Muitos foram os boatos, inclusive de um enredo que falaria do subúrbio da Leopoldina com suas histórias e personagens marcantes, mas tudo foi criado para esconder o verdadeiro tema que será uma viagem pela literatura de cordel, contando as histórias de Lampião chegando ao céu e ao inferno, com o título: “O aperreio do cabra que o excomungado tratou com má-querença e o santíssimo não deu guarida”. A temática nordestina delineará essa viagem fantástica e delirante que veremos no próximo Carnaval da Imperatriz.

Atravessando a baía de Guanabara, aportamos no Barreto, terra da Unidos do Viradouro que, para 2023 traz no comando da sua criação Tarcísio Zanon. A escola de Niterói é hoje uma das mais aguardadas em seus desfiles pelo luxo e requinte. Para 2023 foram buscar inspiração numa história inédita, resgatando uma personagem pouco conhecida, que é da primeira escritora negra do Brasil, a qual dá nome ao enredo: “Rosa Maria Egipciáca”. Rosa nasceu em Benim e morreu em Lisboa, mas foi trazida como escrava para o Brasil. Aqui se tornou meretriz, feiticeira, beata e escritora, assuntos que deverão permear a viagem carnavalesca da agremiação. A sinopse ainda não foi revelada.

Aproveitando que já estamos em Niterói, vamos seguir para o município vizinho que é São Gonçalo e falar da Unidos do Porto da Pedra, que está no Grupo de Acesso. O Tigre trouxe para comando artístico o carnavalesco Mauro Quintaes. O enredo tem como título: “A invenção da Amazônia” e, em síntese, abordará as lendas e mistérios do Amazonas. O assunto não teria muita novidade, a novidade mesmo, será a forma que vai ser desenvolvido, vamos ver esse enredo interpretado como uma história de Júlio Verne. Bom, para quem não conhece Júlio Verne, ele é considerado o pai da ficção científica, “A volta ao mundo em 80 dias” e “Vinte mil léguas submarinas” são exemplo de suas obras literárias. Contando com a experiência do carnavalesco, o que poderia ser mais do mesmo, deverá resultar numa bela e fantástica viagem ficcional.

Vamos subir o morro da “Primeira Estação”… “Quando o verde se derrama em rosa pela Avenida, o céu se agita, o morro mostra seu samba”. Assim começa a sinopse da Estação Primeira de Mangueira para o Carnaval de 2023, com o enredo “As Áfricas que a Bahia canta”. Para o comando artístico teremos uma dupla jovem de carnavalescos, Annik Salmon e Guilherme Estevão, que assumem uma baita responsabilidade e oportunidade de comandar essa grande escola de samba.

O tema tem a Bahia como universo, algo que na escola já deu títulos, basta lembrar de enredos como “Lendas do Abaeté”, de 1973, e “Caymmi mostra ao mundo o que a Bahia e a Mangueira têm”, de 1986. “Iaiá mandou ir à Bahia”, “Bahia terra sagrada”, já diziam esse sambas em seus versos e os carnavalescos não pestanejaram, partiram nessa energia baiana, querendo repetir o mesmo caminho do antecessor, que com Maria Betânia, também baiana e o Orixá Oya, conquistaram a passarela do samba. A sinopse foi revelada e, com sinceridade, gostei; clara poética, você lê e consegue entender os caminhos que deverão seguir. Tem todos os ingredientes para render um grande samba.

Agora é a vez da atual campeã do Carnaval Carioca, a Grande Rio, de Duque de Caxias. A escola manteve com sabedoria a dupla de carnavalescos, Leonardo Bora e Gabriel Haddad, e que ainda nas comemorações do seu primeiro título, já lançaram o tema do próximo Carnaval; uma homenagem ao cantor e compositor Zeca Pagodinho.

A escola ainda não lançou sua sinopse, mas imagino por tudo que já ouvi e li, que será uma viagem capitaneada por Cosme e Damião e São Jorge (santos de devoção de Zeca) na história do homenageado, valorizando principalmente sua ligação com o subúrbio carioca. Vamos aguardar a liberação da sinopse.

Agora pouco, encerrando o texto da coluna, o Paraíso do Tuiuti usando suas redes sociais divulgou o título do seu enredo: “Mogangueiro da Cara Preta”. Parece ser uma espécie de pegadinha para aguçar a curiosidade dos amantes do Carnaval.

Mas, pudera! Temos hoje no comando artístico a dupla de carnavalescos que adoram exaltar nos enredos os bons caminhos da cultura brasileira; a professora Rosa Magalhães e João Vitor Araújo. A escola lançou o título, mas nenhuma explicação do assunto que abordará no enredo. Bom, fiquei aqui matutando pelas dicas deixadas pelos dois carnavalescos. A palavra “moganguista” ou “mogangueiro” representa uma pessoa que faz trejeitos. Onde temos citações desse termo é no estado do Pará, na Ilha do Marajó. Estava achando que poderia ser inspirado na obra literária de Guimarães Rosa, o “Grande Sertão: Veredas”… Ou quem sabe, uma viagem no universo sertanejo com o ciclo do gado no sertão e a representação simbólica da figura do boi preto, como criatura mítica no qual o escravo é travestido. Enxergando na saga do boi o drama dos africanos escravizados no Brasil, que é entoada por cantadores de origem ou de descendência africana, onde misturam realidade e imaginário, ou quem sabe uma mistura de tudo isso. Bom, vamos aguardar a liberação oficial da sinopse com a explicação exata do que vão nos falar e mostrar na Sapucaí em 2023.

Ficarei devendo aos leitores falar ainda de enredos de várias escolas de samba, o motivo é que ainda não revelaram seus temas enredos, o que deverá ficar de assunto para uma próxima coluna. Salve o Carnaval!

Jaime Cezário é arquiteto urbanista, carnavalesco, professor e pesquisador de Carnaval.

Começou sua carreira como carnavalesco no ano de 1993, no Engenho da Rainha. Atuou em diversas escolas de samba do Rio de Janeiro, entre elas, a Estação Primeira de Mangueira, São Clemente, Caprichosos de Pilares, Paraíso do Tuiuti, Acadêmicos do Cubango, Leão de Nova Iguaçu e Unidos do Porto da Pedra. Fora do Rio, foi carnavalesco da Rouxinóis, da cidade de Uruguaiana, e União da Ilha da Magia, de Florianópolis.

Em 2007 e 2008 elaborou o trabalho de pesquisa que permitiu a declaração das escolas de samba que desfilam na cidade do Rio de Janeiro como Patrimônio Cultural Carioca, junto da Prefeitura do Rio de Janeiro e do IRPH, o Instituto Rio Patrimônio da Humanidade.

Em 2013, a fantasia da ala das baianas – criada por Jaime para o Carnaval de 2012 para a Acadêmicos do Cubango –, entrou para o acervo permanente do Museu de Arte Moderna de Iowa, no EUA.

Essa fantasia está exposta no setor dedicado as festas folclóricas da América Latina e representa o Carnaval das escolas de samba do Brasil. Esse feito fez de Jaime o primeiro carnavalesco a ter uma obra exposta em acervo permanente num museu internacional.

Crédito das fotos: Acervo pessoal de Jaime Cezário
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do portal SRzd

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