Cheryl Berno. Foto: Acervo pessoal

Cheryl Berno

Advogada, Consultora, Palestrante e Professora. Especialista em direito empresarial, tributário, compliance e Sistema S. Sócia da Berno Sociedade de Advocacia. Mestre em Direito Econômico e Social pela PUCPR, Pós-Graduada em Direito Tributário e Processual Tributário e em Direito Comunitário e do Mercosul, Professora de Pós-Graduação em Direito e Negócios da FGV e da A Vez do Mestre Cândido Mendes. Conselheira da Associação Comercial do Estado do Rio de Janeiro.

Dia Internacional da Mulher para lembrar que há muito ainda a ser conquistado

No dia 8 de março se comemora o Dia Internacional da Mulher, que serve para lembrar que há muito ainda a ser conquistado. Avançamos, mas há luta pela frente. Há quem discuta nos dias de hoje se a mulher tem direito a decidir até sobre seu próprio corpo. Até os abortos já permitidos por lei, como em caso de estupro ou de feto sem cérebro, se contesta.

Há uma hipocrisia muito grande porque quem carrega o feto não é o crítico, e quem quer mesmo, acaba fazendo intervenções em clínicas melhores, enquanto as pobres morrem aos montes ou são presas e até condenadas, como vimos recentemente. Meninas estupradas por homens da própria família, até pais, irmãos, sendo obrigadas a terem os filhos, crianças correndo até o risco da própria morte porque alguém se acha dono do corpo da mulher, que sempre sofre porque ela, ao final, que terá que levar uma gestação com o fruto de um estupro e cuidar para o resto da vida de uma criança que não foi gerada pela sua vontade.

Caso o homem engravidasse, o aborto já seria permitido em todos os casos faz décadas, mas como é a mulher, segue proibido, e pior que isso, como se fosse um crime sendo que se a mulher quiser ela não tem mesmo, porque o corpo é dela e deveria sempre prevalecer a sua vontade, porque ela que gera a vida. Mesmo indo além destes temas polêmicos, a mulher é ainda hostilizada simplesmente pelo seu jeito de ser, pelo seu temperamento, pelas suas atitudes. Ainda são comuns comentários machistas, que chamam a mulher de louca, gorda, desequilibrada, mal amada, quando não se sabe como contestar com argumentos sólidos algo que ela disse. É mais fácil, interrompê-la ou desqualifica-la por suas características do que trazer argumentos melhores para a discussão.

A sociedade machista é fruto também de mulheres, que perpetuam estas atitudes discriminatórias, que não entendem que tem direitos e devem ser respeitadas. É comum a utilização de termos no masculino até para reuniões de escola, “de pais”, nas quais quase só se fazem presentes as mães e professoras até porque no Brasil ainda é enorme o número de filhos só de mães, porque os pais somem e muitas vezes nem reconhecem a paternidade. Elas mesmo não percebem o quanto até a linguagem estimula o preconceito de gênero e influência na manutenção deste sistema arcaico, no qual o seu papel é de mera coadjuvante dos homens, quando é a protagonista porque ela que tem até o poder da vida. Ela gera, ela gesta, ela carrega, ela pari e na maioria esmagadora dos casos, ela cria.

E as “princesas”? Não percebem as pessoas que assim se referem às meninas, o quanto isso reforça a imagem da mulher frágil, cujo objetivo é servir à corte e casar com o príncipe para ser feliz para sempre. Não se trata da mulher que estuda, que lê, que decide, que tem opinião, mas de um estereótipo de mulher que tem que ser linda, sempre bem arrumada e submissa à corte, ao príncipe, que até o seu destino define. É preciso rever até o jeito de falar, as referências de livros, histórias, papéis, propagandas, para que as mulheres tenham os seus papéis principais, de donas dos seus destinos.

Mesmo quando as mulheres viram executivas, empresárias, chefes, profissionais, continuam sendo cobradas pelas responsabilidades dentro de casa, como se não tivessem uma jornada extra tão puxada, ou até mais cobradas que os homens – continuam tendo jornadas maiores, dentro e fora de casa e ganhando menos que eles. Para provar que é competente uma mulher tem que trabalhar muito mais e sem perder a ternura, porque não se admite uma mulher decidida, líder, dona de si, com opiniões e que fale, ela tem que se desdobrar para ser sempre mais e mais e dar conta de tudo, sempre linda, bem vestida, com um corpo perfeito e bem disposta, humorada, quando deveria compartilhar tarefas em pé de igualdade, dentro e fora de casa. Estamos bem distantes da igualdade social de gênero.

Até em se tratando de opção sexual a mulher é mais criticada, se o companheiro for mais novo, mais velho, mais rico, mais pobre, se ela for gay, muito mais que se os papéis fossem invertidos. Eles ainda podem tudo, as mulheres tem que ser as recatadas. Tivemos a primeira presidenta do Brasil, que mesmo eleita com mais de 50% dos votos foi tirada do poder, pela aprovação de um crédito extraordinário que todos os outros governantes haviam feito, mas ela tinha o pecado de ser mulher, então foi fácil destituí-la. A mulher é sempre mais cobrada por tudo e mais hostilizada em qualquer situação.

Ainda se tem a imagem da mulher maravilha, aquela que dá conta de tudo e todos, aquela que se dedica ao trabalho, à casa, ao marido, aos filhos, aos pais, feliz e com um rosto, um corpo daquelas modelos que vivem disto e fazem todos os tipos de intervenções estéticas ou um simples fotoshop para parecerem perfeitas. Sempre sorrindo e disposta a tudo. O homem pode ter cabelos brancos que é charmoso, mas a sociedade ainda não se acostumou com os cabelos naturais da mulher, que de princesa vira bruxa, porque ainda as colocam como tal quando ficam mais velhas. Envelhecer é pecado muito maior para as mulheres. Como a sociedade pode perdoar uma mulher idosa como a Madonna e tantas outras que não aceitam a sua condição e não se encaixam em padrões retrógrados?

Quando meu filho pergunta porque comemoramos o Dia Internacional da Mulher, respondo que ainda temos que evoluir muito para não precisarmos de ao menos um dia para lembrarmos que as mulheres precisam ser respeitadas sempre, em todos os lugares e terem de fato os direitos garantidos. Até lá, desejamos a todas as mulheres muita força para lutar por um mundo mais igual.

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