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Pearl Jam: Terapia em um show de rock

A história não é nova. Mas relembrei dela ao procurar um presente para um amigo em uma livraria no fim de semana retrasado. Entre diversos livros biográficos sobre bandas de rock, me deparei com uma edição ilustrada com a história do Pearl Jam. E como sempre acontece, dei uma folheada. Havia uma síntese sobre o início da banda e me chamou a atenção a história da gravação do videoclip da música “Alive”, feito com os 20 mil dólares que eram tudo o que eles tinham na época. Por conta do baixo orçamento, o clip foi gravado ao vivo e em preto e branco, e circulou na mídia após o lançamento da música como “single” (compacto). Acabei assistindo a esse clip antes mesmo do lançamento de “Ten”, o primeiro e mais conhecido álbum do Pearl Jam, que tirou a banda do ostracismo.

A história de “Alive”, na verdade, se confunde com o nascimento do Pearl Jam. “Alive”, a música, sem a letra, já existia antes da banda. Foi composta pelo guitarrista Stone Gossard, quando era integrante do Mother Love Bone (banda mítica do cenário musical independente de Seattle, nos EUA, e que serviu de ponto de partida para futuros integrantes do Pearl Jam, Soundgarden e Alice In Chains). Quando Andrew Wood, o líder do Mother Love Bone, morreu de overdose, Gossard espalhou a canção pela costa oeste americana, atrás de integrantes para uma nova banda. Encontrou um surfista californiano chamado Eddie Vedder, que lhe entregou uma letra para a música. Estava criada “Alive” antes mesmo do Pearl Jam.

“Alive” dispensa apresentações. Se você gosta de rock e não hibernou a partir dos anos noventa certamente conhece essa música, que conta a história de um adolescente e suas descobertas dolorosas sobre paternidade. Na verdade é autobiográfica, pois parte do passado do próprio Eddie Vedder, bem como do ambíguo sentimento de “ainda estar vivo”, como diz a música, decorrente das chocantes revelações com que teve que lidar na adolescência. Era o que Vedder chamava de “maldição” que ele próprio carregava pela estrada com o Pearl Jam, show após show.

Entretanto, há uns dez anos, durante uma turnê que foi documentada em vídeo, Vedder informou que a “maldição” havia acabado, em função do significado que os fãs haviam dado à música. O início solene com o riff de guitarra de Stone Gossard, a energia crescente, o refrão “eu ainda estou vivo” entoado repetidas vezes em tom confessional por Vedder, e o final apoteótico com o longo e arrebatador solo de guitarra de Mike McCready, fizeram com que “Alive” virasse um momento intenso de celebração para os fãs durante os shows. O público, ao interagir a música, subtraiu o sentido original e criou um outro diferente; o que era negativo em “Alive” passou a ter viés positivo. Tocar “Alive” para platéias lotadas teve efeito de terapia para Eddie Vedder, que anunciou o fim da “maldição”, sufocada pela força positivista de seus fãs.

Em 2005, quando fui assistir ao show de encerramento da primeira turnê do Pearl Jam no Brasil, no Rio de Janeiro, pude viver esse sentimento. Mesmo passando por um momento turbulento na minha vida pessoal, consegui juntar um grupo de bons amigos para ir ao show. Pude constatar a excelência do Pearl Jam ao vivo, mas o grande momento foi sem dúvida o bis com “Alive”. Palavras como êxtase e, de novo, celebração vêm à minha mente, e poucas vezes o nome da Praça da Apoteose foi tão adequado à atração que lá se apresentava. Graças à força poderosa dessa música, e à resposta a ela dada por todos os presentes. Para mim também teve o efeito de várias sessões de terapia. E foi muito mais divertido.

*em colaboração para a coluna

Pedro de Freitas*

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