Ana Carolina Garcia. Foto: SRzd

Ana Carolina Garcia

Jornalista formada pela Universidade Estácio de Sá, onde também concluiu sua pós-graduação em Jornalismo Cultural. Em 2011, lançou seu primeiro livro, "A Fantástica Fábrica de Filmes - Como Hollywood se Tornou a Capital Mundial do Cinema", da Editora Senac Rio.

Especial Oscar 2022

A 94a cerimônia do Oscar está agendada para 27 de março de 2022 (Foto: Divulgação – Crédito: Richard Harbaugh / ©A.M.P.A.S.).

O Oscar 2022 será realizado no Dolby Theatre, em Los Angeles, no formato presencial (Foto: Divulgação / Crédito: AMPAS).

No próximo domingo, dia 27, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (Academy of Motion Picture Arts and Sciences – AMPAS) realizará no Dolby Theater, em Los Angeles, a 94a cerimônia de entrega do Oscar, prêmio mais cobiçado do cinema mundial. Por esta razão, um especial com análises das categorias principais (melhor filme, direção, ator, atriz, ator coadjuvante e atriz coadjuvante) e um pequeno perfil de seus indicados será publicado ao longo da semana, começando nesta segunda-feira, dia 21, pela categoria de melhor atriz coadjuvante.

 

Nesta edição, a Academia tem como um dos principais desafios realizar um evento capaz de atrair a atenção do telespectador, mantê-lo em frente à televisão durante toda a transmissão e, consequentemente, recuperar a audiência perdida no ano passado – de acordo com a Variety, a queda nos índices em 2021 foi de 58,3% em comparação ao Oscar 2020. A diminuição do interesse do público pela maior festa da comunidade hollywoodiana tem sido observada há alguns anos, mas não há como negar que a pandemia potencializou este fenômeno, pois a indústria sofreu com adiamentos em série que impossibilitaram estreias dentro do período de elegibilidade previsto pela AMPAS, tirando longas-metragens de peso da disputa da 93a edição, entre eles, um dos indicados deste ano, “Amor, Sublime Amor” (West Side Story – 2021, EUA), de Steven Spielberg – remake do clássico homônimo de Robert Wise e Jerome Robbins, lançado em 1961, o longa chegou às salas de exibição em dezembro de 2021, um ano após o previsto.

 

Para evitar nova queda nos índices de audiência, a Academia estudou uma série de medidas para despertar a curiosidade e, obviamente, o interesse do público por seu grande evento. E uma das medidas adotadas pela instituição, que em 2018 teve de suspender os planos de criar a categoria de melhor filme popular, foi utilizar o Twitter como “ferramenta de feedback” do público por meio de votação realizada na própria rede social, anunciada em 14 de fevereiro deste ano. Para tanto, permitiu ao espectador, residente nos Estados Unidos, votar em seus filmes favoritos postando seus respectivos títulos, acompanhados das hashtags “#OscarsFanFavorite” e “#Sweepstakes”, entre os dias 14 de fevereiro e 03 de março – três usuários serão selecionados para a missão de entregar um Oscar no próximo ano, viajando para Los Angeles com todas as despesas pagas pela Academia, de acordo com a Variety. Paralelamente, a AMPAS e o Twitter criaram outra votação, chamada de “#OscarsCheerMoment”, entre os dias 24 de fevereiro e 03 de março, na qual o público escolherá a cena que mais o impactou no decorrer de 2021, que será exibida durante a cerimônia – ainda segundo a publicação, cinco pessoas receberão ingressos de cinema por um ano, além de assinaturas de serviços de streaming e brindes da loja oficial do Academy Museum.

 

No entanto, outra medida em prol da agilidade do show televisivo colocou a Academia no olho do furacão de uma polêmica enorme e que poderia ter sido evitada, uma vez que a instituição colocou em prática algo que, em 2018, tentou, mas não conseguiu: retirar algumas categorias técnicas da transmissão ao vivo da cerimônia, relegando-as, sim, ao segundo plano, bem como os profissionais que nelas concorrem. Ao todo, oito categorias foram vetadas, e suas estatuetas serão entregues no palco do Dolby Theatre uma hora antes do início oficial da cerimônia, sendo apresentadas ao público no decorrer da transmissão – segundo a Variety, Jason Momoa e Josh Brolin estão cotados como apresentadores destes prêmios. São elas: trilha sonora, design de produção, edição, maquiagem e cabelo, som, curta-metragem, documentário (curta-metragem) e animação (curta-metragem).

 

David Rubin na 8a edição do Governors Awards, em 12 de novembro de 2016 (Foto: Divulgação / Crédito: Richard Harbaugh – ©A.M.P.A.S.).

Em carta oficial enviada aos membros da AMPAS, publicada pelo The Hollywood Reporter em 22 de fevereiro, o presidente David Rubin garantiu que os prêmios vetados da transmissão ao vivo não serão entregues durante o pré-show nem no tapete vermelho. Rubin reiterou que todos os vencedores serão apresentados ao público e que a decisão de realizar tais mudanças foi tomada pelos executivos da instituição e pelo Comitê de Prêmios após sugestões de toda a comunidade, incluindo pessoas que, segundo ele, “amam o Oscar”, e da emissora responsável por transmitir o evento em território americano, a ABC, que detém os direitos até 2028.

 

Visando “proporcionar mais tempo e oportunidade de entretenimento e engajamento do público por meio de comédias, números musicais, pacotes de clipes de filmes e homenagens a filmes”, de acordo com a carta de David Rubin, esta mudança que ocasionou o veto à parte considerável de categorias técnicas durante a cerimônia televisionada ao vivo criou enorme burburinho em toda a comunidade hollywoodiana. E o que pôde ser observado nos dias seguintes ao seu anúncio foi uma revolta de profissionais que, assim como diretores e atores, contribuem para a manutenção do funcionamento das engrenagens da indústria cinematográfica, dentre eles, o engenheiro de som Tom Fleischman. Vencedor do Oscar de melhor mixagem de som por “A Invenção de Hugo Cabret” (Hugo – 2012, EUA / Reino Unido / França), de Martin Scorsese, Fleischman renunciou à Academia em protesto.

 

“Estamos profundamente desapontados com a decisão da Academia de alterar a forma como certas categorias, incluindo edição de filmes, serão apresentadas na transmissão do Oscar. Ele envia uma mensagem de que algumas disciplinas criativas são mais vitais do que outras. Nada poderia estar mais longe da verdade e todos que fazem filmes sabem disso. Como um grupo de artistas totalmente dedicado a promover a arte e o prestígio da edição de filmes, acreditamos apaixonadamente que a edição – e todas as outras disciplinas criativas que fazem parte da arte colaborativa do cinema – devem ser tratadas igualmente. Nossas contribuições para essa colaboração podem às vezes parecer invisíveis, mas são inegáveis. Esperamos que editores de filmes e outros artistas afetados por essa mudança sejam homenageados e celebrados com a paixão, dignidade e inclusão que merecem”, afirmou o Comitê Diretor da American Cinema Editors (ACE) em comunicado oficial.

 

No último sábado, dia 19, o American Cinema Editors voltou a se manifestar contra a decisão da AMPAS por meio de carta oficial, pedindo à AMPAS que reconsidere sua polêmica decisão, endossando críticas de outras instituições e profissionais, como Guillermo del Toro. “Tratar certas categorias de forma diferente de outras atingiu um nervo em nossa comunidade, com a esmagadora maioria de nossos membros se sentindo ignorados, desrespeitados e abandonados pela mesma Academia que tantos de nós apoiamos há décadas”, afirma a ACE, complementando que “existem outras maneiras criativas e divertidas de encurtar um show – nós sabemos, é isso que fazemos! Acreditamos que os verdadeiros fãs do Oscar não querem ver uma noite celebrando a maior honra de nossa indústria reduzida a um espetáculo de variedades”.

 

Vencedor de duas estatuetas do Oscar por “A Forma da Água”, Guillermo del Toro também criticou a Academia (Foto: Divulgação – Crédito: Michael Baker / ©A.M.P.A.S.).

 

Vencedor do Oscar de melhor filme e direção por “A Forma da Água” (The Shape of Water – 2017, EUA / México), Guillermo del Toro aproveitou seu discurso de agradecimento ao Hollywood Critics Association Filmmaking Achievement Award, concedido pela Hollywood Critics Association (HCA) por sua contribuição ao cinema, em 28 de fevereiro, para criticar a decisão da AMPAS. “Muitos (dos filmes) que estão aqui hoje foram feitos com muitas, muitas dificuldades e com muitas pessoas – não os fazemos sozinhos. Nós os fazemos juntos, e as pessoas que os fizeram conosco arriscaram tudo em uma pandemia, aparecendo. Devo dizer, isso – se algum ano foi o ano para pensar sobre isso, este não foi o ano para não ouvir seus nomes ao vivo no Oscar. Este é o ano para dizer isso (seus nomes) e dizer em voz alta. Tenho que defender todos nós, como muitos de vocês que têm voz e podem dizer que não devemos fazer isso (cortar as categorias e seus profissionais do show ao vivo). Não devemos fazer isso aqui, não devemos fazer isso nunca, mas não este ano. Estamos juntos nessa”, afirmou o cineasta, citando a pandemia, que colocou a indústria numa situação complicada.

 

Guillermo del Toro também assinou carta oficial endereçada a David Rubin, em 09 de março, ao lado de nomes como James Cameron, John Williams, Alexandre Desplat, Kathleen Kennedy, Hildur Guðnadóttir, James Newton Howard, Vittorio Storaro e Lili Fini Zanuck, solicitando que a AMPAS recolocasse as oito categorias na transmissão ao vivo. “Por quase um século, o Oscar representou o padrão-ouro em reconhecer e homenagear todos os ofícios essenciais no cinema. Agora, à medida que nos aproximamos do 100º ano do Oscar, estamos profundamente preocupados que esse padrão-ouro esteja sendo manchado pela valorização de algumas disciplinas cinematográficas em detrimento de outras e relegando essas outras ao status de cidadãos de segunda classe. Os ofícios artísticos críticos, como trilha sonora, edição de filmes, design de produção, maquiagem, penteado e som, sempre merecerão o mesmo respeito e reconhecimento de ofícios como atuação, direção e efeitos visuais. Diminuir qualquer uma dessas categorias individuais na busca de classificações e lucros de curto prazo causa danos irreparáveis ​​à posição da Academia como árbitros imparciais e administradores responsáveis ​​dos prêmios mais importantes do nosso setor. Buscar novas audiências tornando a transmissão mais divertida é um objetivo louvável e importante, mas não se pode rebaixar os próprios ofícios que, em suas expressões mais marcantes, tornam a arte do cinema digna de celebração”, diz um trecho da carta.

 

“Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa” integra a Fase 4 do Universo Cinematográfico da Marvel (Foto: Divulgação / Crédito: Sony Pictures).

 

Polêmicas à parte, no ano passado, a pandemia também ocasionou uma revisão temporária nas regras de elegibilidade, permitindo que títulos disputassem o Golden Boy sem necessidade de exibição comercial em Los Angeles por pelo menos sete dias consecutivos e três sessões diárias, colocando produções de estúdios tradicionais e plataformas de streaming no mesmo balaio desde que tivessem sido originalmente agendadas no circuito exibidor. Mas a Ciência possibilitou um vislumbre de normalidade graças à vacinação, imperativa para o controle do avanço da Covid-19. Com isso, parte do público se sentiu mais confortável em voltar aos cinemas, sobretudo para apreciar longas-metragens de grande apelo popular, especialmente blockbusters, como “Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa” (Spider-Man: No Way Home – 2021, EUA), de Jon Watts – indicada ao Oscar de melhores efeitos visuais, a nova aventura do Amigo da Vizinhança impulsionou a criação da já citada votação no Twitter após ter sido esnobada na categoria principal e é, sem dúvida alguma, um dos pilares deste período de recuperação do setor, pois, até a presente data, arrecadou US$ 1,879 bilhão em todo o mundo.

 

Apesar de a pandemia ter agido como facilitadora para a consolidação do streaming enquanto opção de entretenimento seguro num cenário de medo e incerteza, a AMPAS priorizou em sua lista de indicados a melhor filme produções concebidas para a tela grande, inclusive independentes, que ganharam espaço no circuito graças ao efeito dominó de adiamentos que afetou diretamente “gigantes”, conforme citado anteriormente. Isto, infelizmente, ainda é uma realidade na capital do cinema, bem como a transferência de títulos previamente agendados para o circuito comercial diretamente para plataformas digitais, mas não na mesma proporção dos últimos dois anos.

 

A Academia acompanhou de perto o cenário pandêmico e o retorno gradual dos espectadores às salas de exibição nos últimos meses, modificando alguns pontos da “Regra Dois, Elegibilidade”, expandindo o horizonte de qualificação de filmes, longas e curtas-metragens, para além de Los Angeles ao inserir Nova York, Bay Area (condados de São Francisco, Marin, Alameda, San Mateo e Contra Costa), Chicago, Miami e Atlanta. Além disso, a AMPAS agora considera exibições em drive-in’s destas áreas, mas, neste caso específico, exige que o título fique em cartaz por sete dias consecutivos com ao menos uma sessão diária; porém, manteve o afrouxamento da edição anterior para títulos que já haviam sido agendados para exibição comercial e para aqueles comprovadamente inscritos / selecionados em festivais de cinema que foram adiados ou cancelados em decorrência da pandemia, seguindo estritamente as seguintes regras, de acordo com o comunicado oficial da instituição: “1. O filme tem de ser disponibilizado na Academy Screening Room (plataforma de streaming da AMPAS) no prazo de 60 dias após sua exibição ou lançamento em VOD; 2. O filme deve atender a todos os outros requisitos de elegibilidade”.

 

No entanto, a AMPAS segue valorizando a exibição teatral, algo que pode ser observado no terceiro parágrafo da “Regra Dois, Elegibilidade”: “Filmes que, em qualquer versão, recebam sua primeira exibição pública ou distribuição de outra forma que não como um lançamento de filme para cinema não será elegível para o Oscar em nenhuma categoria. A exibição ou distribuição pública não teatral inclui, mas não se limita a: transmissão e televisão a cabo; PPV/VOD; distribuição de DVD; distribuição de companhias aéreas a bordo; e transmissão pela Internet”. Ou seja, não existe uma abertura quaisquer produções originais de plataformas digitais, que precisam, sim, exibir seus títulos comercialmente para que possam concorrer à estatueta mais cobiçada do cinema mundial.

 

Assim como na edição anterior, a AMPAS priorizou em sua lista de finalistas ao Oscar de melhor filme títulos produzidos por estúdios tradicionais para a tela grande da sala de cinema. Dentre os 10 indicados, sete foram concebidos para exibição teatral, mas dois deles tiveram estreias híbridas, isto é, simultaneamente nos cinemas e nas plataformas digitais, “Duna” (Dune – 2021, EUA / Canadá) e “King Richard: Criando Campeãs” (King Richard – 2021, EUA); e apenas três são originais do streaming, “No Ritmo do Coração” (CODA – 2021, EUA / França / Canadá), “Não Olhe Para Cima” (Don’t Look Up – 2021, EUA) e “Ataque dos Cães” (The Power of the Dog – 2021, Reino Unido / Canadá / Austrália / Nova Zelândia / EUA), líder de indicações, com 12 ao total – os outros indicados são “Amor, Sublime Amor”, “Belfast” (Belfast – 2021, Reino Unido), “O Beco do Pesadelo” (Nightmare Alley – 2021, EUA / México / Canadá), “Licorice Pizza” (Licorice Pizza – 2021, EUA / Canadá) e “Drive My Car” (Doraibu mai kâ – 2021, Japão).

 

Almoço dos indicados ao Oscar 2022: Steven Spielberg confraterniza com Marlee Matlin, Troy Kotsur e Daniel Durant (Foto: Divulgação – Crédito: Nick Agro / ©A.M.P.A.S.).

 

Além disso, a instituição, mais uma vez, demonstrou empenho para se livrar de vez das críticas de um passado não tão distante assim, apostando na diversidade dos concorrentes, especialmente de origem latina, como Ariana DeBose, na corrida pela estatueta de melhor atriz coadjuvante por “Amor, Sublime Amor”. Também chamam a atenção o recorde de Denzel Washington, primeiro ator negro a receber sete indicações ao Oscar, e o reconhecimento a Troy Kotsur, primeiro ator deficiente auditivo a disputar o Golden Boy – Marlee Matlin, companheira de cena de Kotsur em “No Ritmo do Coração”, foi a primeira surda a concorrer, e vencer, a estatueta dourada, no caso, de melhor atriz por “Filhos do Silêncio” (Children of a Lesser God – 1986, EUA). Este compromisso foi assumido há seis anos, quando a Academia foi extremamente criticada pela falta de representatividade, diversidade e inclusão no Oscar 2016, chamado de “#OscarSoWhite” (“Oscar tão branco”, numa tradução literal).

 

Com uma disputa guiada pela necessidade de atender às novas demandas da sociedade, e acirrada pela discussão de, novamente, colocar em pé de igualdade títulos produzidos por estúdios tradicionais para a tela grande e outros originais do streaming, o Oscar 2022 pode sacudir a indústria como jamais imaginado pelos executivos de grandes estúdios, que trabalham para manter o modelo tradicional de cinema, calcado na experiência cinematográfica proporcionada pela sala de exibição, em meio à popularização das plataformas, impulsionada pela Covid-19.

 

A 94a cerimônia de entrega do Oscar será realizada no formato presencial, seguindo protocolo de segurança imposto pela Covid-19. Apresentado por Amy Schumer, Regina Hall e Wanda Sykes, o evento será transmitido no Brasil pelo canal por assinatura TNT.

 

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