Cheryl Berno. Foto: Acervo pessoal

Cheryl Berno

Advogada, Consultora, Palestrante e Professora. Especialista em direito empresarial, tributário, compliance e Sistema S. Sócia da Berno Sociedade de Advocacia. Mestre em Direito Econômico e Social pela PUCPR, Pós-Graduada em Direito Tributário e Processual Tributário e em Direito Comunitário e do Mercosul, Professora de Pós-Graduação em Direito e Negócios da FGV e da A Vez do Mestre Cândido Mendes. Conselheira da Associação Comercial do Estado do Rio de Janeiro.

A teoria das janelas quebradas e a casa bagunçada

Foto particular, direitos autorais

Uma amiga maravilhosa, muito culta e sem filhos, veio na minha casa e depois me perguntou se eu conhecia a Teoria das Janelas Quebradas que, em resumo, é que quando uma coisa está quebrada a tendência é que as pessoas não cuidem e assim a desordem só aumente. Isto ocorre porque as pessoas vão pensar: Por que arrumar se já está quebrado? Verdade, estou inteiramente de acordo com a teoria, ela é ótima e funciona mesmo e adorei saber que alguém tinha até feito um estudo e comprovado a tese. Vamos tentar aplicar em tudo, ou quase tudo…

Ontem, por exemplo, a casa estava muito arrumada, tudo muito quieto porque meu filho mais velho estava viajando em um passeio da escola, já achei estranho. De noite o pequeno chegou do colégio e hoje de manhã parecia que tinha passado um furacão no quarto dele, comecei a catar as coisas do chão, mas por incrível que pareça me senti feliz e ainda com saudades do outro, que certamente teria feito ainda mais bagunça (sei que quando crescerem vou sentir falta de tudo!).
Lembrei então de uma frase do grande Cortella, um filósofo da atualidade: “Uma casa arrumada é uma casa triste”. Verdade, naquele momento senti bem isto. A bagunça faz parte do crescimento dos meus filhos e de certa forma faz a nossa casa única e com vida. Cada lápis no chão é um desenho que ele criou e que representa a construção de um ser humano, sensível à arte. Cada livro jogado é sinal que foi tocado e não está empoeirando em uma estante. Cada brinquedo é um sonho que no futuro pode, de alguma forma, se tornar realidade.

Um dia, fui na casa desta amiga, querida e maravilhosa. Era tudo muito perfeito, casa de revista, mas engraçado que já naquela época, que eu nem tinha filhos, senti que faltava alguma coisa, ainda que fosse um cachorro. Talvez eu não conhecesse ainda a teoria do Cortella, mas estava sentindo-a na prática.
Conheci também uma mãe que não deixava a filha brincar com massinha, quadro de giz, canetinha, porque tudo podia sujar a casa, a roupa e a menina, que realmente parecia uma princesa, mas não uma criança. Criança tem que brincar mesmo e eles só terão esta fase para desenvolver estas habilidades físicas e psicológicas, depois será tarde, poderão se transformar em adultos problemáticos e frustrados, como muitos que conhecemos hoje. Brincadeira é coisa séria, é primordial para o desenvolvimento de qualquer ser e todos devem ter esta fase, da qual a gente sempre vai levar boas lembranças (se deixaram a pessoa ser criança).

Tenho uma outra grande amiga, também espetacular, exemplo para mim, como a primeira, que é toda certinha, perfeita e planejada. Eu sou de áries, o meu planejamento está na minha cabeça, eu vejo longe aonde quero chegar, mas gosto de certas surpresas, acredito que muitas vezes vale a pena sair para andar sem rumo certo, viajar ao menos de férias sem ter tudo programadinho, é bom se dar ao prazer de viver também na emoção das coisas de momento. Descobrir por você mesmo outras sensações, gostos e prazeres.

E quando se tem filhos a coisa sai mesmo da teoria para a prática. Quando se tem filho se perde o planejamento até da própria vida, até porque você passa a existir também para os outros e pelos outros! Tudo foge ao seu controle. A casa, por mais que você tente, não ficará mais arrumada. É impossível ter filhos saudáveis, pessoas em desenvolvimento com tudo no lugar certo. Criança é isto: é descoberta, é brincadeira, senão está doente. Já ouvi uma pessoa falar que “criança era boa com um pouquinho de febre”. O que é isto? Mãe que é mãe fica feliz com a saúde do filho e não quer que ele tenha nada, nunca!

Eu falo para esta minha amiga toda organizada, que está grávida, que ela tem que relaxar desde já, porque a vida muda mesmo quando parimos (aliás, desde que pari nunca mais dormi, já dizia a minha mãe). Mas, a parte boa é esta, que dá trabalho, mas você mesmo exausta vai dizer que ama a criatura. Eu amamentava, era maravilhoso, mas parecia uma zumbi, passava a noite amamentando e o dia trabalhando. Você arruma e eles bagunçam, mas aí você arruma e se renova com eles, se atualiza, é bom demais. É vida, como disse o filósofo. Já como diria a psicanalista, paz e tranquilidade todo mundo vai ter mesmo quando estiver sete palmos abaixo da terra. Então vamos viver intensamente, sem nos preocuparmos o tempo todo em ter tudo sob controle. Casa bagunçada é vida, e filho é renovação, é uma nova chance de viver sob outras perspectivas, se deixe levar e aproveite. Sem cobranças e sem culpa, é bem mais gostoso e emocionante. Mas, infelizmente, tudo passa e rápido demais.

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