Por dentro do barracão: Tijuca resgata estilo alegórico de Paulo Barros e terá elemento surpresa entre as fantasias

Detalhes do barracão da Tijuca para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

Ninguém melhor que Paulo Barros para falar de arquitetura e urbanismo. O cara revolucionou a estética alegórica do século XXI. Fez seus desfiles reconquistarem parte do público que se distanciou das escolas de samba. E ergueu pilares para uma Tijuca vitoriosa, que subiu ao pódio com o carnavalesco em 2010, 2012 e 2014. Para 2020, o ‘arquiteto’ reencontra sua maior ‘construção’, em um tema que se relaciona com sua própria história. Tijuca com Paulo Barros sabe que pode pensar grande e conhece bem o caminho que dá ao local ‘onde moram os sonhos’.

Por dentro do barracão, uma estética inconfundível com a assinatura do carnavalesco em cada pedacinho das suas criações. Alegorias indecifráveis na Cidade do Samba, mas que passam a certeza de que ganharão vida na Marquês de Sapucaí. Os espaços para o grande número de componentes que desfilam nos carros permanecem lá, assim como o estilo de alegoria lateral, planejada para que o público das arquibancadas tenha uma visão privilegiada. Nas fantasias, elementos que facilitam a leitura e mais uma aposta ousada de Paulo Barros.

Detalhes do barracão da Tijuca para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

DESIGN PAULO BARROS

O carnavalesco recebeu o SRzd no barracão da Tijuca como se estivesse em casa. Não somente por transformar sua sala na Cidade do Samba em um pedacinho de moradia, já que passa grande tempo do dia lá. Mas também por de fato se sentir em casa na Tijuca. Paulo conhece cada trecho do barracão da azul e amarelo. Afinal, foram oito anos na escola, sendo seis trabalhando na Cidade do Samba. No retorno, em junho de 2019, Paulo reencontrou velhos amigos, funcionários que ainda trabalham na agremiação e os companheiros de projeto de Carnaval: Marcus Paulo e Hélcio Paim, que assinam o desfile de 2020 com ele.

Sem ver dificuldades em trabalhar um tema como arquitetura, Paulo definiu a plástica da Tijuca para o próximo Carnaval como ‘design’. Mais do que nunca, o carnavalesco pretende brincar de construir obras inusitadas na Avenida. “A arquitetura é design puro. O samba fala muito com isso. Ele diz que o concreto se curva, que é uma referência aos trabalhos de Niemeyer. Ele conseguia fazer isso. Eu me apaixonei tanto por essa frase que estou fazendo um carro sobre a Catedral de Brasília.”

O carnavalesco é daqueles que põe o capacete de proteção e mete a mão na massa. Paulo domina todas as fases do processo de suas obras. Não deixa nada sem revisão e corrige aquele mínimo detalhe que pra você pode até passar despercebido. Em ano de dificuldades financeiras, o estilo de trabalho não mudou, mas o planejamento precisou ser equilibrado por conta da escassez de verba.

“Espero que esse quadro melhore. Fizemos um projeto dentro da realidade, para que dois, três dias antes do desfile a escola fique pronta. Se você olhar o barracão hoje, você talvez enxergue cinco ‘carros do DNA’ (Tijuca 2004). O ‘DNA’ foi um carro que as pessoas entravam no barracão e diziam: ‘Isso não vai ficar pronto’, e ele deu na certo na Avenida”, disse Paulo Barros, ao refutar a ideia de que o barracão da Tijuca esteja atrasado.

Detalhes do barracão da Tijuca para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

FIQUE DE OLHO
SURPRESA ENTRE AS FANTASIAS

Em desfile de Paulo Barros, todo mundo espera ver alguma novidade em carro alegórico. Na apresentação da Tijuca, contudo, são as alas que guardam surpresa pra Avenida. Para fugir do óbvio, facilitar a leitura e representar de modo mais fiel o enredo, Paulo, Marcus e Hélcio elaboraram um elemento que virá entre as alas.

“Como transformar uma fantasia em design? Eu teria que fazer roupas de curvas, de retas, de formas arquitetônicas. Isso é muito difícil. A questão do julgamento para leitura penaliza a gente. Eu estou usando artifícios para que as roupas da Tijuca sejam explicadas através de outros elementos que vocês vão ver no dia. Teremos ala e a cereja do bolo, que vocês vão olhar e entender o que estaremos representando”, explicou Paulo Barros.

Detalhes do barracão da Tijuca para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

Driblando o padrão de construção de fantasia e pensando sempre no design, os carnavalescos usaram elementos visuais claros nos figurinos. Há símbolos como retas e setas, e criações históricas como as pirâmides do Egito e o Partenon de Atenas.

“Fantasia de ala de escola de samba é tudo igual. A fantasia que você dá para um componente tem que ter, obrigatoriamente, uma calça, uma blusa, um esplendor, uma cabeça. Só muda o romano pro grego. É tudo igual. É difícil você interferir por conta do corpo humano. Logicamente, você consegue maneiras plásticas de design para você transformar e de repente criar uma roupa diferenciada, mas, de maneira geral, a receita é mesma”, disse Paulo Barros.

Os carros, ao menos no barracão, são sempre um mistério. Não dá para saber o que cada um representará por completo, muito menos as surpresas que trarão. Um deles deixa claro que tratará das causas ambientais e vem sendo decorado com plásticos e resíduos que simulam lixo.

Detalhes do barracão da Tijuca para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

“São cinco conceitos diferenciados, que fogem da arquitetura tradicional do Carnaval. Eu não posso fazer mirabolância se a gente não tem lastro financeiro pra isso. É uma questão de administração. Não adianta eu produzir uma alegoria gigantesca e eu acabar prejudicando as outras quatro. Fizemos um balanço e distribuímos essa verba”, afirmou o carnavalesco.

Símbolo da Tijuca, o pavão ganhará destaque na abertura. Várias esculturas do animal decoram o primeiro carro, onde predominam as cores preto, branco e prata. Geralmente grandioso, o abre-alas não é o maior carro da escola. O acoplamento vem somente na última alegoria, com dois chassis.

“Eu fiz um teste com o carro abre-alas com os componentes. São 140 pessoa nesse carro. E eu digo que o ponto forte dessa alegoria é o canto. Ele pode ser a cereja do bolo. O ‘carro do DNA’ tinha 114 ou 121 componentes e eu lembro que as pessoas falavam da força do canto daquela alegoria. Não é a repetição de uma fórmula. É o uso de um elemento que vai ajudar a gente na tradução de um carro que está lá escondido e eu não vou contar o que é”, brincou Paulo Barros, ao afirmar que vem surpresa no abre-alas.

O DESFILE

“Esse enredo faz uma pequena passagem na antiguidade, porque a arquitetura começa lá. Por exemplo, eu comecei meu trabalho como carnavalesco observando o passado. Você bebe dessa fonte, e no desfile não será diferente. Mas não será o foco do enredo. O foco é a cidade do Rio de Janeiro. A gente canta isso: a beleza que a gente tem nessa cidade, mas também vamos falar um pouco das causas que o homem deixou de lado, tudo que ele esqueceu. Ele sempre se preocupou em criar e não levou em consideração as consequências das suas criações. A gente vai tocar num âmbito geral do planeta. A questão do aquecimento global, do lixo, da reciclagem. Porque hoje um arquiteto, quando faz um projeto, precisa estar voltado para todas as questões. Você tem que analisar todos esses pontos para não ferir a natureza e o meio ambiente. Por isso a cidade do Rio foi eleita a Capital Mundial da Arquitetura, por conta da diversidade de características que a cidade possui. Temos o prazer de ter uma floresta dentro da cidade. Nosso desfile canta esse lugar melhor pra se viver. E obviamente fazemos um link com a favela, porque a favela é essa falta de olhar e preocupação com urbanismo e arquitetura daquele lugar que sofre por conta desse abandono.”

Detalhes do barracão da Tijuca para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

FICHA TÉCNICA

Enredo: Onde moram os sonhos
Carnavalescos: Paulo Barros, Marcus Paulo e Hélcio Paim
Posição: 4ª a desfilar na segunda-feira de Grupo Especial, 24 de fevereiro
Alegorias: 5
Tripés: 1
Alas: Cerca de 30
Componentes: 2800

Detalhes do barracão da Tijuca para o Carnaval 2020. Foto: SRzd

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