São Clemente 2018: Com problemas técnicos e roupas impróprias, escola sofre com calor

Desfile São Clemente 2018. Foto: Leandro Milton/SRzd

Segunda escola a se apresentar no 1º dia de desfiles do Grupo Especial do Rio de Janeiro, a São Clemente apresentou o enredo “Academicamente Popular”, desenvolvido pelo carnavalesco Jorge Silveira, que estreou na agremiação. Nono lugar no desfile em 2017, a preta e amarela homenageou a Escola de Belas Artes, da UFRJ, celeiro de talentos que desde os anos 60 integram as gerações de carnavalescos das Escolas de Samba do Rio de Janeiro. Uma viagem levada pelo início das artes plásticas no Brasil: esse foi o start proposto pelo carnavalesco.

Sediada em Botafogo,a São Clemente enfrentou um dilema com a perda de sua quadra na Avenida Presidente Vargas. A luta judicial percorre anos, desde 2004, quando a agremiação decidiu abandonar sua antiga quadra, no bairro da Zona Sul, e construir seu espaço próximo ao Sambódromo. O terreno é de propriedade da União.

No Grupo Especial desde 2011, a escola nunca se sagrou campeã, tendo como melhor resultado o oitavo lugar no grupo, em 2015. Em 2017, a escola da Zona Sul conquistou o 9º lugar.

Usamos muito material reciclável

Jorge Silveira, carnavalesco da São Clemente, comentou como fez para driblar alguns dos problemas que a agremiação passou no último ano. “Criatividade e planejamento. Nós começamos no dia 3 de março (de 2017) buscando soluções criativas para baratear o Carnaval e deu tudo certo. Usamos muito material reciclável, mas sobretudo, bom gosto”.

Enredo

O estreante Jorge Silveira ousou em sua chegada à São Clemente. Homenageando os bastidores do Carnaval e da formação acadêmica de diversas áreas das artes, o carnavalesco mostrou um lado bastante interessante. Percorrendo desde a Missão Francesa, que trouxe ao Brasil, em 1816, pelo então Imperador de Portugal, D. João VI, artistas franceses para disseminar as artes no Brasil.

Um dos destaques foi a interpretação do choque de realidade dos europeus nas terras do Novo Mundo. Liderada pelo pintor Jean-Baptiste Debret que tem, entre suas obras principais, a representação de D. João VI logo após sua chegada ao Brasil. A pintura original está exposta no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro.

Comissão de frente

Desfile São Clemente 2018. Foto: Leandro Milton/SRzd

Recém-chegado na São Clemente e com experiência internacional, Kiko Guarabyra foi o responsável pela engenhosa comissão de frente. Com a fantasia “O Atelier”, o estreante buscou representar na Avenida o espaço onde as ideias circulam livremente, onde a arte ganha vida através da extensa criatividade de seus criadores. Com um tripé cênico, a comissão de frente mostrou os bailarinos vestidos de pintores. Uma grande tela LED encenava uma ilusão de uma pintura se transformando em uma bailarina de verdade.

Profisisonal tenta resolver problema técnico. Foto: Leandro Milton/SRzd

No entanto, o tripé não cumpriu sua proposta durante todo o desfile. O telão não funcionou, deixando o espetáculo aquém. Abaixo do tripé, as luzes LED também não funcionaram. O problema pôde ser visto em frente ao segundo box de jurados.

Só foi prejudicado por um problema técnico no segundo módulo

Para o comentarista do SRzd Marcio Moura, o único ponto fraco da comissão foi o problema técnico. “Um tripé com bailarinos/pintores com figurinos muito pertinentes à proposta apresentada. A pintura de uma bailarina que ganhava vida em um telão de LED foi o ponto principal da comissão. Kiko Guarabyra, em sua estreia na Avenida, trouxe sua vasta experiência em teatro musical e só foi prejudicado por um problema técnico no segundo módulo.”

Desfile São Clemente 2018. Foto: Leandro Milton/SRzd

Kiko Guarabyra estreou na dança ao lado de Ney Matogrosso, um dos maiores nomes da MBP. Há 10 anos longe do Brasil, o coreógrafo vive nos Estados Unidos, e já ministrou diversos workshops em Milão, na Itália, Estocolmo, Suécia e em Los Angeles, nos EUA. Ele também atuou em diversos musicais na Broadway.

Casal de mestre-sala e porta-bandeira

Desfile São Clemente 2018. Foto: Leandro Milton/SRzd

Estreando na São Clemente, Amanda Poblete assumiu o posto ao lado do já experiente na escola, Fabrício Pires, que desfilou em 2017 com Denadir Garcia. A dupla defendeu o pavilhão desde 2012. Neste ano, Fabrício estreou na Vila Isabel. Com a fantasia “O Encontro”, o casal representou a união de conhecimentos entre os indígenas nativos e os povos oriundos da África, formando uma nova nação.

Em branco e tons pastel/marrom, a fantasia se fez relevante no desfile. A performance e interação entre os dois foi boa, a escola pode garantir boa pontuação no quesito.

Bateria

Desfile São Clemente 2018. Foto: Leandro Milton/SRzd

Sob comando dos mestres Caliquinho e Gilberto, que assumem a função desde 2011, a Fiel Bateria homenageou a obra do brasileiro Manuel de Araújo Porto Alegre e retratou a figura do imperador em seu fardão oficial, mostrando a glória e a riqueza do Império Brasileiro.

Durante todo o desfile, a bateria da São Clemente teve boa performance, contando com afinação, que seguiu os compassos com eficácia.

Segundo Claudio Francioni, comentarista do SRzd, foi uma boa apresentação:

Destaque para a boa afinação das marcações

“A bateria da São Clemente fez uma boa apresentação, com execução precisa das levadas rítmicas e bossas. Destaque para a boa afinação das marcações.”

Desfile São Clemente 2018. Foto: Leandro Milton/SRzd

Filha do presidente da escola, Renatinho, a experiente Raphaela Gomes retratou a “virgem dos lábios de mel” de José de Alencar, eternizada em tela pelo pintor José Maria de Medeiros, em 1881. Simpática e com samba no pé, a rainha fez jus ao posto por mais um ano. Raphaela já foi passista e provou no desfile que sua experiência na ala fez aperfeiçoar muito seu samba no pé.

Samba e carro de som

Desfile São Clemente 2018. Foto: Leandro Milton/SRzd

Leozinho Nunes, que venceu o Prêmio SRzd Carnaval como melhor intérprete em 2016, foi o escalado pelo presidente Renatinho para assumir o comando do carro de som da São Clemente em 2018. Com uma voz característica, o puxador contou com a ajuda de seus assistentes, mostrando muita força e animação ao longo do desfile.

O samba fez jus à proposta

Segundo o comentarista do SRzd Wanderlei Monteiro, o samba fez jus à proposta. “A São Clemente mostra sua Bela Arte. O samba faz uma justa homenagem à Academia das Belas Artes. Refrão do meio muito interessante de melodia, que prepara para uma segunda parte quando a obra cresce em melodia em relação à primeira, mostrando um Leozinho Nunes intérprete cada vez mais ambientado com a Sapucaí, empolgando o ‘clementiano’ no refrão final”.

O Samba, foi uma autoria de Ricardo Góes, Flavinho Segal e cia.

Fantasias, alegorias e adereços

Jorge Silveira mostrou soluções criativas nas fantasias para o desfile da São Clemente. Em grande parte das alas, as fantasias eram grandes, enormes e fechadas. Com o calor na Avenida, alguns componentes passaram por maus momentos durante o desfile.

Integrante passa mal durante desfie da São Clemente. Foto: Daniel Outlander/SRzd

Em contraste com a beleza, um fato: a ousadia de colocar os passistas em vestimentas muito fechadas gerou controvérsias. Se para os passistas estava difícil de desfilar devido ao calor, a beleza do espetáculo fez valer à pena o esforço.

Abre-alas da São Clemente. Foto: Leando Milton/SRzd

Os carros da São Clemente estavam grandes e muito bonitos, cumprindo bem a proposta do enredo. De fácil leitura, foi viável perceber a evolução do enredo na Avenida. O abre-alas, por exemplo, mostrou a arquitetura do Museu Nacional de Belas Artes, no Rio, um dos celeiros em hospedagem das obras produzidas no período imperial.

O segundo carro, “Rio de Debret”, exasperou detalhes sobre a vida e pinturas de Jean-Baptiste Debret, um dos maiores pintores da Missão Francesa no Brasil, reconstruindo um fragmento do Rio de Janeiro naquela época, onde os cortiços no Centro da Cidade eram uma realidade e os principais bairros ficavam situados na Zona Norte, como São Cristóvão e Madureira.

O terceiro setor começou a homenagear, propriamente, a Escola Nacional de Belas Artes, divisão da UFRJ envolvida com cursos de cunho cultural. O terceiro carro mostrou “Os Salões da Academia”, evento anual onde os alunos expunham seus trabalhos acadêmicos para o Imperador, o que lhes rendia prêmios e prestígio na corte.

Desfile São Clemente 2018. Foto: Leandro Milton/SRzd

No final do desfile, Jorge Silveira ousou em colocar trabalhos feitos por atuais alunos da EBA. Uma grande escultura em coral e amarelo, utilizando materiais recicláveis como carretéis de linha e latas de tinta, feita pelos atuais alunos da instituição foi utilizada para finalizar o desfile. Na ala onde estava presente, atuais alunos e profissionais da escola desfilavam em meio à suas realizações, uma ótima homenagem à atual geração de pupilos da escola.

Harmonia e evolução

A São Clemente administrou bem o desfile, sem correrias, e com evolução bem próximas à perfeição. Porém, no final, a escola teve de correr para cumprir o tempo e não perder pontos. Tudo aconteceu porque um integrante do último carro, “Belas Artes, Belos Carnavais”, que representou “as realizações de alunos e professores da Escola de Belas Artes para a festa mais popular do mundo: o carnaval”, passou mal e foi socorrido às pressas.

Desfile São Clemente 2018. Foto: Leandro Milton/Srzd

O carro ficou parado na dispersão, fazendo com que os componentes das alas seguintes tivessem que passar pela lateral esquerda da Avenida, em direção à Praça da Apoteose. O problema não deve ter lhes custado nenhuma perda de pontos, mas gerou certo estresse na finalização do desfile.

Veja também:

– Vídeo: Amanda Poblete fala sobre preparação para estreia na São Clemente

Veja fotos do desfile

Ficha técnica da escola

Fundação: 25/10/1961
Cores: Amarelo e Preto
Presidente: Renato Almeida Gomes
Enredo 2018: “Academicamente Popular”
Intérprete: Leozinho Nunes
Diretor de Carnaval: Roberto Gomes
Carnavalesco: Jorge Silveira
Mestres de Bateria: Gil e Caliquinho
Rainha de Bateria: Raphaela Gomes
Mestre-Sala e Porta-Bandeira: Fabrício e Amanda Poblete
Comissão de Frente: Kiko Guarabyra

Samba-enredo

Compositores: Ricardo Góes, Flavinho Segal, Naldo, Serginho Machado, Fabiano Paiva, Igor Marinho e Gustavo Clarão

– Ouça o samba-enredo

VEM VER! CONVIDEI DEBRET
PRA PINTAR O DESFILE DO MEU CARNAVAL
À ARTE NEOCLÁSSICA IMPERA
NO BRASIL COLONIAL, DOM JOÃO!
EM NOBRES TRAÇOS VÊ INSPIRAÇÃO
E FAZ UM RIO À FRANCESA
ERGUENDO OS PILARES DO SABER
EMOLDURANDO… A EXUBERANTE NATUREZA
ONDE TODA FORMA SE MISTURA
À MAIS PERFEITA ARQUITETURA

É A FORÇA DA MATA! SALVE SÃO SEBASTIÃO!
ONDE O ARTISTA ENCONTRA O POVO, A BELEZA DESSE CHÃO
VIU NO TOM A NEGRITUDE, VIU NO ÍNDIO A ATITUDE
O ESPLENDOR DE UMA NAÇÃO

AO VER A MINHA OBRA NA AVENIDA
RELEMBRO DOS ARTISTAS IMORTAIS
É A BRASILIDADE DANDO VIDA
À ARTE DOS SALÕES AOS CARNAVAIS
HOJE “QUEM CHORAVA VAI SORRIR”
OS MANUAIS VÃO RELUZIR
A “MISSÃO” NO PEITO DE QUEM AMA
EM MANTER ACESA A “CHAMA”
RECRIAR OS 200 ANOS DE HISTÓRIA
NUMA LINDA TRAJETÓRIA
ACADEMICAMENTE POPULAR

A MAIS BELA ARTE O SAMBA ME DEU
FIZ DA SÃO CLEMENTE O RETRATO FIEL
OS TRAÇOS MAIS FINOS, COM AS BENÇÃOS DE DEUS
DESLIZAM NO MEU PAPEL

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