Subúrbio Carioca é o enredo da Recanto do Beija-flor para o Carnaval Virtual

O GRESV Recanto do Beija-flor divulgou a sua sinopse para o Carnaval Virtual 2019. Após o 11º lugar no grupo especial do carnaval passado, a escola buscará o título com o enredo “Tem ovo azul, tem ovo rosa, neste Recanto do subúrbio carioca…” de autoria de André Dubois e diretor cultural Alberto Lemos.

 

FICHA TÉCNICA

Presidente: Marcelo Santos
Vice-presidente: Fabrício Smiderle
Carnavalescos: Leomax Castro e Claudia Cardoso
Intérprete: Victor Nowosh
Enredistas: André Dubois
Diretor Cultural: Alberto Lemos

 

ENREDO

 

Tem ovo azul, tem ovo rosa, neste Recanto do subúrbio carioca…

 

Apresentação:

Subúrbio tradicionalmente é definido como sendo a região periférica da urbe, geralmente formada por zonas residenciais bucólicas e salubres, longe do caos das áreas centrais, mantendo as amenidades da zona rural, adequados às classes mais abastadas. No Rio é diferente.

Foi a construção das estradas de ferro Leopoldina e Pedro II, e as reformas urbanas e sanitárias ocorridas na capital federal nos primeiros anos do século XX que estimularam a alocação de residências da população proletária nos subúrbios cariocas. A região passou então a ser descrita como periférica, na qual os avanços urbanos não estariam totalmente disponíveis, habitadas pelas classes mais pobres, que utilizam o trem como principal meio de transporte para a área central da cidade, da qual são dependentes. Em paralelo, os bairros também periféricos do litoral sul ganharam status de área nobre, servidos pelos bondes. Essa mudança de significado foi fundamental para o surgimento de uma segregação socioespacial na cidade.

É muito clara na formação da identidade carioca a influência que o chamado subúrbio carioca exerce. O acesso a histórias e símbolos locais permitem a criação de uma imagem sobre essa região da cidade por parte dos cariocas, habitantes ou não do subúrbio.

Nosso enredo pretende, sem rigor histórico, expor essa identidade suburbana carioca sob diferentes aspectos, tomando o cenário do botequim pé sujo, símbolo dessa região do Rio, como cápsula do tempo na qual nosso herói se senta e observa o século XX passar, enquanto degusta iguarias próprias desse tipo de estabelecimento, e tece reflexões a respeito do que vivenciou.

 

SINOPSE

Me chamo João do Recanto e, seguindo minha rotina, vim bater ponto no Botequim em frente à estação de trem que fica pertinho da minha casa. Este sem dúvida é meu recanto favorito na cidade e, como venho fazendo todos esses anos, gosto de sentar aqui, pedir uma cerveja e dois ovos, um azul e um rosa. Não que eu dispense as outras delícias, mas é que ovos coloridos são comida boa, que enchem meu paladar com gostosura e meus olhos com alegria, um verdadeiro charme em meio a tantos marrons expostos no balcão.

Olhando daqui a gente vê o Cristo Redentor, símbolo do Rio de Janeiro, de costas. Lembro que vim parar aqui nesse bairro porque aqui o trem chegou, e com ele a possibilidade de viver num lugar melhor. Meus pais compraram um terreno e construíram uma casa muito agradável, que tem um quintal e no topo da fachada estilosa, azulejos com a imagem de São Jorge, meu protetor. O Botequim já existia. Dizem que abriu malandramente logo depois que fizeram a estação.

Aqui tem muita coisa boa. Logo no início, eu lembro que todo ano em outubro a gente ia na Festa da Penha, muito tradicional, mas que, conforme o povo veio se mudando pra cá, passou a ficar grande. O Primeiro Concurso de Músicas Carnavalescas do país ocorreu lá, em 1917. Vi de perto Noel Rosa, Pixinguinha, Donga, Sinhô, Heitor dos Prazeres e Ismael Silva, apresentando músicas que só meses depois, no Carnaval, o resto da cidade tomaria conhecimento.

Foi esse mesmo pessoal que depois inventou as escolas de samba. Essas são bandas de escolas muito importantes como Portela, Império Serrano e Imperatriz Leopoldinense. Só aí são 39 títulos. Mas tem muitas outras escolas de samba aqui. Todas fascinantes, verdadeiros núcleos de resistência popular.

Também tem os blocos de embalo. O Cacique de Ramos e o Bohemios de Irajá são os mais famosos. Os dois são palco de grandes rodas de samba ainda hoje e, até alguns anos atrás, protagonizaram desfiles épicos no Centro da Cidade. O pessoal da curimba se amarra nesses blocos, recinto de caboclos, malandros e exus. Aliás por aqui rola muita macumba o ano inteiro, seja umbanda ou candomblé.

Mas por aqui o carnaval também é muito bom. Tem bloco de piranhas, clóvis, e brincadeiras com música nas ruas. As crianças se divertem. Eu e meus amigos gostávamos de nos fantasiar de bate-bola, bem coloridos.

A gente também podia brincar na rua, jogando bola, tomando banho de chuva, soltando pipa, malhando o Judas no sábado de aleluia…, mas o melhor dia era, claro, o dia de São Cosme e Damião. A gente ganhava muitos saquinhos de doces. Meu preferido sempre foi a maria-mole.

Hoje em dia está difícil manter essa tranquilidade da criançada. Isso é fruto do abandono que a cidade nos legou ao longo dos anos. O subúrbio tão lúdico virou sinônimo de periferia. Quem tinha condições se mudou para bairros com melhor qualidade de vida, porque aqui ficou difícil. Os bairros incharam. A maior parte da antiga zona rural acabou virando periferia urbana também, como quase tudo que não é banhado pelo mar. A cidade do Rio optou por viver com essa segregação.

Favela não é privilégio do subúrbio, mas algumas das mais violentas estão por aqui. É traficante de drogas, milícia e polícia em guerra quase todo dia. Quem sofre somos todos nós, da favela e do asfalto, reféns de uma rotina que nos privou da paz.

A pobreza trouxe falta de esperança. Com ela alguns caminhos de fé mudaram. Alguns pastores apareceram por aqui pelos anos 80, pregando nas praças e abrindo muitas igrejas. Muita gente se converteu e professa hoje o protestantismo neopentecostal. Esse povo gosta de fazer barulho. O problema é que alguns desses evangélicos acabam cometendo atos de preconceito, em especial contra as religiões de matriz afro-brasileira e o próprio samba. Que pena que acabou sendo assim.

A juventude excluída tratou de usar a criatividade para se divertir de outras formas. O baile de charme, um ritmo aqui nascido, virou mania. O maior é ali debaixo do viaduto de Madureira. É charme, é funk e é passinho. Esse passinho é demais! Os garotos são geniais na dança, e alguns viraram verdadeiras celebridades aqui no subúrbio.

Apesar dos problemas e das novidades, algumas tradições permaneceram. Ficou, por exemplo a tradição de enfeitar as ruas com fitas verdes e amarelas e pintar desenhos alusivos à seleção nas calçadas quando tem copa do mundo. É uma época que nós costumamos ter paz e nos reunimos nos jogos para assistir, e comemorar ou lamentar, o desempenho do time do Brasil.

Algumas tradições foram adaptadas aos novos tempos. Tem o trem do samba, por exemplo, que reúne todo 2 de dezembro os bambas de hoje, que cantam com emoção sambas de hoje e de sempre, de estação em estação.

E olha só como fica a Igreja de São Jorge em Quintino no dia do santo! Todo ano eu vou lá com a minha família no dia 23 de abril e participamos de uma feijoada, ao som de muitos fogos ao longo de todo o dia. Todo ano também sai carreata do mercadão de Madureira no dia de Iemanjá, rumo ao mar com a imagem da santa e centenas de carros indo atrás.

Mas não é só no dia de Iemanjá que a gente gosta de ir na praia. A gente gosta disso o ano inteiro. Como nós não temos praia boa por aqui, a gente invade a areia na zona sul e na Barra. É um momento de integração, mesmo os moradores de lá nos chamando de farofeiros. A gente leva comida e bebida mesmo! É pra passar o dia mesmo! Carioca é todo mundo que mora aqui.

Eles sempre reclamam, mas acabaram cedendo. A batata de Marechal é célebre e a cidade inteira quer provar, inclusive quem mora na beira do mar. Eles também criaram versões “nutella” dos nossos botequins. Mas botequim raiz mesmo é igual a esse aqui. Tem imagem de santo e a gente bota cachaça. Tem azulejo, mesa e balcão no estilo. Tem torresmo, cerveja gelada no copo, carne assada e, claro, os ovos coloridos. Ovo azul ou ovo rosa? A cor importa?

 

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

ABREU, M.A. A evolução urbana do Rio de Janeiro. 4 ª ed. Rio de Janeiro: Iplanrio, Zahar, 2006.

FERNANDES, Nelson da Nóbrega. O rapto ideológico da categoria subúrbio: Rio de Janeiro 1858-1945. Rio de Janeiro: Apicuri, 2011.

GUIMARÃES, Roberta Sampaio; DAVIES, Frank Andrew. Alegorias e deslocamentos do “subúrbio carioca” nos estudos das ciências sociais (1970-2010). Sociologia & Antropologia, v. 8, n. 2, p.457-482, ago. 2018. FapUNIFESP. http://dx.doi.org/10.1590/2238-38752017v825.

 

INFORMAÇÕES DA DISPUTA DE SAMBA ENREDO

– Escola encomendará o samba

 

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