Grupo de Acesso 1 do Carnaval Virtual: Noites de fé e ancestralidade
Depois de uma pausa por causa das eleições, o Carnaval Virtual voltou com força nas apresentações das escolas do Grupo de Acesso I. A força da ancestralidade e das diversas raízes e vieses que compõem nossa Nação foram contadas com maestria pelas agremiações virtuais.
A disputa foi acirrada, oferecendo a todos um lindo conjunto estético cheio de cores, técnica apurada, movimentos e efeitos sincronizados com muita alegria e garra. O desfile virtual mostrou que a folia tecnológica veio para ficar e brilhar, envolvendo seriedade e bastante profissionalismo. Confira a seguir como passaram as agremiações nas duas noites de desfiles.
GRESV Mocidade Falangeira da Curimba
A estreante Mocidade Falangeira da Curimba trouxe Exu Caveira para abrir os caminhos da primeira noite de desfiles do Acesso I. O enredo Calunga desenvolveu a temática da morte e suas divindades de forma lúdica. Recheada de fantasias e alegorias criativas, garantiu o encantamento dos espectadores. As alas Egito Antigo, Caronte e Velas das Almas esbanjaram belíssimo conjunto plástico e paleta de cores incríveis. A alegoria Sagração Barroca de João Caveira consagrou o desfile apresentando o Exu protetor que transforma a dor em amor.
ESV Unidos de Franco da Rocha
A escola esquentou a avenida virtual com seu Galo Rei. Buscou em suas próprias raízes as diversas simbologias atribuídas ao galo nas culturas ocidentais e orientais. O luxo, a riqueza de detalhes, os efeitos especiais e as cores exuberantes aliadas ao dourado e prata nas alegorias e fantasias permearam todo o desfile. As alas 7, Com a Benção da Missa do Galo, e 8, Deu Galo no Bicho, destacam a criatividade e o estímulo ao imaginário popular. O conjunto alegórico causou euforia e encantamento no público, com destaque para a alegoria 2, O Ano Novo do Galo, que contou com plasticidade e iluminação impecáveis.
ESV Astro Rei da Folia
A Astro Rei disputou com força o título de campeã com o enredo Dos povos pagãos ao esplendor virtual. Carnaval, Arte Real, trazendo a história da origem do Carnaval em ancestralidades pagãs. O tema chega até a passarela com um excelente gingado já destacado pelo samba enredo. O Momo Astro Rei da folia abre o espetáculo com muito movimento e majestade. As representações da antiguidade festiva reuniram uma linda integralização de cores trazendo muita luz para olhos brincantes. Com muita imponência, a agremiação soube contar a história que percorre o Carnaval desde suas origens pagãs e mostrou toda sua garra na avenida virtual.
GRESV Recanto do Beija-Flor
A Recanto do Beija-flor apresentou o enredo Admirável privilégio contra a distopia. Abriu o desfile com categoria e muito brilho na comissão de frente, intitulada Céu da nova era. Explorou o paraíso utópico, com a pureza natural da fauna e flora. A Recanto trouxe em seu carro abre alas o beija-flor que é símbolo da agremiação. A bateria estava fortemente representada com uma belíssima fantasia de Thomas More. A escola abusou dos efeitos de brilhos em todo o desfile, sobretudo, nos pontos estratégicos e de destaque. Mereceu atenção o efeito da ala Fahrenheit 457 com livros que abriam e fechavam, dando uma poética para pensar a distopia na pós-modernidade. O conjunto visual construído foi de muita ousadia e, principalmente, de muita qualidade.
GRESV Acadêmicos da Tamarineira
Com leveza em suas cores e muita harmonia em suas alas, a Tamarineira fez forte presença na avenida virtual, com uma riqueza de elementos na construção de seu enredo. A escola fez jus ao vale de riquezas de seu enredo, trazendo uma apresentação com unicidade, requinte e integração. Vale destaque para a sua Alegoria 2, que representa o Quilombo de São José da Serra, com a valorização dos detalhes em suas formas e cores, simbolizando o que foi a vida escrava dentro desse quilombo. Nesse sentido, a Acadêmicos da Tamarineira fez bonito na avenida, com excelência em qualidade, dando destaque para a beleza visual em todo o seu conjunto.
GRESV Nação Imperial
A Nação Imperial veio explorando o universo do terror a partir da Nação Zumbi. Esses caminhos do medo causam tremores por quem o imagina e/ou o assiste. Assim, a escola abusou das figuras cinematográficas, como, por exemplo, Annabelle, Jason, Chucky, Frankenstein, Drácula, It, Zé do Caixão, Pânico, dentre tantas outras figuras que causam medo. O enredo da escola foi muito ousado: de forma fantasmagórica, a escola introduziu a temática mostrando o medo que assola o cinema, com suas figuras malignas, aladas e assustadoras, do nosso imaginário; assim como, o universo do medo presente, também, em algumas figuras do folclore brasileiro. A escola convidou o espectador a viajar por sonhos e magias, com base nos medos vivenciados na ficção e realidade.
GRESV Primeira Estação do Samba
A Pomba-Gira atravessou a avenida no carnaval da Primeira Estação do Samba. A moça é sensual, guerreira, faceira, enfim, tudo que ela quiser ser. Nas cores verde e rosa a escola trouxe muito gingado para o público no empoderamento da encruzilhada. Na força da fé, o primeiro casal de Mestre Sala e Porta Bandeira apresentou um figurino opulento, e a bateria chamou as Pombas-Gira para dançar em belos traços estéticos. Com forte composição visual a agremiação reverberou a força da mulher dentro da representatividade mensageira do mundo dos orixás com muito Axé.
GRESV Império da Praça XI
Com estética e equipe renovadas, a Império da Praça XI pretende continuar com o sucesso de seu último desfile e retornar ao Grupo Especial. A escola apresentou o enredo O resgate da Luz, contando a história de um guerreiro que se tornou herói da civilização andina trazendo fartura e abundância ao povo peruano. A ancestralidade reforçou a necessidade da busca de raízes que possam responder nossa atualidade vivida, o tema foi desenvolvido com uma esplêndida mistura de linhas, formas e texturas muito bem tonalizadas mostrando que a agremiação veio afiada para a vitória.
GRESV Serpente de Ouro
O Grêmio Recreativo Escola de Samba Virtual Serpente de Ouro chegou ao Grupo de Acesso I com o enredo O Puro Voodoo: De Benin a Nova Orleans, No Haiti, à revolução negra. A temática reforçou a resistência do povo negro através do culto ao vodu como expressão da ancestralidade. A ideia principal é a busca da paz, da liberdade e do respeito religioso de cada povo. Heranças ancestrais trazem alas com forte expressão visual e com alegorias bem estruturadas para contar a história do Haiti e do povo preto, uma concorrente poderosa já na força de seu Abre-Alas.
GRESV Encantados da Serra
A agremiação serrana levou para a avenida virtual, uma grande homenagem aos 100 anos da nossa eterna Dama do Samba: Dona Ivone Lara. O conjunto de fantasias valorizou a volumetria e permitiu equilíbrio das cores ao longo do desfile. A Encantos da Serra representou a história de Dona Ivone Lara de forma lúdica e ao mesmo tempo detalhada. O ponto alto do desfile, foi a segunda alegoria Sonhos Dourados, o encontro de Dona Ivone Lara com Villa Lobos, rompendo com preconceitos e estigmas, elevando a posição do samba.
ACCESV Belas Artes
Com seu enredo Histórias negras separadas pelo Atlântico Sul, a escola de Curitiba apresentou as memórias africanas sintetizadas em suas fantasias e alegorias. Um conjunto muito bem elaborado, enriquecido pelas formas e cores escolhidas. O enredo mostrou que a mesma diáspora que destrói, também reconstrói – os traços culturais africanos, geraram frutos de resistência e luta. Dom Obá, Zumbi, Agotime. Dos quilombos a uma flor. O destaque do desfile, mais que justo, será para a Velha Guarda, com a fantasia: Rei e Rainha do Maracatu. O cortejo mostra como as “novas terras a povoar” com povo de tudo lugar, reconstrói uma história.
GRESV Império da Fênix
Na abertura da segunda noite de desfiles, a avenida virtual recebeu a Império da Fênix, com o seu enredo Ahosi, apresentando o tempo de Dahomé, seus senhores e senhoras do reino, guerreiros e guerreiras, voduns, ifás e todas as suas peculiaridades. As fantasias valorizaram o panejamento e a caracterização de cada uma das alas. A escola demonstrou com categoria e elegância as minúcias desse povo e sua tradição. Excelente trabalho de pesquisa, que permitiu uma refinada construção de ideias dentro do contexto apresentado pelo carnavalesco. A Império da Fênix apresentou a ancestralidade com uma linguagem contemporânea e com qualidade.
GRESV Império de Niterói
A Império de Niterói começou o desfile com excelência! A comissão de frente, denominada Os temiminós, trazia indígenas que dançavam e saíam de dentro de cerâmicas giratórias. Depois, transformavam-se em corujas, simbolismo forte dentro do universo indígena. Merece destaque o carro abre-alas, que apresenta o Rio de Janeiro, e suas belezas naturais encontradas na chegada dos portugueses. O trabalho desse carro e seus efeitos são de grande relevância, que fecha com imagem de Santa Bárbara. A escola representou, ainda, a evolução belíssima da cidade de Niterói desde o topônimo Carahy.
GRESV União da Gávea
A GRESV União da Gávea passou na avenida virtual com o povo do afoxé. O cortejo formado por estivadores no cais do porto de Salvador fincado nas raízes do candomblé, Filhos de Ghandi, foi o homenageado da noite. O requinte dos efeitos especiais da comissão de frente anunciava o desfile técnica e artisticamente impecável, que através das suas fantasias e alegorias, narraram todo esse processo de construção e permanência de uma das maiores manifestações populares religiosas do carnaval. As alas de número 11 – Lanças e Estandartes, a 12 – O Legado de Ghandi no Afoxé de Salvador e as baianas vestidas de Alfazema – Cortejo para abrir caminhos – Banho de Alfazema encantaram o público. As alegorias destacaram os Orixás e garantiram axé no encerramento apoteótico com o último carro Cortejo de Oxalá.
GRESV Acadêmicos da Asa Branca
Crash! A escola “quebrou” a avenida com a história das revoluções e movimentos que derrubaram sistemas dominantes na humanidade. De eventos da Antiguidade à contemporaneidade, passando com muita propriedade pelo universo dos movimentos artísticos e a revolução carnavalesca realizada por Pamplona, Arlindo, Joãosinho e Fernando Pinto, a agremiação brilhou. As belíssimas e criativas fantasias eram compostas de signos claros que comunicavam com muita facilidade com o espectador. Destaque para as alas 6 (Novos Ares nas terras dos Samurais-Restauração Meiji), 17 (American Way of Life- Pop Art início 1950) e o primeiro casal de mestre sala e porta bandeira (Legado de Luta de Palmares – Zumbi e Dandara). O conjunto alegórico era opulento com destaque para o último carro (Nós não vamos sucumbir) que coroou o desfile empolgante.
SCESV Folguedo Caipira
A SCESV Folguedo Caipira pisou firme com o enredo O Som da Libertação, mostrando que veio para competir com vigor e raça. O tema reforçou a consolidação da umbanda em solo tupinambá através de ritmos musicais. A escola explorou a visão de uma linha tênue que divide as religiões e principiou o respeito entre as crenças, na certeza de um Brasil plural e miscigenado. Uma linda Comissão de Frente representou o ritual vindo de Angola, feições da beleza no figurino, na coreografia e no belo efeito visual de seu conjunto. As alas apresentaram uma excelente comunicação com a proposta da agremiação em uma solução conceitual bem trabalhada.
BVC Colorados do Samba
Última escola a se apresentar, a Colorados do Samba mostrou que samba no pé com gingado baiano. Com o enredo Nego Fugido, trouxe a memória dos ancestrais africanos em lendas que preservam a cultura e a resistência do povo negro na construção de um Brasil brasileiro miscigenado e forte. A Comissão de Frente veio com uma bela performance, Mestre Sala e Porta Bandeira resgataram com maestria as raízes afro-brasileiras. Em cores terrosas a escola fincou a energia temática em belas paletas, com alas bem compostas em perfeita harmonia estética.
Texto elaborado coletivamente pelos pesquisadores do Núcleo de Estudos de Carnavais e Festas – NesCaFe (@necf.ufrj):
Carlos Carvalho – Doutor em Artes Visuais (PPGAV/EBA/UFRJ). Professor associado da Pós-graduação em Gestão e Design em Carnaval – CENSUPEG. Pesquisador e vice-líder do NEsCaFe/CNPq.
Du Carmo Vido – Doutoranda em Artes Visuais (PPGAV/EBA/UFRJ). Professora de Artes do Município do Rio de Janeiro. Professora convidada da Pós-graduação em Figurino e Carnaval – UVA. Pesquisadora do NEsCaFe/CNPq.
Leo Jesus – Doutorando em Artes Visuais (PPGAV/EBA/UFRJ). Professor da Escola de Belas Artes – UFRJ. Professor convidado da Pós-graduação em Figurino e Carnaval – UVA. Carnavalesco do GRES. Caprichosos de Pilares. Pesquisador do NEsCaFe/CNPq.
Sílvia Maria Monteiro Trotta – Especialista em Figurino e Carnaval (UVA). Historiadora (UFRJ). Pesquisadora da LUPA Carnaval – UFRJ.
Verônica Valle – Mestranda em Artes Visuais (PPGAV/EBA/UFRJ). Designer, atua com concepção visual e artística em cenografia e desenvolve projetos conceituais e artísticos para escolas de samba do Rio de Janeiro. Pesquisadora do NEsCaFe/CNPq.
Wádson Pereira Rocha – Doutorando em Artes Visuais (PPGAV/EBA/UFRJ). Artista visual. Pesquisador do NEsCaFe/CNPq e NUPPE/CNPq.
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