Conheça o enredo do Império da Praça XI para sua estreia no Grupo Especial

O Império da Praça XI divulgou nessa sexta (29) a sinopse do enredo “Um Espírito Negro e Santo”, que conta um pouco da influência dos africanos na história e cultura capixaba, e será desenvolvido por Vanderson Cesar no primeiro desfile da escola no Grupo Especial do Carnaval Virtual.

 

FICHA TÉCNICA

Presidente: Sérgio Ayres
Vice-presidente: Karolini Costa
Carnavalesco:
 Vanderson Cesar
Intérprete: Márcio Moreno
Diretor de Carnaval: Thales Nunes
Diretor Musical: Diego Soares

 

ENREDO:

Um Espírito Negro e Santo

 

Introdução

Me chamo Espírito Santo, mas também sou conhecido pela alcunha de terceira pessoa da Santíssima Trindade cristã – porém, sem formalidades, por favor. Hoje não estou aqui pra falar de mim, mas, sim, para contar uma história. Para contar como deixei de ser uma pomba no altar pra me tornar terra, cercado pelo mar e envolto pelas montanhas. Mais que isso, quero contar como irmãos foram escravizados pela cor de sua pele e trazidos pra cá no torso líquido de sua mãe, a qual chorou e suas lágrimas banharam meu litoral. Ali, entendi que eu deveria fazer alguma coisa. Porém a maldade dos meus era maior e em meu nome escravizaram os de pele negra como a noite. Noite esta que todos os dias ao badalar dos sinos recaía sobre o meu corpo e me fazia pensar o que estava a acontecer diante dos meus olhos. Então decidi miscigenar-me, decidi que estes a partir de então fariam parte de mim. Por isso, hoje em dia atabaques sobem as ladeiras sagradas da padroeira, para lembrar que este espírito além de Santo, também é Negro. Vamos voltar no tempo e lhes direi como isso aconteceu…

 

Sinopse

Ah… Há muito, nos idos de 1500 – pra ser mais exato em 1532 – naveguei na “Glória” ¹ e fui conduzido a terras até então desconhecidas. Era o novo mundo. Aporto no dia 23 de maio. Para os cristãos, era dia de pentecostes, meu dia – não havia me apresentado, perdão! Eu sou a terceira pessoa da santíssima Trindade, o Espírito Santo. Continuemos: assim então é batizada esta terra, capitania do Espírito Santo.

Me faço território, me personifico belezas naturais, do mar à montanha. Algum tempo depois vejo uma linda mulher a chorar na beira da praia, um choro de dor, e percebo que ela embala os seus em suas ondas e os conduz em segurança. Porém tenho vergonha, são os meus que escravizaram irmãos de pele preta, e que chegam a todo momento acorrentados. Descobri depois que essa mulher é mãe, é Rainha – A Rainha do mar, a mãe cujos filhos são peixes, Yemanjá. Escravizados e retirados de sua terra, são obrigados a trabalhar nos cafezais, canaviais e nas ruas, constroem um país com a força do seu sangue e suor. Mas não é uma história só de dor, é de luta e busca pela liberdade, também.

Lá pelas bandas de São José do Queimado² houve o maior levante de que se tem notícia por essas terras. Uma igreja foi erguida pelo sonho da liberdade – sonho este não concretizado ao final da construção. Logo o levante começou. Durou cinco dias e terminou com a prisão de seus líderes: Eliziario, Chico e João da viúva. Conhecida como “A insurreição de Queimados”, a revolta foi marcada por extrema brutalidade. Os sobreviventes conseguiram fugir e fundar um quilombo em Cariacica³. Dos líderes, dois foram enforcados. Eliziario, o único sobrevivente, conseguiu fugir, num milagre creditado a Nossa Senhora da Penha- uma mãe que não desampara seus filhos, salvo sincretismo.

E por falar em quilombo, mais ao norte temos ainda mais histórias para contar! Recebi realeza aqui também, mas não da forma que eu queria. Zacimba Gaba⁴ aportou acorrentada e assim que descobriram sua realeza, foi submetida a uma série de castigos, além de ter sido levada para trabalhar na casa grande longe dos seus. Porém, não se curvou: planejou sua vingança, libertou-se e fundou seu quilombo – o maior que se teve notícia por aqui – na região de Itaúnas, ao norte. Ainda organizou ataques aos navios negreiros em alto mar, libertando os escravizados antes que aportassem.

A fé foi um importante refúgio, encontrando no sincretismo uma forma de sobrevivência de sua crença. As festas e procissões, promovidas pelas irmandades de São Benedito e de Nossa Senhora do Rosário dos homens pretos, serviam como alento à escravidão. Certa vez, por conta da chuva, o Frei proibiu a saída do andor com a imagem de São Benedito e então – quem diria que uma imagem ia causar uma divisão na pequena província! – a guerra estava declarada! De um lado a elite, os Caramurus; do outros, os pobres e negros, os peroás. E por falar no Santo negro, aqui em minhas terras tem um batuque muito do bom para louvá-lo todos os anos. Eles chamam de congo ! Conta a lenda que um navio vindo da África cheio de negros escravizados estava por afundar, os negros salvaram-se do afogamento agarrados ao mastro e clamando a São Benedito. Assim, até nos dias de hoje, tem a puxada e a fincada do mastro para lembrar do ocorrido. E o navio também vai seguindo a procissão, regada a muito batuque, tambores e casacas. Estandartes enfeitados, saias rendadas, muitas cores e alegria completam a festa!

“Iaiá você vai à Penha? Me leva oh, me leva…”

E não pense que só Benedito é louvado, não! A padroeira também é festejada. No dia de Nossa Senhora da Penha, pela manhã, as bandas sobem as ladeiras do convento – famoso cartão postal – entoando louvores à Santa, que roga pelos capixabas lá do alto do penhasco. Lá em Cariacica, pelas bandas de Roda d’água, tem até um Carnaval de congo para louvar a santa, seu moço! Como é distante do santuário da Santa, os moradores do local fazem festa ali mesmo para ela. Contam que antigamente os negros fugidos vestiam máscaras de papel machê e cobriam o corpo com folhas de bananeira, para louvar a Santa sem serem reconhecidos. Assim foi que os mascarados do congo de Roda D’água ficaram conhecidos como João bananeira!

“Nossa Senhora, quando ouviu Tambor de congo, Desceu a Penha, caiu na farra…”

O mar, ah o mar… Me sinto abraçado cada vez que as vagas se arrebentam em meu litoral, como um carinho de Mãe. Mãe Yemanjá, já falei dela e torno a falar, essa força feminina que não sucumbiu às dores da escravidão, e esteve amparando seu filhos sempre. O barulho das ondas, ora calmas ora turbulentas, inspirou sempre seus filhos a lutar. Filhos estes que não esqueceram esse amor de mãe e passam de geração a geração o amor, o respeito e levam oferendas na beira do mar todo dia 2 de fevereiro. Como ficam lindas as areias da Praia de Camburi6 , na capital, cheia do povo Santo vestidos de branco e munidos de flores! E Ela? Está lá, eternizada em uma linda imagem à beira-mar, olhando por seus filhos e sempre me lembrando que meu Espírito, além de Santo, é Negro!

Autor: Vanderson Cesar
Colaboração: Any Cometti e Marcos Felipe Reis

 

Glossário:

¹ Nome da embarcação a bordo da qual os primeiros portugueses desembarcaram no território capixaba.

² Distrito do município da Serra, localizado na região metropolitana da Grande Vitória, onde ocorreu a Insurreição de Queimados.

³ Município da região metropolitana da Grande Vitória, que tem divisa com o município da Serra.

⁴ Princesa da nação Cabinda, do território hoje chamado de Angola.

⁵ Instrumento de percussão característico das bandas de congo do Espírito Santo

6 Maior praia da capital Vitória, onde se localiza uma estátua de iemanjá

 

INFORMAÇÕES DA DISPUTA DE SAMBA

– Escola encomendará o samba

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