Torcedor conta como foi agredido e preso após criticar Bolsonaro na Arena Corinthians

Rogério Lemes mostra o punho e os dedos machucados durante a abordagem policial. Foto: Reprodução/Facebook

Rogério Lemes mostra o punho e os dedos machucados durante a abordagem policial. Foto: Reprodução/Facebook

Em publicação no Facebook na madrugada desta segunda-feira (5), o vendedor Rogério Lemes Coelho relatou ter sido preso neste domingo (4) ao gritar palavras contra o presidente Jair Bolsonaro no clássico entre Corinthians e Palmeiras, realizado na Arena Corinthians, em São Paulo. Em sua postagem, ele revelou fotos dos pulsos com escoriações por causa do uso de algemas.

No boletim de ocorrência, os policiais Jaciel Ferreira e Paulo Alexandre Pires de Souza “informaram que estavam em patrulha quando visualizaram Rogério gritando palavras de ordem contra o atual presidente, Jair Messias Bolsonaro” e que o abordaram e o levaram à delegacia para evitar “um princípio de tumulto”.

Após a abordagem, Rogério foi levado para o espaço do estádio onde funciona o plantão da Drade, um braço do Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), da Polícia Civil paulista. A delegada Monia Olga Pescarmona assinou o documento, sem registrar oficialmente a versão de Rogério sobre o fato.

Em entrevista divulgada pela equipe de comunicação do Coletivo Democracia Corinthiana, Rogério revela detalhes das agressões que sofreu e dos momentos em que esteve detido. Confira:

Quem é o Rogério Lemes?

Sou trabalhador e sou corinthiano de coração. Vendo portas e janelas no bairro do Brás, na Zona Leste.

O que ocorreu neste domingo, 4 de Agosto, na Arena Corinthians?

Entrei no estádio e logo depois gritei algumas palavras contra Bolsonaro, um cidadão que ofende a nossa democracia. Quase imediatamente, fui surpreendido por trás, com um mata-leão, dado por um policial militar.

Você reagiu?

Não, foi tão forte que me faltou ar e eu desfaleci, caindo no chão. Veio outro policial e me algemou, machucando meus pulsos. No total, creio que quatro participaram da repressão.

Você tentou fugir ou fez algo que justifique a violência?

Não, nada fiz. Tenho uma prótese de fêmur na perna esquerda e minha locomoção é muito limitada. Nem que eu quisesse poderia oferecer resistência.

O que mais fizeram?

Um policial, na maldade, torceu meu dedo médio da mão esquerda. Está doendo muito até agora.

E para onde o levaram?

Para uma sala sem água, quase sem nada e me jogaram no chão. Eu não podia me levantar por causa da limitação física. Com fortes dores, pedi ajuda, mas responderam com mais ofensas.

O que diziam?

Durante 40 minutos, fiquei lá. Entravam policiais e gritavam coisas do tipo: “e aí, você não é valentão, quem mandou xingar o nosso presidente?” Foram vários que entraram e gritaram frases para me intimidar.

E o que sentiu?

Senti que eles eram movidos por muito ódio, agressividade e maldade. Enfim, quem apoia esse cara, acaba reproduzindo o jeito dele.

E ficou lá por quanto tempo?

Acho que foi até o intervalo, porque naquela hora chegou um suposto investigador e falou para outro cara: “acabou o primeiro tempo e estamos perdendo”. Fui levado até a sala da delegacia do estádio e me colocaram diante de uma delegada. Perguntei que crime eu tinha cometido. Ela disse que nenhum crime, mas que aquele era o procedimento padrão adotado contra quem se manifestasse.

E nesse tempo todo, o que mais ocorreu?

Tomaram o meu relógio e também o meu celular, que só devolveram depois.

E quando te liberaram?

Só me liberaram faltando dez minutos para o fim do jogo. Vi cinco minutos da partida, mas já sem cabeça para isso. É um terror psicológico muito grande, muita maldade. Eu pedia ajuda por causa da perna e eles diziam: “foda-se”.

Você pensar em pedir uma reparação na Justiça?

Quase não dormi na noite de domingo para segunda. Muito terror psicológico, muita indignação. Estou com medo e temo represálias. Porque isso tudo é a falência do Estado. Acho que não tenho como recorrer, porque sou um simples cidadão, e eles têm todo o poder.

Outras agressões 

O Coletivo já registrou vários casos de agressões e prisões políticas em Itaquera, inclusive de estrangeiros durante a Copa América. “Em tempo recente, outras duas mulheres torcedoras passaram pelas mesmas humilhações, uma delas deficiente física”, diz nota publicada pelo grupo no Facebook. O texto relembra agressão sofrida por Maria Luiza Maia, portadora de lupus, que assistiria um jogo em jogo no dia 21 de setembro de 2018 disputado entre Corinthians e Sport, de Pernambuco, seu clube do coração, mas foi agredida por uma PM na revista na entrada da arena corintiana.

Em nota, o Corinthians repudia ação da PM

Leia na íntegra:

“A Arena e o Sport Club Corinthians Paulista vêm a público repudiar o episódio que resultou na prisão do torcedor Rogério Lemes Coelho durante o jogo ocorrido no último domingo (04) contra o Palmeiras na Arena Corinthians, após sua manifestação contra o Presidente da República. O clube historicamente reitera seu compromisso com a democracia e a defesa do direito constitucional de livre manifestação, desde que observados os princípios da civilidade e da não violência. A agremiação lembra que diferentes autoridades, entre elas o presidente do clube, já foram alvo de manifestações da torcida durante os mais variados eventos esportivos realizados no local e o episódio caracteriza-se como um grave atentado às liberdades individuais no Estado Democrático de Direito.
em caso de torcedor detido por protestar contra Bolsonaro.”

 

Comentários

 




    gl