Sergio Moro pede demissão do Ministério da Justiça e acusa interferência política de Bolsonaro

Sergio Moro. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Sergio Moro. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ex-juiz federal Sergio Moro decidiu deixar o cargo de ministro da Justiça nesta sexta-feira (24). Ele deixa o cargo após a exoneração do diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, publicada no Diário Oficial. O decreto assinado por Bolsonaro – e pelo ministro da Justiça, Sergio Moro –  diz que o afastamento foi a pedido de Valeixo, informação contestada por assessores do diretor.

O clima já havia esquentado na quinta-feira (23), quando Moro avisou ao presidente Jair Bolsonaro que sairia do governo, caso Valeixo fosse retirado do cargo.

Veja alguns trechos da entrevista coletiva de Moro:

“Queria lamentar esse evento na data de hoje. Estamos passando pela pandemia da covid-19. Mas foi inevitável, então, peço a compreensão de todos, mas não foi por minha opção”.

“Antes de assumir o cargo de ministro, fui juiz federal por 22 anos. Tive diversos casos criminais relevantes e, desde 2014, tivemos a Operação Lava Jato, que mudou patamar de combate à corrupção no país”.

“Na Lava Jato, sempre tivemos preocupação constante de interferência do executivo. Foi garantida autonomia da PF durante esses trabalhos da investigação. Certo que governo da época tinha inúmeros defeitos, com crimes gigantescos de corrupção, mas foi fundamental a autonomia da PF. Isso permitiu que os resultados fossem alcançados”.

“Recebi convite do então eleito presidente da República, Jair Bolsonaro. Fui convidado a ser ministro da Justiça e Segurança Pública. Teríamos compromisso de combate à corrupção, ao crime organizado. Foi me dado carta branca de nomear todos os assessores, inclusive na Polícia Federal. Na ocasião, foi divulgado equivocadamente, que eu teria estabelecido condição eu ter nomeação de ministro do STF. Não é da minha natureza. Realmente assumi o cargo, fui criticado e entendo essas críticas. Única condição que coloquei, não ia relevar, mas agora não faz mais sentido, eu disse que como estava abandonando 22 anos da magistratura, contribui com a previdência e perdia saindo da magistratura, que se algo me acontecesse, pedi que minha família não ficasse desamparada com uma pensão. Foi a única condição. Permito aqui dizer com esse compromisso. Falou até publicamente que me daria carta branca e aceitei com o intento de fazer com que as coisas evoluíssem. E minha aceitação foi muito bem acolhida pela sociedade”.

“Dentro do ministério, a palavra mote tem sido ‘integração’. Atuamos muito próximos das forças de segurança estaduais, até mesmo municipais, trabalhamos duro no combate à criminalidade organizada”.

“Enquanto o Coaf estava no Ministério da Justiça, nós o fortalecemos, depois passou para outros órgãos.”

O presidente me disse que queria uma pessoa do contato pessoal dele, que ele pudesse colher informações, que ele pudesse colher relatórios de inteligência, e realmente não é papel da PF prestar esse tipo de informações.

“Durante todo o período, tive apoio do presidente em vários projetos. Em outro nem tanto. Mas, a partir do segundo semestre do ano passado, houve insistência na troca de comando da PF. A única pessoa que indiquei na PF foi o diretor Valeixo. Não é meu papel fazer indicações de superintendentes. Tenho dado autonomia para a equipe fazer as melhores escolhas. As escolhas técnicas. O presidente, no entanto, passou a insistir na troca do diretor geral. O que eu disse ao presidente: ‘não tenho nenhum problema de trocas, mas preciso de uma causa’. Uma causa relacionada à insuficiência de desempenho, um erro grave. no entanto, o que eu vi que era um trabalho bem feito. operações ao crime organizado, ao combate à corrupção. Tem outros bons nomes para assumir o cargo de diretor da PF. outros delegados igualmente competentes. Estaria claro que haveria interferência politica na PF, o que gera abalo na credibilidade. Minha e do governo. e Teria impacto também na efetividade da PF. Ia gerar uma desorganização. Não aconteceu durante a Lava-Jato, a despeito dos casos de corrupção nos governos anteriores. O problema é que nas conversas com o presidente, é que não é só troca de diretor geral, trocaria superintendentes sem que fosse me apresentado uma razão, uma causa para realizar esses tipos de substituições que fossem aceitáveis. Dialoguei muito tempo com o presidente. Busquei postergar com essa decisão. Ontem, falei com o presidente que seria uma interferência política e ele disso que seria mesmo. Falei que teria impacto para todos, que seria negativo. Mas para evitar uma crise, durante pandemia,  eu sinalizei pra substituir o Valeixo com perfil absolutamente técnico e que fosse uma sugestão minha, na verdade nem minha, mas da PF. Sinalizei com o nome do Disney Rosseti. É uma pessoa de carreira, de confiança. Como disse que não são questões pessoais, mas decididas tecnicamente. Fiz a sugestão, mas não obtive respostas. Não sei qual vai ser a escolha. Foi ventilado nome de um delegado que passou mais tempo no Congresso do que na ativa. Foi indicado, sugerido, o atual diretor da Abin. Mas o grande problema é que não são tantos quem colocar, mas por que trocar e permitir interferência política na PF. O presidente me disse que queria uma pessoa do contato pessoal dele, que ele pudesse colher informações, que ele pudesse colher relatórios de inteligência, e realmente não é papel da PF prestar esse tipo de informações. Imagina se durante a Lava Jato se a então presidente Dilma ficasse ligando ao superintendente eM Curitiba para colher informações sobre as investigações em andamento. Autonomia da PF, na aplicação da lei, seja a quem for, é um valor fundamental a preservar no estado de direito. O presidente me disse expressamente”.

“Presidente também me informou que tinha preocupação em inquérito em curso no STF que a troca seria oportuna da Pf por esse motivo. Também não é razão que justifique substituição. É algo que gera uma grande preocupação. Sinto que tenho dever de tentar proteger a PF. Por todos esses motivos, tentei evitar uma crise durante a pandemia, mas entendi que não podia deixar de lado essa autonomia do estado de direito”

“Não assinei o decreto. Em nenhum momento o diretor-geral da PF aceitou essa exoneração.”

“Não há nenhum pedido que foi feito de maneira formal Fiquei surpreendido. Achei ofensivo. Isso de fato não é verdadeiro. Pra mim, esse último ato é sinalização que o presidente me quer fora do cargo, porque a precipitação na exoneração, não vejo justificativa”.

“Eu não tinha como aceitar essa substituição. Há uma questão envolvida na minha biografia como juiz”.

“Temos que garantir respeito a lei, a própria autonomia da PF contra interferências políticas. O presidente indica, mas assumiu compromisso comigo inicial que seria escolha técnica, que eu faria a escolha. O trabalho foi realizado. Poderia ser substituído desde que tivesse causa consistente”.

“Agradeço ao presidente da República. Fui fiel ao compromisso. Estou sendo fiel ao compromisso no momento que me encontro ao Ministério da Justiça. Vou começar a empacotar minhas coisas e encaminhar minha carta de demissão”.

“Espero que independente da minha saída, seja feita a escolha técnica, sem preferências pessoais, que também a instituição…. A PF vai resistir a qualquer espécie de interferência política. Que seja indicado que seja feito trabalho autônomo e independente”

“O meu futuro pessoal após isso, eu abandonei a magistratura, infelizmente é um caminho sem volta, mas quando assumi, sabia dos riscos. Mas vou descansar um pouco. No período da Lava Jato não tive descanso e nem no cargo de ministro. Não enriqueci e quero dizer que independentemente de onde esteja, estarei a disposição do país para ajudar como quer que seja.”










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