Cheryl Berno. Foto: Acervo pessoal

Cheryl Berno

Advogada, Consultora, Palestrante e Professora. Especialista em direito empresarial, tributário, compliance e Sistema S. Sócia da Berno Sociedade de Advocacia. Mestre em Direito Econômico e Social pela PUCPR, Pós-Graduada em Direito Tributário e Processual Tributário e em Direito Comunitário e do Mercosul, Professora de Pós-Graduação em Direito e Negócios da FGV e da A Vez do Mestre Cândido Mendes. Conselheira da Associação Comercial do Estado do Rio de Janeiro.

Para passar a faca nos tributos não precisa de reforma

A Reforma da Previdência trouxe uma discussão também sobre os encargos trabalhistas, que poderiam ser melhor tratados, na Reforma Tributária, afinal, as chamadas contribuições sobre a folha de salários, são tributos, conhecidos de maneira geral como “impostos”.

É um erro achar que é preciso de uma “reforma” na Constituição Federal para reduzir as contribuições. Na verdade, a redução de alíquotas de tributos pode ser feita por uma simples alteração na lei ordinária. Tem contribuição que pode ser até extinta por lei. Simples assim.

Aliás, muitas empresas já estão conseguindo reduzir a tributação na justiça, porque com o entendimento que tem prevalecido é de que muitos encargos trabalhistas são indenizatórios, e como tal não estariam nem sujeitos à incidência das contribuições. Até as próprias entidades que exigem que as empresas lhes paguem contribuições, como o SESC, o SENAC, o SESI e SENAI, dentre outras do chamado Sistema S, entraram com ações para evitar o recolhimento das contribuições sobre as suas próprias folhas de salários, que são bem representativas para a Previdência Social.

Para melhor compreensão, vamos tentar explicar, de forma simples e objetiva, o que é um grande desafio neste emaranhado de leis, como se dá a cobrança de tributos sobre a relação de emprego.

Os microempreendedores, MEI, não têm muito problema porque podem ter até um funcionário e o custo dos encargos trabalhistas já estão embutidos na contribuição mensal de apenas R$ 55,90, que cobre todos os tributos, até sobre os serviços e o consumo. As micros e pequenas empresas, que representam 98% das atividades legalizadas, também pagam os encargos trabalhistas dentro do valor mensal devido no Simples Nacional e estão dispensadas do pagamento das contribuições devidas ao SESI, SENAI, SESC, SENAC, SEST e outro “Ss”.

Só as empresas que faturam acima de R$ 4,8 milhões por ano, as que não podem estar no Simples e as que não entraram na lei de incentivo fiscal que reduziu a contribuição patronal a 1% sobre o faturamento, são tributadas em torno de 30% sobre a folha, assim distribuídos:

– 20% de contribuição previdenciária patronal sobre a folha de salários e demais pagamentos a pessoas físicas;

– 1%, 2% ou 3% a título de adicional sobre o risco da atividade laboral (RAT), que pode ser reduzido em 50% ou aumentado em 100%, conforme o Fator Acidentário de Prevenção (FAP);

– 2,5% de salário-educação para o FNDE – Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (o dinheiro da merenda);

– indústria e agroindústria pagam 1,5% para o SESI e 1% para o SENAI, acrescido de 0,2% para empresas com mais de 500 funcionários; comércio, prestação de serviços e outras atividades pagam 1,5% para o SESC e 1% para o SENAC e por aí vai (SEST, 1,5%, SENAT, 1%, SENAR, 0,2% ou 0,25%, SESCOOP, etc.). No total, o sistema S arrecada em torno de 17 bilhões por ano;

– 0,3% ou 0,6% para o SEBRAE, que dá apoio às micro e pequenas empresas brasileiras;

– 8% para o FGTS (em caso de demissão paga-se uma contribuição de 10% para o FGTS, que era provisória e só faltou a lei para acabar);

– 0,2% ou 2,7% para o INCRA, devido por empresas de toda a natureza.

Os empregadores domésticos passaram a pagar os 20% para a contribuição previdenciária, além do FGTS, RAT e de um tributo novo a título de indenização para eventual demissão no futuro.

Vale salientar que para modificar a forma de tributação sobre o emprego, a então Presidenta Dilma, não precisou de reforma, tão somente encaminhou uma medida provisória, uma espécie de lei que precisa do aval do Congresso para ser mantida, e acabou aprovada. Foi simples assim reduzir a contribuição das grandes empresas a 1% sobre o faturamento.

As alíquotas dos tributos não podem fazer parte de nenhuma reforma, porque a Constituição Federal, a Lei Maior do Povo, não pode trazer todos os detalhes (é uma CARTA que hoje já tem 250 artigos e 99 reformas por emendas).

Assim, qualquer que seja a reforma, deixará o efetivo valor devido pelas pessoas físicas e jurídicas, ao encargo de leis ordinárias, que são bem mais fáceis de serem aprovadas. A lei que trata do assunto das contribuições previdenciárias, é a Lei nº 8.212 de 1991, alterada dezenas de vezes, e que regulamenta a Seguridade Social no Brasil. É essa lei que diz que o empregado deve contribuir com 8% a 11%, com um teto máximo e que a empresa deve contribuir com 20% e mais os adicionais de RAT e FAT. A contribuição para o FNDE, assim como a obrigação das empresas pagarem para o SESI, SENAI, SESC, SENAC e outros Ss está em leis próprias. A Lei nº 8.212 já traz uma porção de privilégios, a demonstrar que a reforma não precisa ser na Constituição, mas poderia começar já, com muito menos ônus para o povo e para o Governo.

Reduzir a carga tributária e simplificar é bem mais simples, basta conhecer bem o sistema (o corte de privilégios é indispensável para essa conta fechar depois de passada a faca). Então a dica hoje vai para o Governo, em benefício das empresas e do povo, que não precisam perder direitos para manter o país: passa a faca no excesso, nos privilégios, nos tributos, simplifique! Mãos à obra!

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