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A Nova República chegou em Fufuca

A “nova política” chegou à Câmara Federal. Com a viagem do presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) e do primeiro-vice Fábio Ramalho (PV-MG) à China para a cúpula dos BRICS em Xiamen, a casa dos representantes do povo estará sob a presidência de um deputado federal em seu primeiro mandato. André Fufuca (PP-MA) foi o deputado estadual mais jovem do Brasil. Aos 28 anos, o filho de prefeito e deputado Fufuca já passou por três partidos. Sua promessa: colocar em votação a reforma política.

Sob Fufuca, a situação da Câmara Federal espelha as contradições políticas de um Brasil acomodado. A lenta chegada do calendário eleitoral esvaziou as ruas e jogou os novos ventos da República em velhos frascos. Dória recicla os slogans do “Cansei” de uma década atrás. Bolsonaro recai nas suas ofensas à Constituição. Alckmin mede suas declarações, como se estivesse nos primeiros dias do segundo turno de 2006. E Lula viaja pelo Nordeste. Em Alagoas, recebeu o apoio de Renan Calheiros. Enquanto isso, no Amazonas, Amazonino Mendes é eleito governador para um mandato-tampão.

Michel Temer fala em “pacificação”, mas a fala soa estranha. O país, como no poema de João Cabral de Melo Neto, “mesmo acordado, vive em marasmo, pantanoso sono”. Não obstante, os índices de violência urbana campeiam. Em meio à crise política que completa meia década, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, alerta: o Brasil não pode ficar refém de uma investigação eterna (a Lava-Jato). O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, anuncia: a recessão “acabou”. Ao mesmo tempo, o governo propõe um déficit recorde e apresenta um pacote de privatizações a toque de caixa.

No país de delações premiadas e infidelidades premeditáveis, Temer tentará votar a reforma política, como outrora tentou a da previdência. O debate público está ocupado por discussões técnicas. O distritão e o fundo partidário ocupam as manchetes outrora reservadas a escândalos de corrupção. Um ano após o impeachment de Dilma Rousseff, já sem falar em Eduardo Cunha, grandes partidos divagam sobre o semi-presidencialismo e o parlamentarismo. A Nova República chegou em Fufuca.

Por atrito ou desilusão, na última meia década, a democratização da política no Brasil foi estancada. Novos agrupamentos e velhas lideranças se veem todos partidos por essa contradição fundamental. Como reclamar aos eleitores sociais a legitimidade que os próprios pares não se furtam a negar? Os novos movimentos trazem ao conjunto mais perguntas para as que se acumulam desde as Jornadas de Junho. Movimentos outrora “apolíticos” gravitam inapelavelmente ao redor do sistema político formal – do Mídia Ninja ao MBL. A força gravitacional dos partidos de todos os matizes políticos parece inversamente proporcional à gravidade das questões a ser enfrentadas nas urnas e a seguir. Não obstante, tempos de riscos calculados dificultam inovações e prorrogam o presente empacado. Ao passo que “ressignificar a política” se tornou um clichê, poucos se arriscam nas interpretações.

O roteiro não é completamente inédito. Nos Estados Unidos, Donald Trump está acuado. A França acabou a lua-de-mel de 100 dias com o banqueiro Emanuelle Macron. Os conservadores britânicos não conseguiram concretizar seu Brexit, tampouco a União Europeia (e suas principais lideranças, como a Alemanha, de Angela Merkel) conseguiram se desvencilhar das controvérsias do complexo divórcio. Maurício Macri enfrenta crescente contestação com a economia argentina em compasso de espera. Todos eles, vitoriosos nas urnas recentemente. As democracias liberais parecem inertes diante de suas contradições e da mais profunda crise do capitalismo globalizado desde os anos 1930.

No Brasil, a crise do presente não é herdeira de crises passadas. Após duas décadas de crescimento com inclusão social (1993-2012), o país parecia ter entrado num ciclo virtuoso de longo prazo. Não obstante, as contradições já estavam em curso. Em 1993, tivemos pouco interesse em lembrar que Itamar Franco foi eleito juntamente, não à revelia, de Fernando Collor de Mello. A reeleição de Fernando Henrique Cardoso parecia algo de menor importância, diante dos resultados miraculosos do Plano Real e o “fim” da inflação. O parlamentarismo foi solenemente desprezado em plebiscito e o presidencialismo de coalizão, consagrado (com o PMDB) sem remorsos. Após a década perdida, os anos 1990 foram de confiança inabalável na solidez das instituições e retomada do crescimento.

Em 2017, as expectativas já não mais são incondicionais. Na esfera pública ampliada e amplificada não temos para onde fugir de efeitos das decisões de duas décadas atrás. Caberá ao Brasil de Fufuca, jovem democracia integrante dos BRICS, decidir os próximos 20 anos e dar trato à crise do presente.

 

*Carlos Frederico é diretor de Assuntos Internacionais e professor de Relações Internacionais na Universidade Federal do Tocantins (UFT)

Carlos Frederico Pereira da Silva Gama

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