Cheryl Berno. Foto: Acervo pessoal

Cheryl Berno

Advogada, Consultora, Palestrante e Professora. Especialista em direito empresarial, tributário, compliance e Sistema S. Sócia da Berno Sociedade de Advocacia. Mestre em Direito Econômico e Social pela PUCPR, Pós-Graduada em Direito Tributário e Processual Tributário e em Direito Comunitário e do Mercosul, Professora de Pós-Graduação em Direito e Negócios da FGV e da A Vez do Mestre Cândido Mendes. Conselheira da Associação Comercial do Estado do Rio de Janeiro.

Bancos criam arapucas de consignados para idosos com o aval dos órgãos públicos

Desde que criaram estas arapucas dos consignados para aposentados, os devedores aumentaram em índices alarmantes. Quase 78% do povo brasileiro está endividado. A arapuca começa a ser montada quando o idoso se aposenta. Contra a Lei Geral de Proteção de Dados, Lei 13.709/2018, o Governo compartilha os dados com empresas e instituições financeiras, que começam o assédio antes da pessoa descobrir que está aposentada. o Serpro, o Dataprev e outros que deveriam proteger as informações não cumprem o seu papel. A primeira ligação é da vendedora de consignado, ela que conta que você se aposentou e que com a sua renda, que ela já sabe antes de você, deve fazer um empréstimo consignado, que nem explica o que é, quais são os juros, as condições. Puro Assédio e muito abuso. A atendente insiste que você precisa do empréstimo, que é ótimo, que deve fazer e liga várias vezes, de manhã, de tarde, de noite, para todos os telefones ligados ao seu CPF. Seus dados valem ouro e eles sabem disto.

O aposentado que ganha pouco mais de um salário mínimo, a situação da maioria, se vê quase que obrigado a aceitar a oferta abusiva e nada informativa. A vendedora simplesmente diz que você vai “ganhar” R$ 3.000,00 e só tem que pagar 55 vezes de R$  336,24. Não informa os juros e muitas vezes as taxas e outros acessórios que serão de debitados diretamente pelos bancos na aposentadoria e na conta. Não há sequer um contrato com a condições, tudo de boca, palavra do aposentado contra o “Big Banco”, alguns só digitais, ambiente que é complexo para o aposentado lidar. No portal na Internet do INSS, chamado “Meu INSS”, no qual a pessoa deveria ver tudo a seu respeito, só tem o total emprestado, número de parcelas e o valor de cada parcela, não traz a informação de quanto já foi pago, dos juros negociados, do valor dado, devido, é algo inacreditável. Até o acesso já é feito com base em informações dos bancos e não dos órgãos públicos, o que é inadmissível, os bancos mandam mesmo.

Embora o Código de Defesa do Consumidor (CDC) determine expressamente o direito à ampla informação para o consumidor, à transparência, informações completas e vede a ofertas abusivas, envio de produtos não solicitados, nesta área aonde as pessoas são mais vulneráveis, nada é cumprido. E não pense que tem contrato ou resumo das condições, porque nem pedindo fornecem. Até de uns tempos para cá, criaram um espaço no extrato do consignado no “Meu Inss” para o banco colocar o contrato, mas continuam não colocando e fica tudo por isto mesmo. O aposentado que se vire para achar as condições dos descontos da sua própria aposentadoria.

E não pense que na conta-corrente a informação pode ser obtida, porque cada banco faz o extrato que é melhor para ele – com informações pouco claras. Encontrar uma informação básica, como os juros cobrados nos tais empréstimo consignado, é um desafio, em grandes e renomados bancos. E tem pior. No site do banco, dentro da área privada do correntista, aparece mais oferta abusiva de empréstimo, que vem assim, na cara, e sobre tudo o que está sendo visto da conta, sem ninguém pedir.

Quando a pessoa vai sacar no caixa automático (pelo menos é assim no “da abelhinha”), já vem uma propaganda de empréstimo, que para aceitar você tem que clicar do lado direito, exatamente aonde normalmente clicaria para continuar sacando – indução do consumidor a erro. Dentro do site do banco, fazem ainda pior, do nada, o correntista é direcionado para um site de compras no tal banco da propaganda “fofa”. Isso é inacreditável. Mas, tudo vem ocorrendo contra a lei e com o aval do INSS, do Banco Central, do Ministério Público e dos órgãos de defesa do consumidor, que até tem sistemas, mas são ineficientes.

Como as instituições financeiras são poderosas e o coitado do idoso mal consegue mexer nestes aplicativos, ele vai se endividando, sem ao menos ter o direito de entender as dívidas e as condições. Até existe uma lei que veda o comprometimento de mais de 45% da renda do aposentado, mas não é respeitada como todas as demais e é muito ruim porque o aposentado empresta muito mais no consignado e fica por isto mesmo.

Existe também um decreto federal que diz que não podem ser utilizadas siglas e expressões estrangeiras pelo serviço público, para que o cidadão possa entender as informações, mas no site do INSS, que pega a parcela vulnerável, constam siglas e é impossível entender o que está sendo descontado na aposentadoria. Não é um extrato claro o da aposentadoria, imagem o resto.

Há situação que o INSS cadastra uma cooperativa de crédito, Sicoob, como banco de recebimento de aposentadoria, obrigatório, mas o banco na verdade é o Agibank, que por sua vez diz que tem mais de 800 lojas no Brasil. Loja? Vende o que? Ilusões? Se a pessoa ganha em torno de R$ 1.400,00 como que vai pagar empréstimos de quase R$ 30.000,00? Vai viver do que? Claro que vai se endividar e colocar em risco a sua saúde. Não consegue com as informações recebidas entender que emprestou R$ 5.000,00 e vai ter que pagar R$ 20.000,00 (caso concreto).

E tem pior, o Governo Federal, na gestão passada, cedeu os dados de todos os brasileiros para empresas e instituições financeiras, compartilhou, sem autorização prévia e expressa, e obriga o cidadão a aceitar isso se quiser acessar os seus próprios dados. E a ANPD não tem atuado de forma eficaz para coibir praticas com esta. Com esta, até o celular do idoso para abrir um simples PDF foi vinculado ao banco, o banco é detentor do direito de dizer se a pessoa é ela mesma, tem até a sua imagem, que depois pode ser utilizada por criminosos para acessar e roubar a conta e o banco vai dizer que não tem nada com isto. Prejuízo da vítima.

Já passou da hora do Governo Federal atuar em favor dos cidadãos fazendo com que as instituições e empresas respeitem as leis e os direitos do povo. O limite dos juros é um passo importante porque o consignado é um empréstimo sem risco nenhum, porque o próprio banco desconta diretamente da aposentadoria, por isso deveria ter taxas menores, como até anunciam os bancos que tem, mas para eles nem o céu é o limite. Empurram ainda cartões não solicitados e começam a debitar da própria conta as taxas, anuidades, seguros, um roubo autorizado na conta e na aposentadoria. E para cancelar, a pessoa que corra atrás e faça a via crucis para defender os seus direitos.

Em uma das situações, o Banco Central, depois de mandar diversas vezes o aposentado reclamar nos órgãos de proteção ao consumo, que não fazem nada além de mandar para os próprios bancos resolverem com os cidadãos, mandou ele a reclamação para o banco, que se diz loja. A raposa cuidando do galinheiro. Claro que, assim como os órgãos de defesa do consumidor do governo, que mandaram para os bancos, não adiantou nada. Isso para não falar da tal “autoregulamentação” pela própria federação dos bancos, porque aí já é piada.

Esta história tem que mudar. O Banco Central tem que atuar e fiscalizar, bancos não podem atuar como lojas e empréstimos consignados não podem ser ofertados como pães. O INSS não pode permitir descontos diretos pelos bancos nas aposentadorias sem que seja algo muito claro, provada a vontade e a compreensão do idoso sobre aquela contratação, inclusive quanto aos juros e demais condições.

O Governo também tem que acabar com o uso e o compartilhamento dos dados dos brasileiros, que tem que mandar nas suas informações. Todos os órgãos devem fiscalizar o cumprimento das leis, multar exemplarmente quando houver infrações de qualquer natureza, ainda mais pelas grandes instituições que mais deveriam conhecer e respeitar as normas.

E a justiça que não se furte ao seu papel. Tem que atuar no rigor da lei para impedir que milhares sejam prejudicados. Há multas que valem como inibidor para novas infrações. Não pode ser admitido que um Juizado Especial em Direito Bancário diga que uma conta de juros implique em perícia obrigando o consumidor a ir para a justiça comum para pagar custas altas e um perito. Como que pode um Juizado Especial dizer que é especialista em bancário e se recusar a fazer uma conta simples de juros que atualmente na internet pode ser feita por qualquer um? Temos aí a Calculadora do Cidadão, do Banco Central, e os juízes e seus assessores tem que fazer contas e não achar que tudo depende de perícia para mandar para a justiça comum, muito mais morosa. Estas instituições financeiras não podem ficar impunes, até na justiça.

As instituições gastam milhões em propagandas da abelhinha, do velhinho, da criancinha, do “respeito”, querendo demonstrar humanidade, responsabilidade social, mas criam arapucas para pegar velhinhos pobres, incautos, que acabam endividados e muitas vezes sem casa e sem o que comer, muitos dormindo agora na frente dos bancos sem nada, bem diferente da publicidade.

Já é passada a hora do Governo atuar, para fazer cumprir as leis. A sociedade precisa defender os mais vulneráveis, sempre. A palavra tem que ser respeito, aos direitos dos cidadãos.

+ Serviço:

Para reclamar de qualquer coisa no Governo Federal acesse:

https://falabr.cgu.gov.br/publico/Manifestacao/SelecionarTipoManifestacao.aspx?ReturnUrl=%2f

 

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