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Notícias atualizadas sobre o Carnaval do Rio de Janeiro.

Dia do Passista: Festejar e Refletir

Valci Pelé (Portela) / Foto: J.M.Arruda

Valci Pelé (Portela) / Foto: J.M.Arruda

Passistas femininas da Paraíso do Tuiuti / Foto: J.M.Arruda
Passistas femininas da Paraíso do Tuiuti / Foto: J.M.Arruda

Hoje é o Dia Municipal do Passista. A Lei nº 4462 foi promulgada em 10 de janeiro de 2007 pelo então vereador José Carlos Rego, um jornalista devotado a pesquisar e estudar a arte dos dancarinos e dançarinas do samba no pé. Desde então, o dia 19 de janeiro passou a ser oficialmente o Dia do Passista. O vereador prestou homenagem ao grande passista da Portela Valci Pelé, razão pela qual a lei ficou popularmente conhecida como “Lei Valci Pelé”.

O passista de escola de samba sempre foi uma figura controversa e pouco valorizada dentro de seu reduto. Sempre precisou lutar, ser afirmativo. Desde os tempos em que era um personagem isolado, sozinho, espalhado dentro dos desfiles, até a configuração mais recente, em alas, surgidas na virada dos anos 70 e inicio dos 80.

Até hoje é assim.

Passistas do Salgueiro, pai e filho (Carlos Alberto e Junior Comendador) / Foto: J.M.Arruda
Passistas do Salgueiro, pai e filho (Carlos Alberto e Junior Comendador) / Foto: J.M.Arruda

As quadras apresentam as alas de passistas com roupas e figurinos que, na maioria absoluta das vezes, eles mesmos produzem e custeiam. São poucas as escolas que ajudam na roupa ou no sapato – acessórios que gastam e arrebentam com a execução de sua arte. As alas ganham a fantasia de desfile, mas os figurinos de show, de quadra, de escolha de samba-enredo e do ensaio técnico – onde eles são sempre muto exigidos – raras vezes têm qualquer ajuda. Muitas vezes foram utilizados e reconhecidos apenas como tapa-buraco dos recuos de bateria nos desfiles, e ainda se ouvem ironias inimagináveis do tipo: “mas passista serve para quê”?

Rafael Criati Johnson (São Clemente) / foto: J.M.Arruda
Rafael Criati Johnson (São Clemente) / foto: J.M.Arruda

A resposta dos passistas sobre “para que eles servem” não está na ponta da língua. Antes, está na ponta dos pés!

Para se respeitar e entender a figura do passista nos desfiles, é preciso que se entenda exatamente isto: o passista é uma figura do carnaval! Assim como o compositor, o mestre-sala, a porta-bandeira, a baiana, a Velha Guarda, o intérprete. A diferença, porém, do passista, é que ele surge espontaneamente, de forma afirmativa. Não veio atender a uma necessidade requerida para os desfiles da escola de samba: ele surge e se afirma. Precisavam de alguém para cantar, para compor, para cortejar e exibir o pavilhão. Decidiram adornar os desfiles com as velhas negras baianas dançando, e considearam por bem que os fundadores e baluartes das escolas as apresentassem na abertura de seus desfiles. Como se vê, foram todos personagens criados para uma lógica de desfile.

Luana Oliveira e Luciene Santinha (Grande rio) / Foto: Hélio Rainho
Luana Oliveira e Luciene Santinha (Grande rio) / Foto: Hélio Rainho

E os passistas? Os passistas, não. Eles surgem espontaneamente, se afirmam. Tijolo da Portela, à sua época, um dos precursores nos anos 50, foi expulso da roda e chamado de “maluco”. Nenhuma outra expressão de dança exibida na avenida corresponde tão lógica e efetivamente à explosão rítmica de uma bateria de escola de samba. Os passistas dançam em função dos instrumentos. A cadência está intimamente ligada à bateria, e é ilustrativa do próprio samba-enredo. A dança do passista de escola de samba não é a do samba de roda, nem do samba miudinho, nem do maxixe: o passista transpôs todos esses elementos de dança e CRIOU uma dança sua. Funde todos os demais, utiliza-se de elementos performáticos e repertórios externos, usa até coreografias ou marcações…mas a dança do passista de escola de samba é única, criada e utilizada unicamente para a bateria de escola de samba. Esse é o caráter afirmativo dessa dança.

Sambam com desenvoltura nas quadras, e sequer estão nas obrigatoriedades dos desfiles! Sabem o que isso quer dizer? Se uma escola de samba não levar ala de passistas, não será penalizada! Oficialmente, eles não estão protegidos, porque não são exigência regulamentar. Sequer têm o respeito de alguns carnavalescos que, ansiosos por ilustrarem seus enredos, demonstram ignorância e desentendimento, submetendo seus passistas a carregarem fantasias-caxangás como se fossem seus “escravos de Jó” estilzados! A roupa do passista deve ser leve e funcional, mesmo quando adequada aos enredos. Esse nivel de entendimento e adequação revela a competência do figurinista e também a sua intenção…

Tina Bombom (Inocentes de Belfort Rôxo) / Foto: J.M.Arruda
Tina Bombom (Inocentes de Belfort Rôxo) / Foto: J.M.Arruda

O segmento cresce e se amplia. Ganhou as mídias, sobretudo na era dos sites e das coberturas digitais. Mas também passa por problemas estruturais. Com o advento das alas, surgiram as figuras imponentes e destacadas dos diretores. Houve um grande ganho em liderança, militância e até mesmo formação de novos passistas com essa elevação dos coordenadores a postos de comando. Em compensação, vieram as vaidades pessoais e as imposições. Com a espetacularização dos desfiles, as alas passaram a ser exigidas como corpos de baile, e nem sempre a direção valoriza o passista individualmente: muitos diretores(as) querem subjugar seus liderados. A falta de entendimento e pesquisa sobre o ofício leva muitos a repetirem falsas verdades, assim como o tradicionalismo exagerado gera críticas a inovações comuns à dinâmica de qualquer processo artístico. Cada um querendo ser melhor ou mais especial, algumas vezes esquecendo de respeitar o trabalho dos outros por considerá-lo não um coirmão, mas um “concorrente”.

Ou seja: ainda lutamos, a estas alturas do campeonato, por uma unidade que privilegie o todo, não apenas grupos ou pessoas.

Nilce Fran (Portela) / Foto: J.M.Arruda
Nilce Fran (Portela) / Foto: J.M.Arruda

Hoje é dia de festa, sim. Celebração, sim. Mas também de militância.

Esperamos que cada passista, nesta data, faça sua reflexão. O caráter brincante, descontraído, alegre, de quem só quer brincar e curtir o carnaval está acima de tudo. Mas é bom entender um pouco de quem são, por que ali estão, que papel desempenham e que importância têm para fazerem prevalecer essa arte. Não apenas por si mesmos, mas por aqueles que, lá no passado, abriram portas e fizeram acontecer tudo isso que hoje estamos vendo, nas quadras e avenidas, de mais lindo e original.

Edson Santos (Vila Isabel) / Foto: J.M.Arruda
Edson Santos (Vila Isabel) / Foto: J.M.Arruda

Passistas, construam seu legado! Sejam inspiradores da dança do samba tanto quanto um dia foram inspirados!

E PARABÉNS, por este dia e por todos os dias!

Os que vieram e os que hão de vir.

Porque a avenida é apenas uma alegoria de uma grande caminhada. Uma história que, desta vez, não será escrita com as letras das mãos…mas com o gingado e o bailado dos vossos pés!

Mayara Lima (Paraíso do Tuiuti) / Foto: J.M.Arruda
Mayara Lima (Paraíso do Tuiuti) / Foto: J.M.Arruda

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