Claudio Francioni. Foto: Nicolas Renato Photography

Claudio Francioni

Carioca, apaixonado por música. Em relação ao assunto, estuda, pesquisa e bisbilhota tudo que está ao seu alcance. Foi professor da Oficina de Ritmos do Núcleo de Cultura Popular da UERJ, diretor de bateria e é músico amador, já tendo participado de diversas bandas tocando contrabaixo, percussão ou cantando.

Os dez melhores álbuns de 2016

Por Pedro de Freitas
Fim de ano, vão se aproximando aqueles dias em que necessariamente fazemos um balanço do que foi esse ano de 2016. E quem gosta de música adora a curtição de apontar seus favoritos a “álbuns inesquecíveis” ou “Sargent Pepper’s do século 21”. Também é uma forma de ficar antenado com o que está rolando por aí.

Aqui no Brasil, aquilo que considero “boa música” tem estado cada vez mais circunscrito aos meios alternativos de produção, distribuição e consumo. A música distribuída e divulgada pela grande mídia, via de regra, aos meus ouvidos tem sido ruim de doer. Lá fora, creio, não é muito diferente, mas os veículos, o mercado, e as alternativas são muitas, o que torna a boa música mais fácil de ser acessada. Por esse motivo, essa minha primeira lista contém somente artistas estrangeiros. Mas pretendo fazer uma segunda com artistas nacionais.

Em relação à lista de 2015, a novidade é a volta triunfal do rock! Pena que não por artistas novos ou emergentes, mas por veteranos “voltando à guerra” com ótimos trabalhos. Entre eles, um que já faleceu.

Dos que selecionei, não há ordem de preferência. Portanto, não há um vencedor. Quem quiser conferir as sugestões pode ouvir um, mais de um, todos, e tirar suas próprias conclusões.

Os dez mais


iggypopIggy Pop – “Post Pop Depression”: 
Iggy Pop é um sobrevivente. Do início dos anos 70, quando surgiu com os Stooges, uma espécie de pai do movimento punk, Iggy cometeu todos os tipos de excessos possíveis pelo “rock’n’roll way of life”, e é quase um milagre que esteja vivo. Então não chega a surpreender que o velho “Iguana do Rock” tenha unido forças com outro “bad boy” do rock atual, o cantor, guitarrista e líder do Queens Of The Stone Age Josh Homme. O resultado é uma coleção de ótimas músicas. E se não há dúvidas que se trata de um disco de Iggy Pop, com sua voz cavernosa permeando todo o álbum, é nítido o DNA de Josh Homme no trabalho. O disco termina a melhor música, curiosamente batizada de “Paraguay”, para onde, segundo a letra, “perdedores vão para ocultar seu rosto”. Será que Iggy Pop já esteve em Assunção?

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David Bowie – “Blackstar” : Uma pergunta: se David Bowie não tivesse morrido, “Blackstar” estaria nesta lista? Para responder, faço uma associação: o álbum anterior, “The Next Day”, lançado em 2013 após dez anos de ausência foi considerado uma “reviravolta” (mais uma) na carreira de Bowie, recebendo toda a atenção de mídia e crítica, e sendo considerado um dos melhores daquele ano. O raciocínio é básico: “Blackstar” é melhor que “The Next Day”. Logo, certamente tem que estar aqui. Contido, elegante, introspectivo, em certos momentos lembrando a fase Berlim do artista, “Blackstar” certamente merece destaque na discografia de Bowie, o que não é pouco. “Blackstar” é um grande álbum, planejado meticulosamente por David Bowie para ser o seu Canto do Cisne.

deftones
Deftones – “Gore” : Em meados dos anos 90, a mídia cunhou o rótulo de Nu-Metal, para bandas de rock pesado que faziam seu som influenciado pelo Rap, funk e música eletrônica. Vários artistas, como System Of A Down e Tool, entraram de “contrabando” na tendência, mesmo tendo pouco ou nada a ver com ela. Os Deftones até iniciaram alinhados com o Nu Metal, mas deram uma guinada com o terceiro álbum, “White Pony”, onde o que se ouvia era um som aparentado com o pós punk dos anos 80 e o rock alternativo dos 90. Após uma tragédia (o terrível acidente de carro que vitimou o baixista Chi Cheng), a banda se libertou de vez de amarras. Seus dois últimos trabalhos são ótimos. “Gore” talvez represente a maturidade da banda.  Sombrio, raivoso, melódico e surpreende a cada música. Rock pesado sem mesmice nem zona de conforto.

kendrick
Kendrick Lamar – “untitled unmastered.”: Lamar é um artista que merece ser ouvido não apenas pelos fãs de Rap. Pairando além da ostentação de um 50 Cent e da egotrip de um Kanye West, não tenho dúvidas em afirmar que trata-se do melhor artista do gênero no momento. Seu álbum de 2015, “To Pimp A Butterfly” é tão bom (comentei aqui) que rendeu um álbum de sobras que foi lançado para download quase sem propaganda. O material de “untitled unmastered.” segue o nível de qualidade do “projeto matriz” que o  originou: é de altíssimo nível, com destaque para as fusões de  “black music” anos 70 e jazz, e para o discurso certeiro, antenado e (auto)crítico do rapper. Rap para a cabeça e para os pés.

anohni
Anohni – “Hopelessness”:  Eis aí uma chance de apresentar uma artista que ainda permanece quase desconhecida no Brasil. Anohni é uma cantora e compositora transgênero, anteriormente conhecida como Antony Hegarty. Foi ainda como lider da banda Antony And The Johnsons que Anohni lançou o belíssimo “I Am a Bird Now”. Indo direto ao ponto, Anohni tem uma das mais belas vozes da música atual. Esse dom é posto à disposição de músicas que misturam em doses generosas lirismo e melancolia. Em “Hopelessness”, com novo nome artístico, as qualidades anteriores são temperadas com música eletrônica, o que de forma nenhuma atenua a melancolia. Nem a beleza.

metallicaMetallica – “Hardwired…To Self Destruct” :
Eles já passaram por tudo. De pontas de lança do cenário musical independente a megaestrelas. Lidaram com a perda de um integrante em um acidente fatal, passaram por um quase suicídio artístico quando lançaram “St Anger” e fizeram terapia em grupo. Após um recesso de 8 anos sem um novo álbum, os integrantes do Metallica resolveram fazer o mesmo que sua legião de fãs: olharam com carinho para os idolatrados álbuns “Master Of Puppets” e “…And Justice For All” e fizeram um trabalho que é uma espécie de filho espiritual daqueles dois favoritos. Nunca o Metallica soou tão próximo de clássicos como “Battery” ou “Harvester Of Sorrow”. O que para os fãs soa como música. Literalmente.

pjharveyPJ Harvey – “The Hope Six Demolition Project”:
 PJ Harvey é uma artista que soube envelhecer. Seus primeiros álbuns, de inspiração punk, a colocaram no cenário musical inglês. Porém no coração de PJ Harvey parecia que batiam os versos da geração beat, e de compositores como Bob Dylan, Leonard Cohen, Lou Reed e Patti Smith. O tempo passou e a fúria e rebeldia inicial também. A música se sofisticou e hoje só genericamente pode ser chamada de rock. Foi assim que PJ cruzou seus 40 anos lançando o melhor álbum de sua carreira, o espetacular “Let England Shake”, de 2011. Musicalmente, o sucessor “The Hope Six Demolition Project” se assemelha a “Let England Shake”, em sua mistura sonora onde cabem de harpas  a guitarras distorcidas. Se no álbum anterior a poesia tinha como tema a história inglesa e suas guerras, no atual o alcance é mais cosmopolita. Ainda que não supere seu antecessor, é mais um grande álbum da madura PJ Harvey.

a_moon_shaped_poolRadiohead – “A Moon Shaped Pool”:
 Alguém lembra que o Radiohead começou como um Sub Nirvana no álbum de estréia “Pablo Honey”? Daí em diante, evoluindo para a perfeição pop de “The Bends”, e para o “pós tudo” de “OK Computer” (meu favorito) e do gélido “Kid A”, com o passar dos anos, o Radiohead melhora e acerta. Foi assim que conseguiu a proeza de chegar ao megaestrelato fazendo pouquíssimas concessões artísticas. “A Moon Shaped Pool” é mais um passo: à veia original pop/rock e à maestria adquirida na utilização de música eletrônica, agrega-se um elemento orgânico: a habilidade adquirida pelo guitarrista Johnny Greenwood compondo orquestrações e trilhas sonoras, o que amplia ainda mais a paisagem musical já riquíssima da banda. A quem acompanha música pop, fica a pergunta: qual é o limite artístico do Radiohead?

maxwellMaxwell – “BlackSUMMERS’night”: 
Em meados dos anos 90, uma leva de artistas fez parte de um movimento que foi conhecido como Neo Soul. Gente como D’Angelo, Maxwell, Erykah Badu e Lauryn Hill, que fugiram do chavão R&B dominante até hoje fazendo uma releitura ambiciosa do Soul dos anos 70. Ambição é o que sempre transpareceu em todos os trabalhos de Maxwell, com cuidados com composição, arranjos e produção beirando a obsessão, o que rendeu percalços ao longo da carreira, mas também foi responsável pela gestação de canções maravilhosas. BlackSUMMERS’night também tem sua cota de megalomania: é parte de uma trilogia que iniciou em 2009 com BLACKsummers’night e vai se encerrar daqui a alguns anos com Blacksummers’NIGHT. Esquisitices à parte, é um álbum irrepreensível, soul music emocionante, primorosamente gravada e executada. Para ouvir, namorar, sonhar.

boniverBon Iver – “22, A Million” :
 Anos atrás, após escutar o fantástico álbum de estréia do Fleet Foxes  me perguntei se existia algo tão bom entre os novos artistas folk americanos. Existia. “For Emma, Forever Ago”, álbum de estréia de Justin Vernon, que grava, compõe e canta com o pseudônimo de Bon Iver, era de uma simplicidade e beleza atordoantes. Basicamente, violão, voz e algumas belíssimas canções folk. Após ter dado uma mãozinha em dois dos últimos discos do rapper Kanye West (um improvável fã de carteirinha do seu trabalho), Vernon volta ao seu projeto original Bon Iver de forma surpreendente. Usando e abusando da eletrônica, mas sem perder o acento folk, consegue a proeza de soar orgânico e emocional em meio a uma colagem de sons sintetizados. Uma prova de que o som está na cabeça do artista, independente do meio que use para se expressar. Entre arranjos tão fora do comum, Bon Iver soa como o Bon Iver original, da voz e violão. E isso é ótimo.

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