O doce Nando Reis

Nando Reis. Foto: Juliana Dias

Nando Reis. Foto: Juliana Dias

Dizer que Nando Reis é um sujeito doce não causa espanto a ninguém. Sua obra, já há algum tempo, tem como fio condutor o amor e suas variáveis. O que me soa paradoxal é o fato de que ainda guardo uma imagem muito forte de Nando como parte dos Titãs, banda que passou pelo seu auge tratando o tema de forma pouco convencional, usando inclusive de escatologia em certos momentos. Resumindo em versos, o autor de “que a vida é mesmo coisa muito frágil/uma bobagem, uma irrelevância/diante da eternidade/do amor de quem se ama” é exatamente o mesmo que urrava “chupar o seu dedão/cheirar sua calcinha suja na menstruação” ou então “a cabeça do pau faz esporra de leite/pra tomar de manhã/no café da manhã/e também no almoço e depois no jantar/amor, eu quero te ver cagar”, trechos de “Isso Para Mim é Perfume”, composição sua gravada no álbum “Tudo ao Mesmo Tempo Agora”, lançado pela banda em 1991. Estranho, não?

 

O show que divulga o álbum “Jardim Pomar”, lançado no ano passado, evidencia toda a doçura do compositor, guardada a sete baixos quando precisava interpretar um dos oito durões em sua época titânica. Para ser mais justo, os corações da banda já haviam amolecido coletivamente de alguns anos pra cá, coincidindo, inclusive, com o declínio na qualidade de seus trabalhos. Idade, filhos, maturidade. Tudo isso faz bem ao indivíduo e mal ao rock’n’roll.

 

Nando Reis. Foto: Juliana Dias
Nando Reis. Foto: Juliana Dias

 

Nando parece ter, intencionalmente, dividido o show em duas partes distintas. Na primeira metade, deixou a impressão de pedir ao povo que escutasse com carinho as composições de seu novo trabalho. Estas vieram entremeadas a alguns lados B e a “Marvin” e “Cegos no Castelo”, sucessos de sua ex-banda. As novas canções são interessantes. “Infinito Oito”, que abriu o show, tem uma levada funkeada, destoando um pouco da onda do cantor. “Inimitável” e “Lobo Preso em Renda” tem uma pegada um pouco mais pesada, mas quem me ganhou foi “4 de Março”, uma explícita declaração para sua esposa, Vania. A música de trabalho, “Só Posso Dizer”, foi bem acompanhada pela plateia, uma prova de que o pulso ainda pulsa para as rádios.

Nando Reis. Foto: Juliana Dias
Nando Reis. Foto: Juliana Dias

Na segunda metade, Nando enumera seus hits e finalmente bota o povo pra cantar. “Dois Lados”, “Sutilmente”, “Relicário”, “Sou Dela”, “All Star” e “Por Onde Andei” fecharam o set com a rapaziada abandonando as frias mesas do ótimo Metropolitan. Abrindo o bis, “O Segundo Sol”. Se me permitem. abrirei um parênteses para ela. Acho esta canção fantástica. Um arranjo forte e de extremo bom gosto, uma melodia cativante e uma letra enigmática. Confesso que tenho muita curiosidade em saber o que significa “mas você pode ter certeza de que o seu telefone irá tocar em sua nova casa que abriga agora a trilha incluída nessa minha conversão”. Não sei o que ele quis dizer com isso, mas cantei. Berrei, aliás. Fechando a noite, o petardo “Do Seu Lado”, música ideal para qualquer artista fechar qualquer show em qualquer lugar e em qualquer época.

 

Entre as músicas, Nando pouco falou. Lembrou Cássia Eller antes de “All Star” como de costume, citou Deus algumas vezes e expressou o prazer de estar no palco jogando canções e mensagens de amor ao ar. Um fofo. Nando envelheceu e adocicou, mas eu também. Então estamos quites.

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