Acadêmicos de Santa Cruz 2018: escola desfila com boa plástica, mas enredo confuso

Desfile Acadêmicos de Santa Cruz 2018. Foto: Leandro Milton/Srzd

O verde da Acadêmicos de Santa Cruz ganhou significado de fé e esperança neste sábado (10). Segunda escola a passar pela Marquês de Sapucaí no segundo dia de desfiles da Série A, a agremiação levou ao sambódromo o enredo “O voo mágico da esperança, quem acredita, sempre alcança”. Apesar do verde ser uma cor que tradicionalmente simboliza esperança, o carnavalesco Max Lopes afirmou que “esperança não tem cor e que a escola seria uma explosão de cores”.

Apesar do otimismo da agremiação, o desfile da Santa Cruz levou um enredo confuso à Avenida. Além disso, o último carro alegórico apresentou um defeito antes de entrar na pista. Desta forma, a alegoria desfilou apagada e com um forte cheiro de material queimado, além de um enorme buraco deixado na Sapucaí.

Desde 2003, a Acadêmicos de Santa Cruz desfila na Série A do Carnaval carioca — quando retornou após passar um ano no Grupo Especial. Nos últimos cinco anos, a escola ficou classificada em 10° ou 12° lugares.

Enredo

Desenvolvido pelo carnavalesco Max Lopes, também conhecido como “mago das cores”, o enredo da Acadêmicos de Santa Cruz é entitulado “O voo mágico da esperança, quem acredita, sempre alcança”. A história contada pela escola na Avenida teve a fé como tema principal. Ao longo das alas, foi possível perceber elementos de diversas crenças e superstições populares.

De acordo com Hélio Rainho, comentarista do SRzd, o enredo da Acadêmicos de Santa Cruz pareceu bastante confuso. “O trabalho que ele [Max Lopes] fez para Santa Cruz esse ano foi um trabalho que desde o início, a proposição do enredo pareceu um pouco uma miscelânea de coisas. Não conseguiu ficar muito claro na Avenida como ele propunha esse roteiro que misturava essas questões relativas à fé e outras relativas à mitologia”, afirmou.

Para abrir o desfile, a agremiação decidiu explorar os “lugares mágicos”. A comissão de frente abordou o mito grego da caixa de Pandora. De acordo com a mitologia, Pandora, primeira mulher criada por Zeus, abriu o jarro que continha todos os males do mundo. A única crença que continuou dentro do jarro foi a “esperança”. Ainda nos “lugares mágicos”, a escola trouxe o espírito santo e a fé no cristianismo, elfos e fadas da mitologia nórdica, o inseto esperança e estrelas cadentes. Com a chegada do primeiro setor, a Acadêmicos de Santa Cruz explorou a fé no sentido lúdico dos contos de fadas. Foram abordados: cidade das esmeraldas de “O Mágico de Oz”; o pote de ouro atrás do arco-íris da mitologia irlandesa; Peter Pan e Sininho; e Alice e Chapeleiro de “Alice no País das Maravilhas”.

Já o segundo setor levou a fé depositada em amuletos como forma de procurar algum tipo de conforto. A agremiação explorou margaridas para fazer o jogo “bem me quer e mal me quer”; trevo de quatro folhas; sabedoria do povo cigano; ferradura; e figa. A religião e o misticismo também não foram deixados de lado. Desfilaram alas com elementos de magia; baralhos ciganos; búzios das religiões de matrizes africanas; oferendas à Yemanjá; festas aos santos juninos; e um espantalho para salvar colheitas.

Para sintetizar o enredo e encerrar o desfile com uma simbologia que expressa o desejo do título de campeã, a Acadêmicos de Santa Cruz trouxe no último setor “a esperança é a última que morre”. Para isso, a escola retoma a parte lúdica do início do enredo e afirma que o Brasil tem que se tornar um país das maravilhas.

Desfile Acadêmicos de Santa Cruz 2018. Foto: Leandro Milton/Srzd

Comissão de frente

Coreografada por Marcelo Chocolate e Marcello Moragas, a comissão de frente representou o mito grego da caixa de Pandora. Com uma performance coreografa e teatralizada, a ala arrancou aplausos de alguns setores da Avenida. Na história contada na comissão de frente, o deus grego Zeus entregou uma caixa para Pandora, primeira mulher criada pelo principal deus do Olimpo. Ao abrir a caixa, Pandora libera os males da humanidade. Os males representados na Avenida foram: a loucura, a doença, a mentira e o amor. Cada mal teve seu momento de destaque na coreografia. A última a sair da caixa foi a esperança, tema do desfile, que foi primeiramente representada por um grande pano com um cavalo alado desenhado e a frase “É só acreditar”.

 

Desfile Acadêmicos de Santa Cruz 2018. Foto: Leandro Milton/Srzd

Casal de mestre-sala e porta-bandeira

A Acadêmicos de Santa Cruz trouxe a fé no cristianismo, representada pelo Espírito Santo, no primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira. Formado por Rogério Dorneles e Roberta Freitas, o casal conseguiu fazer um belo desfile. De acordo com Eliane Santos de Souza, comentarista do SRzd, o casal apresentou boa sintonia, com movimentos e de forma fluente. “O gestual do mestre-sala se destacou pelo uso do adereço de mão, o bastão. […] A porta-bandeira marcou com os pés sem deslocamento, fazendo sua saia balançar. Fez grande esforço para manter aberta a bandeira, ficando visível que a bandeira estava pesada”, concluiu. Assista ao comentário:

Em conversa com o SRzd, Roberta Freitas comentou sobre a fantasia do casal e a preparação para o desfile. “A gente representa a fé e toda essa emoção que move o povo brasileiro. Um povo que não perde a esperança; não perde a fé. Independentemente de qual religião cultua. Essa fé que nos move também. Ensaiamos muito para estar aqui. A preparação foi intensa, embaixo de chuva e de sol”, revelou. Roberta também compartilhou um pouco sobre o seu bailar na Avenida. “A nossa rotina na Avenida é muito tradicional. Sou muito ‘cri cri’ e tida como ‘velha’ para algumas pessoas. Então meu bailado é tradicional e a fantasia também”, afirmou.

O casal não é desconhecido na Avenida. Rogério Dorneles tem grande parte da sua carreira no Carnaval carioca relacionada à Mocidade. No entanto, ao longo de sua trajetória, o mestre-sala passou por algumas escolas do Grupo Especial como Unidos da Tijuca, Portela e Imperatriz Leopoldinense. Sua parceira de Avenida, Roberta Freitas, desfila pelo seu terceiro ano como porta-bandeira da Acadêmicos de Santa Cruz.

Desfile Acadêmicos de Santa Cruz 2018. Foto: Leandro Milton/Srzd

Bateria

A Tabajara, como é conhecida a bateria da Acadêmicos de Santa Cruz, apresentou um desfile regular. Apesar de algumas instabilidades no ritmo, a Tabajara comandada pelo mestre Riquinho conseguiu manter o andamento ao longo do desfile. Este é o quarto ano consecutivo do Mestre à frente da bateria.

O comentarista do SRzd Bruno Moraes analisou a bateria da agremiação. “A bateria da Santa Cruz apresentou um desfile regular, com algumas instabilidades no ritmo. As bossas realizadas nos módulos foram bem apresentadas. A bateria do mestre Riquinho manteve o andamento ao longo do desfile”, comentou.

Larissa Nicolau desfila pelo segundo ano consecutivo como rainha de bateria da Acadêmicos de Santa Cruz. A rainha compartilhou que sua fantasia representava a esperança por meio dos sonhos. “Minha fantasia é a noite estrelada; uma noite onde acontece os sonhos. Espero que vocês vejam isso em mim na Avenida”, disse.

A jovem de apenas 19 anos não acredita que sua idade seja um diferencial. “A idade da rainha não oferece uma vantagem ou desvantagem no desfile. O diferencial mesmo é o ensaio”, revelou. Apesar de treinar bastante, a rainha assumiu que não faz muitas preparações no seu corpo para o desfile na Avenida. “Eu não me preparo muito antes, em questão de aparência. Eu odeio fazer dieta e ir à academia, mas tentei me regrar mais nos últimos meses”, confessou. Larissa já havia desfilado como princesa da bateria em outros anos. “Não consigo diferenciar um desfile como princesa de bateria ou como rainha. A emoção de estar na Sapucaí é sempre grande. Eu sou extremamente grata por estar aqui”, concluiu.

Desfile Acadêmicos de Santa Cruz 2018. Foto: Leandro Milton/Srzd

Samba e carro de som

O samba-enredo da Acadêmicos de Santa Cruz foi entoado na Avenida pelos intérpretes Quinho e Roninho. Quinho, conhecido por sua irreverência e pelos seus famosos bordões, retorna à Sapucaí após dois anos afastado. O intérprete fez história cantando pelo Salgueiro, mas também passou por escolas como União da Ilha, Grande Rio, Estácio de Sá e Império da Tijuca. Com muita alegria por causa de seu retorno, o intérprete repetiu seus bordões para o SRzd e afirmou que seu desfile será grande. “Por acaso você já ouviu samba ruim na voz de Quinho?”, brincou. O samba-enredo é assinado pelo próprio Quinho e pelos compositores Preguinho Santa Cruz, Tatiane Abrantes e Claúdio Mattos.

Wanderley Monteiro, comentarista do SRzd, falou sobre o samba da escola. “A Santa Cruz traz a fé como alimento para um mundo melhor. E o samba mostrou muito bem essa mensagem. O amor, a esperança para uma mudança de hábitos, costumes e respeito ao próximo. Embalado por uma bela melodia e reforçado pelo canto da comunidade da Zona Oeste”, afirmou.

Desfile Acadêmicos de Santa Cruz 2018. Foto: Leandro Milton/Srzd

Fantasias, alegorias e adereços

As fantasias das alas Acadêmicos de Santa Cruz fugiram do contexto de esplendor e plumas; materiais que ficaram restritos aos casais de mestre-sala e porta-bandeira. O destaque ficou com a comissão de frente, que causou bastante impacto na Avenida.

Max Lopes honrou mais uma vez seu título de mago das cores. O carnavalesco conseguiu fazer um desfile com muito colorido e fugiu da obviedade do verde como esperança. A cor, que também é da escola, foi utilizada com sutileza nas alegorias e também nas fantasias. Max passou por escolas como Estação Primeira de Mangueira, Imperatriz Leopoldinense, Viradouro, Vila Isabel, São Clemente e Porto da Pedra.

Apesar do enredo confuso, as fantasias da escola estavam muito bem executadas. O comentarista do SRzd Hélio Rainho destacou que fez um trabalho visual digno. “Trabalho plasticamente interessante. Veio bem e se apresentou com dignidade”, resumiu.

Desfile Acadêmicos de Santa Cruz 2018. Foto: Leandro Milton/Srzd

Harmonia e evolução

A Acadêmicos de Santa Cruz desfilou com 21 alas e quatro carros alegóricos. A agremiação conseguiu realizar um bom desfile durante quase toda a sua apresentação. No entanto, um problema no último carro fez com que um buraco fosse aberto entre a alegoria e a 21ª ala. Ironicamente, o carro alegórico que deu defeito representava “a esperança é a última que morre”. A alegoria passou pela Avenida com as luzes desligadas e com um forte cheiro de material queimado. Apesar dos infortúnios, a agremiação conseguiu encerrar seu desfile dentro do prazo estipulado.

O comentarista Hélio Rainho relembrou uma superstição sobre desfiles que envolvem ciganos. “O carro da união que tinha uma mensagem tão interessante, tão relevante, acabou tendo um problema e atrasou. Acho que vai comprometer o desempenho da escola. Fica aqui uma lembrança que o Max esqueceu; uma das lições que ele mesmo aprendeu e ensinou durante muitos anos de quando ele fez o enredo sobre ciganos, não levou a fogueira e o carro pegou fogo. Hoje pode fazer uma analogia. Ele trouxe um carro lindo e uma ala maravilhosa com ciganos, mas não teve fogueira. Talvez por isso a escola terminou o desfile com aquele carro com cheiro de borracha queimada”, lembrou.

– Vídeo: Quinho fala sobre sua estreia da Acadêmicos da Santa Cruz

– coreógrafos da Santa Cruz falam sobre o segredo da caixa de Pandora da comissão de frente

– Vídeo: Há quatro anos na Santa Cruz, mestre diz que bateria ‘evoluiu bastante’

– Max Lopes agradece apoio do SRzd e fala sobre importância do enredo da Santa Cruz

Veja fotos do desfile

Ficha técnica da escola

Local: Santa Cruz, Rio de Janeiro
Fundação: 18 de fevereiro de 1959
Cores: verde e branco
Presidente: Moysés Antonio Coutinho Filho (Zezo)
Carnavalesco: Max Lopes
Diretor de Carnaval: Ricardo Simpatia
Diretor de Harmonia: Marquinhos Harmonia
Mestre de bateria: Mestre Riquinho
Rainha de bateria: Larissa Nicolau
Primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira: Rogerio Dorneles e Roberta Freitas
Intérpretes: Quinho e Roninho
Coreógrafos da comissão de frente: Marcelo Chocolate e Marcello Moragas
Coordenador da ala de passistas: Júnior Carioca
Número de alas: 21
Número de carros alegóricos: 4

Samba enredo 2018:
A esperança vai me guiar
Por esse mundo de tormento
Farei de ti o meu alento
Por todas as minhas andanças
Um coração de criança
É nossa força para viver
Hei de levar comigo os sonhos meus
Despertar o sentimento lá no fundo
Pois sou filho do dono do mundo
Eu levo trevo e figa de Guiné
Faço da crença, o meu patuá
Vi o meu destino nas estrelas

Deu Santa Cruz, pode acreditar
Pode acreditar, minha fé não costuma “faiá”

E ela move montanhas
Basta fechar os olhos e agradecer
Fazer o bem sem olhar a quem
Na esperança de um novo dia nascer
Quem me dera eu escrever o meu futuro
Que o planeta fosse um lugar mais puro
E o amor o combustível para caminhar
Que meu Brasil, se torne o País das Maravilhas
Tão belo como contam as poesias
No verde e branco é só acreditar

Na Santa Cruz de um menino
Que o ensinou um dia o que é amar
E hoje eu sou um peregrino
Nessa avenida a canta (a cantar)

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